Como os Estados Unidos costumam ser classificados como a democracia mais antiga do mundo, não é surpresa que um sistema construído em cima de convenções e tradições tenha as suas excentricidades. Uma delas, mantida desde 1848, é o papel da imprensa em "anunciar a corrida" (call the race) em milhares de eleições por todo o país, ou seja: relatar sobre quem será declarado vencedor pelas autoridades.
Quando essa tradição começou, não havia internet, TV, nem rádio, e o telégrafo estava apenas começando a ser usado. Sem autoridade federal para coordenar os pleitos, os jornalistas decidiram assumir a função, a começar pela Associated Press (AP), que comunicava os resultados em nível nacional.
Embora o número de agências de notícias e a tecnologia tenham aumentado desde o século 19, a papel da imprensa como relatora eleitoral não oficial continuou entregar a estimativa mais rápida de quem será o próximo presidente americano.
Mas o sistema tem seus engasgos: no século 21, os eleitores chegando às urnas no extremo oeste do país talvez já saibam alguns resultados do litoral leste.
Por outro lado, certos estados – especialmente os "estados-pêndulo" (swing states), cujo papel será decisivo – podem ter que esperar dias até seus votos serem meticulosamente apurados.
Informação na mão de NEP e AP VoteCast
Os 50 estados e a capital Distrito de Colúmbia são responsáveis pela realização dos escrutínios para o presidente, o Senado e a Câmara dos Representantes dentro de suas divisas. Os resultados são anunciados oficialmente por cada estado, porém a mídia empacota tudo para seu público por meio de uma combinação de resultados oficiais ao vivo, pesquisas de intenção de voto e um conhecimento profundo da colcha de retalhos das regras eleitorais e tendências históricas americanas.
A partir de 1990, a maioria das organizações de imprensa americanas formou a associação National Election Pool (NEP), que emprega dados de boca de urna para transmitir aos parceiros jornalísticos a atualização ao vivo de todas as votações realizadas. A NEP ainda existe, transmitindo dados para os canais de comunicação ABC, CBS, CNN, NBC e Reuters através da empresa de pesquisa de mercado Edison Research.
Em 2016, porém, a Associated Press se separou desse grupo para criar seu próprio produto, AP VoteCast, atualmente usado por diversos veículos, como Fox News, NPR, PBS, Univision, USA Today e o Wall Street Journal. A DW divulga seus resultados alinhada com a Associated Press.
Embora cada uma dessas associações empregue uma metodologia diferente, seu princípio é o mesmo: anunciar o resultado quando estiver claro que o detentor da dianteira não pode mais ser derrotado naquela votação.
Ao empregar todos os dados para anunciar o vencedor corretamente, essa convenção jornalística também representa uma certa proteção contra candidatos declararem vitória prematuramente. Por outro lado, também ajuda a manter a confiança no sistema eleitoral — a qual tem decaído significativamente.
Boca de urna, intenções de voto e anúncio do vencedor
Joe Lenski, cofundador e vice-presidente executivo da Edison Research, explica como é possível a imprensa afirmar que um candidato venceu em determinado estado, se não há uma declaração oficial na noite da eleição: "Tudo o que relatamos é inoficial, mas parte de uma fonte oficial."
Mais de 3 mil funcionários de sua companhia enviam para a equipe central os resultados das apurações, seja das seções eleitorais de cidades menores ou dos grandes centros estaduais.
Além disso, realizam pesquisas de boca de urna — simplesmente perguntando aos eleitores em que votaram, assim que deixam a cabine, a fim de obter uma impressão direta. Esses e outros dados são digitados num modelo de computador que ajuda a determinar quando a disputa está decidida.
A julgar pelas consultas populares, pode levar alguns dias até certos estados apresentarem resultados claros. Em meio a tantas disputas apertadas, pode ocorrer de um órgão de imprensa romper com a NEP ou a AP VoteCast e anunciar os resultados mais cedo: seria altamente atípico, mas cada meio de comunicação tem independência editorial para tomar suas próprias decisões.
Autor: Matthew Ward Agius