Fluvia Lacerda: "Há resistência no mundo fashion contra a libertação do padrão"

Luz Lancheros, do Metro Jornal

Fluvia Lacerda fala sobre o padrão na indústria da moda
Fluvia Lacerda fala sobre o padrão na indústria da moda
Reprodução/Instagram

Ela tem mais de 400 mil seguidores no Instagram e é conhecida como a Gisele Bundchen plus size. A brasileira Fluvia Lacerda é uma das modelos da América Latina que chegaram à Vogue Itália e apareceram na capa da Playboy do país. Além de ter uma extensa carreira trabalhando com grifes internacionais, ela é autora do livro Gorda Não é Palavrão e é uma das estrelas do programa Beleza GG, do canal E!

No formato de documentário, o reality show segue as experiências de Fluvia e das colegas Mayara Russi e Nahuane Drumond para mostrar como a indústria plus size cresceu, além dos desafios em ter um papel representativo em um mundo hostil até mesmo para quem é considerada “normal”. O Metro Jornal falou com a modelo sobre sua participação na segunda temporada do programa, que foi assistido em 49,5 milhões de lares apenas na América Latina.

Conte sobre seu papel em normalizar a beleza plus size no Brasil. Que problemas você ainda enfrenta?

Em 2007 eu decidi trazer minha carreira para o Brasil porque percebi que não havia uma indústria da moda focada em mulheres plus size no meu país. Na época, havia pouquíssimas marcas e eu investi muito em pesquisa para falar sobre isso na mídia, para que o assunto aparecesse mais. Muito do que eu plantei mais de uma década atrás está rendendo frutos agora. Mas ainda temos um longo caminho para fazer esse nicho crescer.

Como surgiu a oportunidade de se tornar uma modelo plus size e como você se destacou no mercado de moda internacional?

Uma editora de moda me descobriu num ônibus em Nova York, em 2003. As oportunidades apareceram e eu desenvolvi uma combinação de habilidades que se tornaram o que eu chamo de “pacote completo” que me levou a ter sucesso. Tino para negócios, fotogenia, visão ampla sobre a indústria da moda, dedicação e muita seriedade em conduzir minha carreira são alguns dos aspectos que eu considero importantes para fazer sucesso como modelo plus size.

E como foi para chegar ao Beleza GG?

O produtor do projeto me convidou. Eu sempre deixei claro que eu não sou atriz e não tinha vontade de expor minha vida pessoal ou complicar minha vida colocando câmeras no meu trabalho diário. Mas pouco a pouco eu entendi que era possível compartilhar o que achasse conveniente e que isso seria importante para mostrar meu lado profissional a nível internacional.  Para que o público entendesse que há seriedade, respeito e muito profissionalismo no que eu faço. Com o tempo, eu comecei a gostar e a reconhecer tudo isso como algo valioso no processo de eliminar estereótipos das mentes de muitas mulheres.

Como você se sente quando vê que a diversidade recebe um espaço importante na televisão?

Aliviada! Não está ainda no nível que deveria estar, mas estamos fazendo grandes avanços com programas como Beleza GG, graças à capacidade do E! em desenvolver uma produção original como essa, que promove inclusão, diversidade e empoderamento feminino.

O que você espera transmitir com o programa?

Um novo horizonte para as mulheres. Um parâmetro mais livre e amplo para que elas entendam mais claramente como estão presas por preconceitos da sociedade e que a libertação chegou para todas elas.

Muitas de suas colegas como Tess Holliday [modelo plus size norte-americana] são constantemente criticadas e sofrem agressões por supostamente defender a obesidade. O que você acha disso?

Nós refletimos o que temos por dentro. Todos esses ataques refletem as mentes dessas pessoas. Sempre há quem tenta justificar ou esconder seus ódios com desculpas [sobre saúde] que machucam tanto quanto um ataque. Essa é uma estratégia super bem-sucedida, nós já conhecemos. O processo para reverter essa negatividade é muito complicado. Infelizmente, não tem jeito de escapar dos efeitos horríveis disso. É péssimo para a saúde mental de qualquer um, mas, pouco a pouco, com muitas figuras fortes e perseverança, nós estamos desarmando esses argumentos lamentáveis e que nos sufocam.

O que é preciso hoje para ser uma modelo plus size?

No Brasil, profissionalismo e orientação de agências renomadas. Além disso, você precisa ser resistente para encarar críticas e agressividade. Hoje é fácil cair nas armadilhas do desespero. Muitas meninas acreditam que as curtidas nas redes sociais são garantia de uma carreira sólida e séria e acabam se perdendo no caminho.

Na sua opinião, por que o mundo ainda é reticente sobre a beleza que não é tão “normal”?

Normalizar coisas  fora do padrão na mídia é um longo e árduo processo. Nós ainda temos uma bolha de hipocrisia e resistência dentro do mundo fashion que é contra essa libertação. Mas esse processo é inevitável e crucial.

Como a  série ajuda a normalizar os corpos fora do padrão?

‘Beleza GG’ vai demonstrar o sucesso, poder e inteligência das mulheres que não sucumbiram às regras impostas e provaram que elas podem vencer além do que foram levadas a acreditar que podiam.