O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), anulou provas do acordo de delação da empresa Odebrecht na operação Lava Jato, homologado pela Justiça em 2017, e afirmou na decisão que a prisão presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi “um dos maiores erros judiciários da história do país”.
“Pela gravidade das situações estarrecedoras postas nestes autos, somadas a outras tantas decisões exaradas pelo STF e também tornadas públicas e notórias, já seria possível, simplesmente, concluir que a prisão do reclamante, Luiz Inácio Lula da Silva, até poder-se-ia chamar de um dos maiores erros judiciários da história do país. Mas, na verdade, foi muito pior”, disse o ministro do STF na decisão.
“Tratou-se de uma armação fruto de um projeto de poder de determinados agentes públicos em seu objetivo de conquista do Estado por meios aparentemente legais, mas com métodos e ações contra legem”, continuou Toffoli.
O ministro ainda disse, “sem medo de errar”, que a prisão do petista foi “ovo da serpente dos ataques à democracia e às instituições que já se prenunciava em ações e vozes desses agentes contra as instituições e ao próprio STF”.
“Ovo esse chocado por autoridades que fizeram desvio de função, agindo em conluio para atingir instituições, autoridades, empresas e alvos específicos”, pontuou o ministro da Suprema Corte.
Toffoli ainda disse que agentes desrespeitaram o devido processo legal, descumpriram decisões judiciais superiores, subverteram provas e agiram com parcialidade. “Valeram-se, como já disse em julgamento da Segunda Turma, de uma verdadeira tortura psicológica, um pau de arara do século XXI, para obter ‘provas’ contra inocentes”, destacou.
Na mesma decisão, Toffoli deu um ultimato à Polícia Federal, que, até agora, não cumpriu a determinação de compartilhar as mensagens hackeadas da Operação Spoofing. O órgão deve apresentar o conteúdo integral das mensagens apreendidas de todos anexos e apensos, sem qualquer espécie de cortes ou filtragem, em até 10 dias.
O ministro também deu um prazo final de dez dias para a Vara Federal de Curitiba e para o Ministério Público Federal do Paraná compartilharem com a defesa de Lula o conteúdo de todos os documentos relacionados ao Acordo de Leniência da Odebrecht.
Em agosto deste ano, o próprio Toffoli já tinha beneficiado o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral com os mesmos argumentos. Toffoli aproveitou o despacho desta quarta-feira (6) para fazer duras críticas à atuação da extinta força-tarefa da Lava Jato.
Críticas à Lava Jato
Toffoli destacou a "parcialidade" da 13ª Vara Federal de Curitiba, base da Operação Lava Jato e que foi comandada pelo ex-juiz e atual senador Sergio Moro, e disse que ela “extrapolou todos os limites".
O ministro ainda destacou que os "constantes ajustes e combinações" executado entre Moro e os procuradores da operação "representam verdadeiro conluio a inviabilizar o exercício do contraditório e da ampla defesa".
"Aqui não se está a dizer que no bojo da mencionada operação não tenha havido investigação de ilícitos verdadeiramente cometidos, apurados e sancionados, mas, ao fim e ao cabo, o que esta Reclamação [do presidente Lula] deixa evidente é que se utilizou de um cover-up de combate à corrupção, com o intuito de levar um líder político às grades, com parcialidade e, em conluio, forjando-se ‘provas'”, declarou.
“Centenas de acordos de leniências e de delações premiadas foram celebrados como meios ilegítimos de levar inocentes à prisão. Delações essas que caem por terra, dia após dia, aliás. Tal conluio e parcialidade demonstram, a não mais poder, que houve uma verdadeira conspiração com o objetivo de colocar um inocente como tendo cometido crimes jamais por ele praticados”, continuou o ministro.
O ministro determinou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) identifique "eventuais agentes públicos que atuaram e praticaram os atos relacionados" ao acordo de leniência e "adotem as medidas necessárias para apurar responsabilidades, não apenas na seara funcional, como também nas esferas administrativa, cível e criminal".
Lula passou 580 dias preso
A prisão de Lula foi decretada em abril de 2018, no âmbito do caso do triplex do Guarujá. À época, ainda valia a regra de prisão após condenação em segunda instância. Lula era pré-candidato à Presidência quando foi preso e aparecia como favorito nas pesquisas. Meses depois, com o petista fora da disputa eleitoral, o político de extrema-direita Jair Bolsonaro foi eleito presidente. E Sergio Moro, o juiz responsável pela condenação e prisão de Lula, deixou a magistratura para se tornar ministro de Bolsonaro.
Lula passou 580 dias preso. Em 2021, teve todas as suas condenações anuladas pelo STF, se cacifando novamente para concorrer à Presidência. Já Moro foi eleito senador em 2022, mas atualmente corre o risco de cassação.
Nos últimos anos, Toffoli e o ministro Ricardo Lewandowski (hoje aposentado) já haviam determinado a anualação de provas do acordo da Odebrecht em diversos procedimentos judiciais, incluindo investigações contra Lula, o ex-senador Edison Lobão (MDB-MA), o ex-deputado Lúcio Vieira Lima (MDB-BA), o ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral e o atual secretário de governo de São Paulo, Gilberto Kassab, entre outros.
Mas essas anulações vinham sendo determinadas caso a caso. Agora, a determinação vale para todas as ações que envolvam provas do acordo de leniência da Odebrecht.