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Manifestações de 7 de setembro pró-Bolsonaro pelo Brasil 1/19
Se a pandemia da covid-19 tivesse acontecido em 7 de setembro de 1822, quando a população do Brasil era de 4,7 milhões de habitantes, pelo menos 12% dos brasileiros estariam mortos, com base nos mais de 582 mil óbitos causados pela doença hoje. O número de casos (quase 21 milhões) seria quatro vezes maior do que a população da época.
Sem o número suficiente de vacinas, com a resistência ao uso de máscaras de proteção e desrespeito ao distanciamento social, índices de casos e mortes podem voltar a crescer. E o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que ainda não se vacinou, segue atacando medidas de prevenção ao coronavírus, provocando aglomerações e defendendo tratamentos precoces ineficazes.
No Brasil, quase 62% da população tomou a primeira dose da vacina, e cerca de 30% completou o ciclo vacinal (com segunda dose ou dose única). Com a adesão dos brasileiro à vacinação, o país tem bons índices de aplicação de primeira dose quando comparado com EUA e algumas nações europeias.
Enquanto o mundo discute a aplicação de uma terceira dose ou dose de reforço, o Governo Federal reduz em 85% as verbas para a compra de vacinas em 2022. Segundo a previsão do Projeto de Lei Orçamentária do ano que vem, apenas R$ 3,9 bilhões serão destinados para a aquisição do imunizante, ao contrário dos R$ 27,8 bilhões autorizados em 2021.
Na contramão dos cortes de verbas, infectologistas ouvidos pela Band avaliam a possibilidade de novas campanhas de vacinação em massa, mesmo após a aplicação das duas doses em toda a população. A aplicação da terceira dose em idosos já foi anunciada pelo Ministério da Saúde, e algumas cidades já iniciaram o processo.
Vídeo: Terceira dose pode ser necessária; entenda como a proteção das vacinas cai com o tempo
“A revacinação poderia ser uma solução. Por isso, propusemos a terceira dose. Talvez, exista a possibilidade de refazer a aplicação das duas doses. Dependendo da revacinação e da terceira dose, da capacidade de aperfeiçoamento dessas vacinas, talvez consigamos controlar a pandemia”, explicou o infectologista Marcelo Otsuka, coordenador do Comitê de Infectologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Infectologia.
“Neste momento, com as vacinas que temos, ainda mais com a queda na resposta imune, isso provavelmente não será alcançado”, avalia Otsuka.
O infectologista também destaca a capacidade da vacinação em massa do Brasil, levando em consideração que a população não aderiu ao negacionismo defendido pelo presidente contra as vacinas. Por outro lado, Otsuka alerta que os brasileiros não alcançarão a chamada “imunidade de rebanho”, pois o vírus ainda estará em circulação, mesmo que os resultados da imunização sejam excelentes.
O Governo Federal, ao contrário, segue otimista ao se basear nas atuais “melhoras” nos números de vacinação, infecção e óbitos, decorrentes do avanço da vacinação, ainda que o processo de imunização tenha começado tardiamente no país.
“Com as informações que temos hoje, com os números melhorando, com as tendências atuais de vacinação e queda no número de casos, não há uma justificativa [para criar um orçamento extraordinário à compra de vacinas em 2022]. Porém, a gente não consegue prever o que terá em 2022. Se tiver, de fato, uma imprevisibilidade, [o orçamento extraordinário] é um instrumento adequado. Hoje, eu não vislumbro isso”, argumentou Bruno Funchal, secretário especial do Tesouro e Orçamento, órgão vinculado ao Ministério da Economia,
Corrida por vacinas: e o Brasil?
Vale lembrar que todos os países estão na corrida das vacinas, buscando imunizantes para primeiras e segundas doses, além da dose de reforço ou de uma terceira dose. Mas as principais farmacêuticas do mundo estariam preparadas para a produção e distribuição de imunizantes para outras eventuais duas doses? Na avaliação do coordenador do Comitê da Sociedade Brasileira de Infectologia, não.
Vídeo: Vacinação de Bolsonaro poderia ser exemplo, diz Marcos Pontes
“O mundo inteiro não está preparado. Mas, quem for inteligente, já vai correr atrás, seja para produzir vacinas ou até para exportar. Caminhamos para uma revacinação, por conta dessa queda na resposta imune. O nosso organismo precisa ter uma resposta imunológica de prontidão. Para manter o nível de anticorpo adequado contra o coronavírus, nem a infecção natural faz isso. Então, a possibilidade é revacinação”, continuou Otsuka.
