Executivo largou carreira, virou drag aos 51 anos e vive como diva do Carnaval

Com peruca rosa e salto alto, Mama Darling comanda o maior bloco LGBTQ+ do Carnaval de rua de São Paulo

Por Leonan Oliveira

Dizem que o sonho de todo folião é que a alegria do Carnaval dure o ano inteiro e, nesse caso, Fernando Magrin pode se considerar a pessoa mais feliz do Brasil. Prestes a completar 58 anos de idade, ele é um dos responsáveis por colocar o Bloco Minhoqueens nas ruas de São Paulo e assume cada vez mais a posição de ícone da comunidade LGBTQ+ ao dar vida à drag queen Mama Darling.

Com peruca rosa, maquiagem colorida e roupas extravagantes, a drag queen arrasta multidões com o bloco de Carnaval que fundou em 2016 - o Minhoqueens - e acabou se tornando o grande projeto transformador de sua vida. Em entrevista ao Band.com.br, Fernando conta que o nascimento de Mama Darling aconteceu de maneira natural, mas intensa: ele abandonou a carreira de executivo de uma companhia aérea para se dedicar à vida agitada da diva, que é apresentadora de bloco, palestrante e animadora de eventos.

“Eu nunca tinha pensado que eu iria ser uma drag queen, que abraçaria essa arte, até mesmo porque quando o bloco saiu, eu tinha 51 anos de idade e uma carreira numa companhia aérea como um executivo”, lembrou. Ele explicou que, com a crescente popularidade do Minhoqueens, aproveitou um momento de cortes da empresa em que atuava para se afastar do mundo corporativo - decisão da qual diz não se arrepender. “Na pandemia, o setor aéreo foi muito afetado e a gente teve alguns cortes. Eu acabei saindo para me dedicar à carreira da Mama e essa é a vida que eu estou levando agora. E está sendo maravilhoso”, disse. 

Apesar da maneira como Mama Darling tomou espaço e ganhou protagonismo em sua vida, Fernando Magrin destacou que demorou para perceber que tinha “virado drag”, já que toda a base do projeto começou apenas como um evento para amigos. Junto de um ex-namorado, ele promovia festas em sua casa e, com o tempo, passou a brincar com roupas femininas e maquiagem, até que a festa saiu da sala de casa e virou um encontro público no Minhocão - que serviu de inspiração para o nome oficial do bloco. 

Ele contou que a decisão de abrir a festa para o público foi para proporcionar, para pessoas que tivessem vontade de se montar, um espaço seguro para isso. Da brincadeira, Mama Darling teve sua personalidade desenvolvida e nasceu para o mundo antes mesmo de seu criador se dar conta disso. “Olha que coisa doida, né?”, refletiu.

No primeiro ano, me perguntavam ‘Qual é o seu nome?' e eu dizia ‘Fernando’ porque não tinha noção. Me respondiam ‘Não, qual é o seu nome de drag?' e aí eu virei pro meu ex-namorado e falei: ‘Menino, eu sou drag!’

No fim das contas, ainda durante a entrevista ao Portal da Band, Fernando disse ser muito grato por toda a transformação trazida por Mama Darling para a sua vida e destacou que a desenvoltura da personagem é responsável pela realização de alguns sonhos. “O Fernando é muito feliz de ter criado a Mama e a Mama é feliz que o Fernando a criou, porque se a Mama não tivesse aparecido, muita coisa na minha vida não teria acontecido”, disse. 

Eu acho que a Mama tem muito do Fernando e o Fernando acabou tendo muita coisa da Mama também. Eu acho que um dá vida ao outro, né?

Ele destacou também que sente muito orgulho das conquistas da Mama e contou que a apresentadora do Minhoqueens faz parte de todos os setores de sua vida. “O Fernando não tem vergonha da Mama não, tá? Pode vir um ‘date’ aqui na minha casa, vai ver um quadro da Mama na parede e vou dizer ‘Sou eu, sim’. E digo com muito orgulho”, celebrou.

Mama Darling é inspiração de coragem

Com a consagração de ícones como Kaká Di Polly e ascensão de nomes como Pabllo Vittar e Gloria Groove, a cultura drag nunca esteve tão forte no Brasil e, para Mama Darling, sua missão nesse cenário é servir como inspiração de coragem e mostrar que pessoas mais velhas também podem se redescobrir e dar um novo significado à suas vidas. 

“Muitos pensam que quem passou dos 50 tem que ficar em casa, se aposentar e não conseguem imaginar que eu virei drag depois dos 50”, disse. “Eu continuo na balada, continuo tocando o bloco, me montando, fazendo festas, dando palestras e levando a vida sendo feliz. Não estou fazendo tricô em casa, não”, festejou.

