Tido como o principal líder da oposição ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) desembarcou, na manhã desta quinta-feira (30), no Aeroporto Internacional de Brasília, depois de três meses nos Estados Unidos. A saída do Brasil se deu às vésperas da posse do rival petista como novo chefe do Poder Executivo.
A volta de Bolsonaro ao Brasil é marcada pela manutenção dele no cenário político. Inclusive, ele deve ser o presidente de honra do PL, a convite do próprio Valdemar da Costa Neto, atual presidente da sigla e um dos aliados bolsonaristas que estavam na linha de frente durante a campanha e no questionamento da integridade das urnas eletrônicas.
Reforço na segurança
Para a volta de Bolsonaro, o PL solicitou reforço na segurança do entorno do aeroporto do desembarque. Ofícios foram enviados ao governo do Distrito Federal, responsável pela Polícia Militar, Ministério da Justiça e Polícia Federal (PF), sob a tutela de Flávio Dino (PSB).
Na última terça-feira (28), o ministro Flávio Dino informou que, à pasta dele, cabe apenas fazer a segurança dentro do terminal aéreo. Na área externa do aeroporto, a responsabilidade é do governo do DF. A declaração foi uma resposta a opositores durante audiência com a presença do maranhense na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal.
Linha do tempo pós-eleição
No contexto desse retorno, há diversos fatos que a Band lista, nesta reportagem, que envolveram o ex-presidente. Entre os exemplos, há a recusa em passar a faixa presidencial para Lula, os atos criminosos ao Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal (STF) e Palácio do Planalto e até mesmo joias milionárias trazidas por comitiva do governo dele sem serem declaradas à Receita Federal. Veja a linha do tempo abaixo.
Derrota para Lula
Assim que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) confirmou a vitória de Lula sobre Bolsonaro nas eleições do ano passado, o silêncio tomou o então presidente da República. De imediato, ele não reconheceu o resultado das urnas e apoiadores, no dia seguinte, fecharam diversas rodovias do país sob a alegação, sem provas, de fraude nas eleições.
O segundo turno presidencial ocorreu no dia 30 de outubro, com resultado divulgado na mesma noite, quando começaram as primeiras movimentações nas rodovias dos manifestantes contrários a Lula. Bolsonaro só se manifestou contra esses bloqueios quatro dias depois, no dia 4 de novembro.
Quero fazer um apelo a você. Desobstrua as rodovias. Isso daí não faz parte, no meu entender, dessas manifestações legítimas. Não vamos perder, nós aqui, essa nossa legitimidade
Indiretamente, Bolsonaro só reconheceu a vitória de Lula quase dois dias depois da confirmação do TSE. O tradicional telefonema do perdedor ao presidente eleito não ocorreu. No Planalto, o ainda presidente agradeceu os mais de 58 milhões de votos recebidos e insistiu em criticar o sistema eleitoral.
“Os atuais movimentos populares são frutos de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral. As manifestações pacíficas sempre serão bem-vindas, mas os nossos métodos não podem ser os da esquerda, que sempre prejudicaram a população, como invasão de propriedade, destruição de patrimônio e cerceamento do direito de ir e vir”, afirmou o ex-presidente.
Mas a saga para descreditar o resultado do segundo turno persistiu no meio bolsonarista. O PL, sob a liderança de Costa Neto, entrou com uma ação para invalidar os votos em cerca de 280 mil modelos de urnas eletrônicas. Em resposta, o ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE, multou o partido em R$ 22,9 milhões. O plenário da Corte referendou a decisão semanas depois.
Bolsonaro não passou a faixa
Apesar das tentativas bolsanaristas de invalidar o resultado das eleições, Lula foi diplomado pelo TSE em 12 de dezembro. O então presidente já havia sinalizado que não passaria a faixa ao eleito. A promessa foi cumprida e, na véspera do fim do mandato, Bolsonaro viajou rumo à Flórida, nos Estados Unidos.
Em 1º de janeiro, em meio à tensão de manifestantes acampados em frente a quarteis e até de uma tentativa de atentado com bomba no Aeroporto Internacional de Brasília, Lula tomou posse. Sem Bolsonaro, a faixa, de forma inédita, desde a redemocratização, foi passada por pessoas comuns, estas incluídos em grupos minoritários (mulheres, negros, deficientes, etc.).
