Na vida agitada de Luiz Argila, 69, a corrida mudou completamente os hábitos do dia a dia. O cigarro ficou no passado, a alimentação se transformou e o stress virou raridade. Os treinos preencheram boa parte da rotina e o hobby virou uma nova profissão, mas uma preocupação importante foi deixada um pouco de lado: a saúde do coração.
O primeiro infarto de Luiz, que hoje é treinador de corrida, aconteceu após uma meia maratona. Ele já havia passado por exames que indicavam alterações cardíacas e sabia que deveria investigar mais a fundo. Entretanto, com a prova marcada, adiou o retorno ao médico. Sentiu dores no fim da prova e não imaginou que fosse um infarto, mas saiu do hospital com três stents no coração.
“Eu sabia que tinha algum problema por um exame de teste de esforço na esteira. O médico disse que eu tinha uma isquemia e precisaria fazer mais exames. Só que não deu tempo, enquanto aguardava a liberação de convênio, eu fui para a prova. Fui dirigindo para o hospital, já sabia que tinha alguma coisa errada mesmo, né?”, relata Luiz.
O cardiologista Alexsandro Fagundes, presidente da Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas, explica que durante uma corrida o coração aumenta sua frequência cardíaca e a capacidade de contração.
“Imagine que no repouso o coração bombeia algo em torno de 5 a 7 litros por minuto e no exercício essa capacidade vai aumentar em 4 a 5 vezes. Isso acontece por conta de um ajuste do sistema nervoso autonômico que reconhece a atividade física e aumenta o retorno venoso, ou seja: o coração aumenta a sua capacidade de contração bombeando mais sangue”, diz.
O aumento do número de corredores amadores tem despertado a atenção da comunidade médica. Se por um lado esse fenômeno é celebrado por estimular o exercício físico, por outro, especialistas alertam para a importância de manter os exames em dia, sobretudo antes de iniciar qualquer prática esportiva, mesmo que esporádica.
“Se você tem uma artéria entupida, ou uma predisposição para arritmia, quando você coloca o seu corpo num nível de estresse muito grande, somente nos finais de semana, você pode predispor a um problema que você às vezes tem e não sabe”, explica a cardiologista e especialista em Medicina do Esporte do Hcor, Cristina Milagre.
Hora de procurar o cardiologista
Uma pesquisa da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo apontou que 23% da população nunca fez exames cardiológicos. O momento certo de procurar um cardiologista depende do histórico familiar, idade e fatores de risco, como diabetes, colesterol e hipertensão.
“Em termos de exames diagnósticos, o eletrocardiograma a gente sempre vai fazer, o teste de esforço, que é o teste ergométrico, e o ecocardiograma também é um exame que a gente solicita para avaliar a estrutura do coração”, explica a cardiologista.
Depois do primeiro infarto, Luiz ainda teve outro episódio também após uma prova. Ele tem diagnóstico de cardiopatia grave e uma das principais recomendações médicas é não parar a atividade física.
“Eu sempre corria com frequencímetro. Eu não deixo o coração “apanhar”. Meu coração bate normal dentro das frequências já estabelecidas em teste. As pessoas esquecem que o coração tem que ser controlado. Eu acho que estou vivo de até agora porque sempre controlei a minha frequência cardíaca desde o meu primeiro infarto”, explica
O currículo de provas ao longo de mais de 30 anos de dedicação a corrida impressiona. Ao todo, Luiz participou de 3 ultramaratonas, 15 maratonas e mais de 50 meias maratonas. Além de corridas de aventura e até montanha.
O cardiologista Fagundes explica que a indicação de não praticar exercícios físicos praticamente não existe, pois, o repouso é prejudicial e compromete mais do que a atividade física, mesmo em pessoas com doenças cardiovasculares. O treinamento direcionado pode aumentar a capacidade física, facilitar o tratamento da doença e melhorar a qualidade de vida dos pacientes com cardiopatias.
Mortalidade das doenças cardíacas
As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte no Brasil, superando em duas vezes os óbitos causados por câncer e três vezes os de doenças respiratórias, segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia. São 400 mil mortes por ano, e estima-se que 14 milhões de brasileiros convivam com alguma condição cardiovascular.
O cenário global também é alarmante: de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 17,9 milhões de pessoas morrem anualmente por doenças cardiovasculares, o que representa 31% de todas as mortes no mundo. Mais de três quartos desses óbitos ocorrem em países de baixa e média renda.
Diante desse cenário preocupante, o Dia Mundial do Coração (29) alerta sobre a importância da prevenção e atenção aos fatores de risco, como hipertensão, diabetes e colesterol.
A Band exibiu a série especial Coração Alerta, que abordou a importância da prevenção e os avanços da cardiologia no Brasil. A série de quatro episódios mostrou como as pessoas convivem com problemas cardíacos, as inovações nos exames e tratamentos, e a influência da má alimentação na saúde do coração.