Ciência tenta explicar como uma cidade gaúcha tem tantos gêmeos

Na série sobre a "Cidade dos Gêmeos", veja a explicação da ciência para o fenômeno que acontece em Cândido Godói, no interior gaúcho

Cândido Godói é uma pequena cidade gaúcha que virou notícia por causa do grande número de gêmeos. O mistério levou as médicas geneticistas da UFGRS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) a entrarem em campo em busca de uma resposta.

Durante anos, lendas e teorias da conspiração se espalharam pela cidade. Histórias mirabolantes para tentar explicar a razão de tantos gêmeos surgiram aos montes. Algumas chegaram a apontar a água como culpada; outras lançaram desconfiança até sobre experimentos nazistas.

Mas depois de mais de 10 anos de pesquisas e exames, médicos e pesquisadores descartaram as hipóteses mais absurdas.

“O que acho que a gente conseguiu demonstrar de maneira cabal com nosso estudo, que foi feito a partir de 2008 e coordenado pela professora Lavínia, é que o fenômeno dos gêmeos em Cândido Godoi ocorre muito antes do Josef Mengele poder estar no Brasil, quando ele ainda estava certamente na Alemanha, e segue ocorrendo muito depois”, explica a geneticista Úrsula Matte.

“Quando a gente considerou a proporção, ou seja, o número de nascimentos gêmeos sobre o número total de nascimentos, isso não se modifica desde início do século 20, que é quando aquela comunidade se estabeleceu”, diz a geneticista Lavínia Schuler-Faccini

De acordo com Úrsula Matte, uma das questões que pode estar acontecendo em Cândido Godói “é que exista algum fator genético que facilite levar a termo uma gestação gemelar. 

”Porque isso seria um fator em comum com os dois tipos de gêmeos que tem origem distinta. Então a gente tem alguma evidência nesse sentido, mas a gente não pode bater o martelo de que é isso que tá acontecendo", avalia Úrsula Matte.



Para os pais da Valentina e da Isabela, a gestação gemelar foi uma surpresa. “Não temos casos na família, próximos muito menos. Então é de ancestrais mais antigos que tinham algum caso. Nunca esperávamos. Mas, graças a Deus, temos essas bonecas aí", diz o pai das meninas, o Francisco Bruno.

As meninas são orgulho e a maior paixão dos pais.. “É uma benção, não tem muita explicação porque a gente não imaginou que teríamos gêmeas. Mas são maravilhosas”, conta Mariane Jobim, mãe das meninas.

E adivinha quem fez o parto da Valentina e da Isabela? O doutor Anencir, que também é tio avô delas. Segundo o principal obstetra da cidade, o nascimento de gêmeos por ali já não é mais o mesmo da década de 90.

“Agora nós estamos normal, então isso aí que chama atenção. Se aquelas mulheres tivessem, o gene T52, elas provavelmente deixariam essa herança para as futuras filhas, e o fenômeno iria continuar existindo”, explica o médico Anecir Flores da Silva.

“Mas como não é assim, o fenômeno já passou daquela década, então pensa-se que possa haver ou um engano, ou temos que fazer melhores estudos, com maior apuramento dos fatos”, avalia.

Ao contrário de Cândido Godói, os números no brasil mostram um aumento nas gestações duplas. De acordo com o Sinasc (sistema de informações sobre nascidos vivos), entre 2018 e 2019, o país registrou mais de 60 mil nascimentos de gêmeos. 

A USP (Universidade de São Paulo) também estudou esse crescimento. Só na maior cidade do país, entre 2003 e 2014, houve um salto de 10 para 13 a cada mil novos nascimentos.  Segundo o IBGE, o aumento foi de mais de 28% nos últimos dez anos.

E isso também é explicado pela ciência. A reprodução assistida é o principal fator para o crescimento. 

“No nosso mundo ocidental, como se diz, o principal fator que levou ao aumento de nascimentos gemelares é a fertilização assistida”, explica a geneticista Lavínia Schuler-Faccini

Enquanto isso, a água na fonte da fertilidade de Cândido Godói continua jorrando, e as curiosidades na terra dos gêmeos seguem se multiplicando com o tempo.

Mais notícias

Carregar mais