Apesar da esclarecida opinião sobre a importância da contribuição de Mama Darling para a comunidade LGBTQ+, Fernando Magrin confessa que, às vezes, precisa se controlar para não cair nas armadilhas da própria vaidade e busca lembrar que o envelhecimento é sinônimo de história para contar e anos de evolução pessoal. “Ninguém de 18 anos leva um Prêmio Nobel, é sempre alguém que tem uma história para contar”, brincou.

Obviamente, o lado vaidoso de cada um fica meio assim quando você olha no espelho e pensa ‘aí, tô envelhecendo’, mas aí eu paro e penso que, se eu estou envelhecendo, é porque eu tenho uma vida e uma história pra contar. E eu continuo fazendo história.

Para sua realização pessoal enquanto ícone da comunidade LGBTQ+ de São Paulo, Mama Darling conta que passou a entender que sua missão estava sendo cumprida por conta dos recorrentes comentários de outras pessoas mais velhas que decidiram dar uma nova história para suas vidas após observar a trajetória de Fernando. “Eu não tinha me dado conta disso, de que eu tinha virado uma drag queen com 51 anos de idade e que isso seria uma inspiração para as pessoas, até eu começar a receber mensagens no Instagram de gente dizendo que me admirava ou que tinha tomado alguma decisão vendo a minha vida, se baseando naquilo que eu fiz”, contou.

Além da proximidade com os mais velhos, a apresentadora do Bloco Minhoqueens - que atrai pessoas de todas as idades - celebra também a receptividade e o carinho que recebe dos mais novos. Ela conta que consegue sentir esse carinho nas interações durante as festas que frequenta e destaca que passou a desenvolver uma relação quase maternal com a nova geração. “Eu gosto de andar no meio deles, estar próxima… Quando a pessoa sai da festa, se eu estiver na porta, falo ‘Cuidado com o celular, fica aqui, chama o Uber daqui de dentro’. É uma postura um pouco de mama, né? Cuidando dos seus filhinhos”, contou. 

Carnaval é motivo de orgulho e emoção para Mama Darling

Apesar da folia e do trabalho árduo durante os dias de evento para o Minhoqueens, Mama Darling diz que o Carnaval é motivo de muito orgulho para ela e todos os envolvidos no bloco. Ela contou que é preciso de muita gente para que tudo saia dentro dos conformes, que muitas pessoas ficam atentas para que ela consiga esquecer as questões burocráticas do trabalho e fazer com que os foliões curtam a festa. 

Com lágrima nos olhos e bastante emoção, a drag queen explicou como se sente ao ver tanta gente envolvida e se divertindo em um projeto que ela criou de maneira tão apaixonada. “Olhar aquela multidão seguindo um trio e saber que foi um bloco que eu criei, obviamente que junto com outras pessoas que fizeram a coisa acontecer, me emociona e muito”, disse. “Eu me emociono porque viramos um dos maiores blocos da cidade de São Paulo e um bloco que nasceu assumidamente LGBTQIA+. Isso me enche de alegria”, completou.

Engana-se quem pensa que a folia termina para Mama Darling depois do desfile oficial do Minhoqueens. Pensando em uma maneira de deixar um pouco de lado as responsabilidades de promover um evento tão grande, a drag queen contou que desenvolveu o Bloco da Mama - que faz o trajeto original do Minhoqueens e serve como uma comemoração para Fernando e os demais envolvidos no trabalho. “Eu quis fazer esse bloco para que nesse dia a gente só se divirta. É um bloco menor, não tem aquela muvuca gostosa do Minhoqueens, é mais tranquilo e a gente se diverte um monte”, explicou. 

Questionada sobre planos para o futuro e os sonhos de uma drag que nasceu cheia de energia aos 51 anos, Mama Darling disse que desejar continuar levando amor por meio de seu trabalho, que seu bloco cresça cada vez mais e brincou: Meu grande sonho realmente é que o Minhoqueens continue. De resto, obviamente é aposentar e viajar o mundo, né? Porque eu saí da empresa, mas eu não perdi meu benefício de viagem, tá? Posso viajar de graça o resto da vida, e quem casar comigo também. Então, fica a dica". 

Em 2023, o Bloco Minhoqueens desfila no dia 18 de fevereiro, às 12h, com concentração na Praça da República. O Bloco da Mama, celebração pelo sucesso do desfile principal, acontece no dia 25 de fevereiro, às 13h, na Rua Augusta. 

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