Se hoje Max Verstappen se tornou o nome a ser batido na Fórmula 1, a situação do sobrenome era bem diferente duas décadas atrás.
Em 2003, Jos Verstappen corria pela Minardi, naquela que seria a última temporada de sua carreira na F1. Antes, passara por Benetton, Simtek, Footwork, Tyrrell, Stewart e Arrows, quase sempre sofrendo para somar pontos. Naquele ano, não foi diferente: passou zerado.
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Era uma sina da Minardi, aliás. Presente no grid de 1985 a 2005, a equipe italiana deixou saudades entre o público que torcia por uma surpresa das escuderias de baixo orçamento. Em uma era em que a Fórmula 1 distribuía menos pontos, o time de Faenza quase sempre tinha muito a celebrar quando fechava uma temporada com um pontinho. Nos melhores momentos, foi sétima colocada no Mundial de 1991 (seis pontos) e oitava em 1993 (sete pontos).
Por isso, quando Verstappen foi o mais rápido de um dia de atividades da Fórmula 1 com a Minardi, a imprensa especializada deu o justo destaque. O registro, afinal, era digno.
Aconteceu em 4 de julho de 2003, durante a programação do Grande Prêmio da França. Naquele ano, a F1 havia adotado um novo regulamento, de forma a tentar diminuir custos para os times e dar mais tempo de exposição na TV às equipes menores.
Na temporada em questão, a definição do grid de largada era dividida entre sexta-feira e sábado. Nos dois dias, cada piloto tinha pista livre para dar uma volta lançada por dia. Na sexta-feira, a ordem era definida pela classificação do Mundial de pilotos; no sábado, pelos resultados da véspera. A classificação do sábado definia o grid de largada.
Chegado o final de semana do GP da França, em Magny-Cours, o regulamento brindou o público com uma zebra inesquecível. Motivo: a chuva, que encharcou o traçado francês no início da sessão e foi secando com o decorrer das voltas, entregando uma pista bem melhor para quem vinha no final.
Mas com o passar do tempo e a pista secando, Verstappen saiu dos boxes, pegou pista praticamente seca e marcou 1min20s817. Festa na Minardi, que ainda viu Justin Wilson fechar o dia com o segundo melhor tempo – no entanto, o britânico foi desclassificado por ter participado da sessão com o carro abaixo do peso mínimo.
“É o melhor momento da nossa história. Um dia fantástico”, comemorou Paul Stoddart, dono da Minardi, de acordo com matéria do jornal Folha de S. Paulo da época. “Não poderia imaginar nada melhor. Sinto pelo Justin, mas ele sempre saberá que marcou o segundo melhor tempo aqui”, completou o australiano.
Para o jornalista Fábio Seixas, enviado do jornal ao GP da França em questão, aquela surpresa era apenas questão de tempo até que acontecesse. "Era aquele regulamento maluco em que, na sexta-feira, os mais rápidos entravam primeiro, e os mais lentos (entravam) depois para tentar equilibrar as coisas. A gente sabia, desde que o regulamento foi colocado, que isso ia acontecer. Era meio uma bola cantada. Aconteceu naquela sexta de Magny-Cours", contou Seixas em conversa com o blog.
A Folha deu um espaço considerável ao “dia de Ferrari” vivido pela Minardi naquele dia. Pudera: com Verstappen em primeiro, a classificação do dia teve Ralph Firman (Jordan) em segundo, Nick Heidfeld (Sauber) em terceiro, Olivier Panis (Toyota) em quarto e Antonio Pizzonia (Jaguar) em quinto. A Ferrari ficou no meio da classificação: Rubens Barrichello foi 10º, com Michael Schumacher em 11º. Vale destacar: até então, a melhor colocação da Minardi em um grid da Fórmula 1 havia vindo no GP dos EUA de 1990, com Pierluigi Martini na segunda posição.
Os resultados do dia foram recebidos com festa no paddock. A protagonista da zebra era uma equipe vista com bons olhos nos bastidores, a despeito do histórico pouco competitivo.
"Todo mundo gostava muito da Minardi, por ser a pequenininha e porque era nosso porto seguro para comer bem no paddock. A equipe era pequena, mas era simpática. Até a Red Bull chegar em 2005, a Fórmula 1 era muito ruim. O paddock da Fórmula 1 era muito arrogante, então você não conseguia falar com ninguém. As portas do motorhomes estavam sempre fechadas. E a Minardi sempre recebeu todo mundo. Você conseguia almoçar um macarrão, tomar uma taça de vinho. Foi sempre uma equipe muito simpática, muito aberta. Conforme os tempos (na classificação) foram melhorando, todo mundo correu para o caminhão da Minardi. Comemoraram como se tivessem ganhar a corrida. Sabiam que era uma coisa de um dia só", descreveu Fábio Seixas.
No sábado, de fato, a carruagem virou abóbora, e a Minardi teve que se contentar com a última fila: Verstappen em 19º, Wilson em 20º. A Williams fez a primeira fila, com Ralf Schumacher na pole position e Juan Pablo Montoya em segundo. A Ferrari teve Michael Schumacher em terceiro e Rubens Barrichello em oitavo. A McLaren colocou Kimi Raikkonen em quarto e David Coulthard em quinto.
Na corrida, nova dobradinha da Williams, com vitória de Ralf Schumacher. Michael Schumacher foi o terceiro, seguido de Raikkonen e Coulthard. A Minardi, é claro, passou longe do pódio: Wilson foi o 14º colocado, a três voltas do alemão da Williams, enquanto Verstappen foi o 16º, a quatro voltas da vitória.
Mesmo assim, aquela sexta-feira serviu para provocar uma breve reviravolta na Fórmula 1, que vivia anos de domínio da Ferrari e de Michael Schumacher. O alemão conquistou cinco títulos consecutivos entre 2000 e 2004.
"Para nós, jornalistas, era uma mesmice. Os ‘anos Schumacher’ eram anos em que a gente não tinha novidade. Que novidade eu vou escrever a cada corrida? De repente, ter uma Minardi na frente era uma coisa muito boa", lembra Fábio Seixas, que lembra o viés de “bizarrice” na cobertura daquele resultado.
"Todo mundo cobriu com esse olhar, com esse viés: como um regulamento novo acabou criando um resultado tão bizarro. E quase foi uma dobradinha. O Justin Wilson só não foi segundo porque foi punido."
Emanuel Colombari é jornalista com experiência em redações desde 2006, com passagens por Gazeta Esportiva, Agora São Paulo, Terra e UOL. Já cobriu kart, Fórmula 3, GT3, Dakar, Sertões, Indy, Stock Car e Fórmula 1. Aqui, compartilha um olhar diferente sobre o que rola na F-1.