Volta de Trump anima grupo que prega ocupação de terras palestinas por Israel

Por Estadão Conteúdo

A ofensiva desencadeada pelo ataque do Hamas, em 2023, abriu as portas para o retorno de tropas israelenses à Faixa de Gaza. A princípio, Israel justificou como parte da guerra e disse que não tinha intenção de permanecer no local. Mas, nos últimos três meses, sinais concretos de ocupação no longo prazo começaram a surgir e grupos de colonos passaram a defender a anexação com mais veemência e apoio de parte do governo.

Fotos de satélite analisadas pelo New York Times indicam que os soldados israelenses demoliram mais de 600 prédios no corredor Netzarim, estrada de 10 quilômetros que divide o enclave em dois. Com as demolições, os militares passaram a controlar uma área de 46 km². A Faixa de Gaza tem 360 km².

Esse território faz parte de uma "zona de proteção", com postos militares, bases e torres de comunicação, afirma o NYT. Uma parte foi erguida no início da guerra, mas muitas construções seguem em andamento. De 19 bases identificadas, 12 foram construídas ou expandidas a partir de setembro.

O Exército israelense nega que as bases signifiquem uma ocupação prolongada. "Qualquer coisa que tenha sido construída pode ser desmontada em um dia", disse o coronel Nadav Shoshani, porta-voz militar israelense.

Sinal verde

No entanto, o local em que a zona de proteção foi estabelecida, entre a Cidade de Gaza e Khan Younis, reflete planos declarados de ministros de Netanyahu para ocupar os territórios palestinos, com o apoio de colonos. No dia 26 de novembro, o ministro das Finanças de Israel, Bezalel Smotrich, declarou que pretende reduzir a população de Gaza pela metade. "Podemos e devemos conquistar Gaza", disse.

Extremista e colono na Cisjordânia, Smotrich jamais escondeu seu objetivo. Integra o gabinete outro nome que defende a mesma ideia: o ministro de Segurança Itamar Ben-Gvir. Ambos têm boas relações com a Nachala, organização de colonos que planeja a reocupação de Gaza e da Cisjordânia.

Em outubro, a Nachala realizou em Be'eri, kibutz destruído no ataque do Hamas, a conferência "Preparando-se para Reassentar Gaza". Smotrich e Ben-Gvir participaram, assim como deputados do partido Likud, de Netanyahu. Eles defenderam a reocupação no modelo semelhante ao que existiu até 2005.

Segundo a presidente da Nachala, Daniella Weiss, o plano é fazer os palestinos "desaparecerem". Em diversas entrevistas, ela repete que os palestinos querem ir para outros países. "Como fazemos isso? Encorajamos. Não estou dizendo forçar, mas habilitar, porque eles querem ir", disse à BBC, em março.

Apesar de a maioria dos israelenses ser contra a ocupação de Gaza, as ideias da Nachala têm influência no governo. Em janeiro, eles apresentaram um mapa de Gaza com assentamentos pelo enclave e, desde então, ela tem ido ao território sem permissão oficial do Exército.

O discurso agressivo deixa Netanyahu em posição difícil. Qualquer tentativa de desautorizar os extremistas pode causar a queda do governo. Mas, segundo entidades que denunciam a ocupação, não é necessário que haja apoio formal para os planos avançarem.

"Tais práticas ilegais são características do governo israelense", escreveu a Anistia Internacional em relatório publicado no dia 5.

Cisjordânia

Pouco antes do ataque terrorista do Hamas, Ben-Gvir concedeu centenas de licenças para porte de fuzis para judeus que vivem na Cisjordânia, território palestino ocupado por Israel. Na maioria de suas cidades, ruas estão sendo destruídas com escavadeiras, estradas foram fechadas e postos de controle, instalados. "Há vilarejos em que as pessoas não deixam a casa vazia, porque correm o risco de ter a casa ocupada por israelenses", afirma a brasileira Hyatt Omar, de 26 anos.

Ela afirma que, após o ataque do Hamas, uma de suas tias ficou presa em casa por três meses, impedida de sair por militares de Israel que estariam fazendo a segurança de um assentamento. "Os soldados entram nas casas, trancam as pessoas e deixam sem qualquer contato externo, sem nenhum amparo legal", disse Hyatt.

A ocupação ocorre com amparo do Estado, responsável por autorizar o confisco de terras e reconhecer os assentamentos. Israel tem citado várias razões para manter as operações na Cisjordânia: direitos históricos ao território; motivos de segurança, tanto internos quanto externos; e o valor simbólico da área para os judeus.

Segundo a ONG israelense Paz Agora, que monitora as ações, 24,1 km² da Cisjordânia foram confiscados por ordem de Smotrich, entre outubro de 2023 e julho. Ele também reconheceu 8 postos avançados e incluiu outros 70 como elegíveis para receber estradas e serviços públicos. "Tudo torna a ocupação irreversível", disse Mauricio Lapchik, diretor da ONG.

Fator Trump

Desde novembro, os extremistas do gabinete de Israel ganharam novo ânimo com a vitória de Trump.

"Estávamos a um passo de aplicar a soberania aos assentamentos na Judeia e Samaria, e agora é a hora de fazê-lo", disse Smotrich, no dia 11, se referindo à Cisjordânia da maneira como os judeus ortodoxos a chamam.

No primeiro mandato de Trump, a expansão de assentamentos na Cisjordânia se acelerou. Ele apoiou reivindicações históricas de Israel, como o reconhecimento de Jerusalém como capital e a mudança da embaixada para a cidade, além de validar a anexação das Colinas do Golan, oficialmente território da Síria.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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