Acampamentos continuaram
Mesmo com o sucesso da posse, no que diz respeito à segurança, e normalidade institucional, manifestantes contrários a Lula continuaram reunidos em frente aos quarteis. O ainda senador eleito Flávio Dino, em dezembro do ano passado, chegou a chamar os acampamentos de “incubadoras de terroristas”.
As acusações que impunham desconfiança às urnas eletrônicas viraram arsenal para grupos contrários ao resultado das eleições continuarem os atos, mesmo sem indícios de fraude. Além de Lula, o TSE e STF eram alvos dos ataques. Ainda na primeira semana do novo governo, ônibus de diversas partes do país chegavam à Brasília com milhares de manifestantes.
O 8 de Janeiro
Quanto mais os dias se passavam, mais a pressão em Brasília aumentava, até que, em 8 de janeiro, a panela estourou. Milhares de pessoas ultrapassaram barreiras policiais e invadiram e depredaram prédios públicos na Praça dos Três Poderes. O STF, Planalto e Congresso foram os alvos dos criminosos.
Os ataques resultaram em prejuízos milionários. Obras de arte, cujos valores artísticos e históricos são inestimáveis, foram destruídas.
No mesmo dia, o presidente Lula decretou intervenção federal no Distrito Federal para retirar das mãos do governo local o comando da Polícia Militar. Já o ministro Alexandre de Moraes, horas depois, determinou o afastamento do governador Ibaneis Rocha (MDB) do cargo por 90 dias, além pedir a prisão preventiva de Anderson Torres, que chegou a ser demitido da Secretaria de Segurança Pública do DF (SSP-DF).
Torres foi ministro da Justiça e Segurança Pública no governo Bolsonaro. No dia dos ataques, ele estava nos Estados Unidos, de férias com a família, conforme informou logo após saber do pedido de prisão. Na casa dele, foi encontrada uma minuta que previa um golpe de Estado, o que é inconstitucional.
Em depoimento, o ex-chefe da SSP-DF disse que não sabia de quem era autoria do documento e que ele não tinha valor.
Bolsonaro sobre o 8 de Janeiro
Sobre os ataques do 8 de Janeiro, Bolsonaro lamentou os crimes e chamou as práticas de “inacreditáveis”. A Procuradoria Geral da República (PGR) pediu ao MPF para incluir o ex-presidente no inquérito que apura a autoria intelectual dos crimes em Brasília. O opositor de Lula, porém, negou a participação nos atos.
Em paralelo ao processo do STF, o TSE incluiu a “minuta do golpe” encontrada na casa de Torres em processo que pode tornar Bolsonaro inelegível. A ação movida pelo PDT apura declarações do ex-presidente, quando ainda estava no cargo, a embaixadores sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas.
Presentes sauditas
As polêmicas envolvendo Bolsonaro não pararam nos atos do 8 de Janeiro. Em fevereiro, uma reportagem do jornal O Estado de São Paulo revelou que o governo da Arábia Saudita teria presenteado o ex-presidente e a ex-primeira-dama com joias cravejadas de diamantes, peças avaliadas em R$ 16,5 milhões.
As joias foram trazidas ao Brasil pela comitiva do Ministério de Minas e Energia, chefiado por Bento Albuquerque. Um assessor da pasta, Marcos André Soeiro, estava com as peças dentro uma bolsa, quando foi abordado pela alfândega do Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo.
A Polícia Federal investiga o caso, dada a falta de declaração tributária e também pelo fato de que, por determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), os presentes integrar o acervo da Presidência, e não o pessoal do Bolsonaro. A própria Receita informou que, por várias vezes, o governo tentou, de forma irregular, recuperar as peças.
Deputados que conversaram com Bolsonaro disseram que ele nega qualquer ilegalidade. Para a CNN, o ex-presidente afirmou não pediu nem recebeu o presente e que as joias seriam inseridas no acervo público da Presidência da República.
Devolução de outros presentes
Além das peças milionárias, estava em posse de Bolsonaro um kit com outros presentes dados pelo governo saudita. As peças, (relógio, abotoaduras, caneta, anel e um rosário islâmico), avaliadas em quase R$ 500 mil foram devolvidas à União por ordem do TCU.
Além das joias sauditas, a defesa de Bolsonaro também teve que devolver armas presenteadas pelos Emirados Árabes Unidos. São elas: um fuzil da marca Caracol, modelo CAR 816, calibre 5,56, e uma pistola da mesma marca, modelo 1911, calibre 9x19mm.