Em uma situação em que o Orçamento de 2022 não garante verbas suficientes para o aumento de demanda no número de doses para imunização, o passado nos mostra que esta pode não ser uma boa prática do Governo.
Em depoimento à CPI da pandemia, em tramitação no Senado Federal, representantes da Pfizer disseram que o Executivo, em agosto de 2020, ignorou três propostas para o fornecimento de vacinas, das quais duas prometiam a entrega de 1,5 milhão de doses ainda naquele ano. O primeiro contrato só foi fechado em 08 março de 2021, no sétimo contato da farmacêutica, quando o país já contabilizava mais 260 mil óbitos pela doença.
CPI encontra evidências de corrupção e vacina superfaturada
A situação da compra de vacinas pelo Governo Federal ficou ainda mais complicada após o contrato de R$ 1,6 bilhão do Ministério da Saúde com a Precisa Medicamentos/Bharat Biotech entrar no radar da CPI.
Em fevereiro de 2021, houve o interesse brasileiro em adquirir 20 milhões de doses do imunizante Covaxin, mesmo sem sequer ter o aval da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) para o uso emergencial. Senadores acreditam em superfaturamento, já que cada dose teria custado 1.000% a mais do que, seis meses antes, era anunciado pela própria fabricante indiana, conforme divulgou o Estado de São Paulo.
O caso só veio à tona após um servidor da área de exportação do Ministério da Saúde, Luís Ricardo Miranda, desconfiar de corrupção no contrato. Ele alertou o irmão, o deputado federal Luís Miranda, que disse que informou pessoalmente o presidente Bolsonaro sobre a denúncia de “pressão atípica” e “pressa inexplicável” para aquisição das doses da Covaxin, cujo contrato foi fechado em 97 dias contra os 337 da Pfizer.
Para o comando da CPI, o que mais chama a atenção é que o pagamento para as duas empresas seria feito por meio de uma terceira companhia, sediada em Cingapura, país considerado um paraíso fiscal. Segundo o relator Renan Calheiros, isso dificultaria o rastreio de possíveis crimes financeiros. Após o escândalo, o Governo disse que não pagou um centavo à Precisa Medicamentos e suspendeu o contrato com a intermediária.
Na reta final da CPI, o senador Randolfe Rodrigues avalia que os últimos depoimentos destacam corrupção no Ministério da Saúde desde de 2020. Segundo o parlamentar, havia esquemas para a aquisição de testes rápidos e até de camisinhas. “Essa empresa, de nome Precisa, era influente, no âmbito do Ministério da Saúde, com contratos e golpes que empreendia no povo brasileiro”, disparou em entrevista à BandNews TV.
Negacionismo prejudica a ciência e o combate à pandemia
Mesmo com todos os entraves políticos e institucionais, o combate à pandemia ficou marcado pelo negacionismo, quando grupos levantaram pautas contra as vacinas, máscaras e isolamento social. Ao mesmo tempo, defendem tratamentos precoces com medicamentos sem eficácia comprovada pela ciência. Em vários momentos, o próprio presidente Bolsonaro chegou a defender o uso da hidroxicloroquina e ivermectina.
Em meio a esse negacionismo, cientistas brasileiros sofrem com a falta de investimento em pesquisa, o que pode ter comprometido a reação do Brasil à pandemia. A infectologista do Comitê de Imunização da Sociedade de Infectologia, Rosana Richtmann, lembra que os cortes de verbas para a ciência ocorrem há anos, bem antes da pandemia, o que provocou a fuga das “mentes brilhantes brasileiras”.
“As mentes brilhantes brasileiras, infelizmente, não estão mais vivendo no Brasil porque o incentivo à pesquisa é cada vez pior. Para você ser um pesquisador no Brasil, além de ter uma mente brilhante, você tem que ter muita perseverança e resiliência, no sentido de saber que você não vai conseguir chegar aonde poderia. Isso vem de antes da pandemia. A pesquisa não foi vista como algo prioritário”, lamentou a infectologista.
Pandemia e Ministério da Ciência com pouca verba
Vale lembrar que, em 2021, o Orçamento Federal para o Ministério da Ciência e Tecnologia teve uma redução de 28,7%, quando comparado a 2020.
Neste ano, a ordem foi de R$ 8,3 bilhões. Desse total, apenas R$ 2,7 bilhões foram disponibilizados para investir em pesquisa contra os R$ 3,2 bilhões do ano anterior. Em 2015, por exemplo, a pasta destinou R$ 6,5 bilhões para o mesmo fim.
Em meio a tudo isso, existe ainda desabafo de quem está na linha de frente contra a covid-19: “A pandemia evidenciou o despreparo e falta de sensibilidade das autoridades”, finalizou Rosana.