A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, defendeu nesta segunda-feira (06/11) a coexistência pacífica de dois Estados e o fim do bloqueio econômico à Faixa de Gaza como parte das soluções necessárias para a paz entre Israel e Palestina no "dia depois da guerra".
"Essa política [bloqueio] não funcionou. O Hamas continuou a aumentar seu arsenal, enquanto a economia de Gaza colapsou", afirmou von der Leyen, citando os altos índices de desemprego entre os jovens como fator de radicalização. "Qualquer futuro Estado palestino precisa ser viável, também do ponto de vista econômico."
A região está sob bloqueio de Israel e Egito desde 2007, uma reação à tomada violenta do poder em Gaza pelo Hamas.
As declarações de von der Leyen foram feitas durante a conferência anual dos embaixadores da União Europeia, em Bruxelas, onde ela propôs cinco "princípios básicos" para o futuro da Faixa da Gaza:
"Deve existir apenas uma Autoridade Palestina, e um Estado palestino", afirmou von der Leyen ao argumentar pela deposição do Hamas – e Gaza, segundo ela, é "parte essencial de qualquer Estado palestino futuro". Forçar civis a deixar a região só causaria mais "instabilidade regional".
A possibilidade de um deslocamento de palestinos de Gaza para o Egito foi ventilada em documentos da inteligência israelense e estaria sendo especulada também em círculos diplomáticos, conforme relatos publicados pela imprensa internacional.
UE enviará mais ajuda humanitária para Gaza
Von der Leyen também anunciou a disponibilização de 25 milhões de euros adicionais em ajuda humanitária da União Europeia (UE) para civis em Gaza, elevando a 100 milhões o total de aportes já feitos na região.
Segundo ela, o bloco trabalha com Israel, Egito e as Nações Unidas para a criação e manutenção de corredores humanitários para assistência a civis – inclusive por via marítima.
A alemã reforçou o direito de defesa de Israel e a necessidade de proteger civis, "sejam israelenses ou palestinos". "Enquanto Israel tem o direito de lutar contra o Hamas, também é essencial que se esforce para evitar mortes de civis."
Segundo o Ministério da Saúde de Gaza, órgão controlado pelo Hamas, o saldo de vítimas no lado palestino passa de 10 mil.
Blinken deixa Oriente Médio sem pausas humanitárias
Também nesta segunda, enquanto líderes de órgãos das Nações Unidas (ONU) endossavam um pedido de cessar-fogo em meio ao saldo crescente de vítimas em Gaza e à deterioração da situação humanitária na região, o secretário de Estado americano, Anthony Blinken, encerrava seu tour de quatro dias pelo Oriente Médio sem avanço rumo às "pausas humanitárias" que o governo dos Estados Unidos passou a defender publicamente nos últimos dias.
Segundo o secretário de Estado americano, pausas na guerra permitiriam o fluxo de ajuda humanitária a Gaza e a libertação dos mais de 200 reféns presos pelo Hamas, além de conter uma possível expansão regional do conflito.
Enquanto Israel descarta pausas no conflito, países árabes pressionam por um ainda mais improvável – do ponto de vista israelense – cessar-fogo.
Blinken esteve em Israel, Jordânia, Cisjordânia, Chipre, Iraque e Turquia em busca de apoio à ideia. Enquanto isso, o Exército israelense anunciou o cerco completo à Cidade de Gaza e a separação da faixa em duas partes, no que deve ser o prelúdio de uma intensificação dos combates travados contra o Hamas.
No Chipre, Blinken conversou sobre o estabelecimento de um corredor marítimo entre o país e a Faixa de Gaza para o escoamento unilateral de ajuda humanitária para os palestinos. A ideia, encampada pelo Chipre, é apoiada por França, pela Comissão Europeia e Israel.
No Iraque, o emissário da Casa Branca advertiu sobre os riscos de expansão do conflito – houve ataques de milícias pró-Irã contra tropas americanas estacionadas no país. Em meio à escalada de tensão, o governo americano anunciou a presença de um submarino nuclear na região.
Guerra pode custar a Netanyahu sua carreira, dizem analistas
Em meio à guerra, o premiê israelense Benjamin Netanyahu tem visto a sua popularidade e de seu partido, o conservador Likud, minguar nas últimas pesquisas de opinião.
"Se a eleição fosse agora, ele perderia feio", afirmou à agência de notícias AFP Toby Greene, professor de política na Universidade Bar-Ilan e pesquisador da London School of Economics. "O apoio a Netanyahu e à sua coalizão já estava esmorecendo mesmo antes do 7 de outubro, e caiu muito mais desde a eclosão da guerra."
Embora a sociedade israelense, antes profundamente dividida, tenha colocado rapidamente as diferenças de lado para apoiar o governo e os militares na reação ao ataque terrorista do Hamas, que deixou um saldo de 1.400 mortos e ao menos 240 reféns, analistas preveem que o clima de união não durará muito uma vez que o conflito chegar ao fim.
Sob Netanyahu, um ex-comandante militar, a sensação de estar seguro se esvaiu para muitos israelenses. Falhas na segurança do país, somadas à polarização interna gerada por uma controversa reforma judiciária, tendem a desgastar irremediavelmente a imagem do longevo premiê, no cargo há 13 anos ininterruptos. "Muitos israelenses acham que essas duas questões estão associadas", afirma Greene.
"O fracasso do Estado e do Exército em proteger civis no sul [de Israel] provocou o colapso da 'concepção' que Netanyahu avidamente promovia: divida os palestinos para conquistá-los; seduza o Hamas com dinheiro; enfraqueça a Autoridade Palestina; e mantenha [a criação d]o Estado Palestino longe", escreveu Ksenia Svetlova, ex-parlamentar israelense, pesquisadora e especialista em Oriente Médio, em um artigo publicadono final de outubro na página do think-tank americano Atlantic Council. "Ironicamente, o homem que dizia que era possível promover a paz com países árabes sem os palestinos encerrará sua carreira por causa de mais uma guerra com os palestinos."
Professor de ciência política na Universidade Hebraica de Jerusalém, Reuven Hazan diz à AFP que se Israel estava se "autodestruindo" antes de 7 de outubro, agora já não há mais política por causa da guerra. "A política vai voltar em algum momento. E aí vão ter perguntas, e aí os protestos vão voltar", avalia. "Ele já sabe que está lutando por sua sobrevivência política."
Com a próxima eleição a ser realizada em não menos de três anos, só uma renúncia ou perda de maioria no Parlamento tirariam Netanyahu do cargo. Ele é apoiado por uma coalizão de partidos ultraortodoxos e de ultradireita.
Pelas pesquisas recentes, o favorito para substituí-lo é o centrista Benny Gantz, opositor que passou a integrar o gabinete de guerra.
ra (AFP, AP, Reuters, Lusa, DW, ots)