O Supremo Tribunal de Israel revogou nesta segunda-feira (01/01) um elemento-chave da controversa reforma judicial do primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, que restringe os poderes do Judiciário de diversas formas e que levou às ruas centenas de milhares de pessoas contrárias ao projeto em protestos que só arrefeceram com o início do atual conflito no Oriente Médio, contra o grupo fundamentalista islâmico Hamas.
Oito dos 15 juízes votaram pela revogação da medida que suprime o direito do poder judicial de se pronunciar sobre a "razoabilidade" das decisões do governo ou do parlamento israelenses, segundo indicou o Ministério da Justiça, em comunicado. A decisão da Suprema Corte é uma resposta a oito recursos apresentados por entidades como o Movimento por um Governo de Qualidade em Israel.
De acordo com o Tribunal, a medida foi anulada devido "ao perigo severo e sem precedentes para a essência do Estado de Israel enquanto país democrático".
Críticas do governo
O governo israelense criticou a decisão da corte, tomada "em plena guerra [na Faixa de Gaza], o que vai contra a unidade necessárias nestes dias para o sucesso" dos militares na linha de frente de combate.
"Na verdade, os juízes [do Supremo Tribunal] tomaram nas suas mãos, com esta decisão, todos os poderes que, num regime democrático, são repartidos de forma equilibrada entre os três poderes [executivo, legislativo e judiciário]", escreveu o ministro da Justiça, Yariv Levin, no Telegram.
O tribunal votou ainda - mas desta vez com uma clara maioria, de 12 contra três - contra a alegação de que não teria legitimidade para reverter as Leis Básicas do país, consideradas como uma Constituição para Israel.
Golpe para Netanyahu
A lei derrubada pelo Tribunal havia sido aprovada em julho pelo Parlamento. Trata-se da primeira de uma reforma do sistema judicial israelense, que levaram a meses de protestos massivos contra o governo.
A decisão representa um golpe significativo para Netanyahu e os seus aliados, que argumentavam que os legisladores nacionais, não o Supremo Tribunal, deviam ter a última palavra sobre a legalidade da legislação e outras decisões fulcrais.
Os juízes decidiram que o Knesset, o parlamento israelita, não tem "poder onipresente".
Netanyahu e os seus aliados anunciaram o plano de ampla reforma pouco depois de assumirem o poder, há cerca de um ano. O primeiro-ministro e seus apoiadores alegam que as mudanças têm por objetivo fortalecer a democracia, limitando a autoridade de juízes não eleitos e entregando mais poder a pessoas eleitas.
A oposição e os críticos à reforma a veem como um assalto ao poder por Netanyahu, que é julgado por acusações de corrupção, e um ataque a um órgão de fiscalização fulcral.
Ameaça de reservistas
Antes do início da guerra contra o Hamas, centenas de milhares de israelenses saíram às ruas em protestos semanais contra o governo, entre os quais militares na reserva, como pilotos de caça que afirmaram que deixariam de se apresentar ao serviço se a reforma fosse aprovada.
Os reservistas, dos quais o exército israelense depende fortemente, responderam prontamente ao chamado após os ataques do Hamas em 7 de outubro de 2023, demonstrando unidade. No entanto, não está claro o que acontecerá se houver uma insistência na aprovação da reforma, o que poderia levar à retomada dos protestos e, nesse caso, colocar em xeque a unidade nacional e a prontidão militar, culminando na recusa dos soldados a se apresentar ao serviço, como já ameaçaram.
O primeiro-ministro israelense governa com base numa coligação majoritária no parlamento, o que na prática lhe dá o controle do poder executivo e legislativo. De acordo com críticos, com a medida, ele teria, também, o controle do Judiciário. E isso com o agravante de que Netanyahu responde no Judiciário por acusações de corrupção.
A coalizão de Netanyahu argumenta que a Suprema Corte atualmente exerce muita influência política, e que a reforma seria necessária para controlar alguns juízes considerados ativistas e estabelecer um equilíbrio real entre o governo e o Judiciário.
Os aliados de Netanyahu incluem partidos ultranacionalistas e religiosos, com uma lista de queixas contra o tribunal, e que têm apelado para mais construção de colonatos na Cisjordânia, anexação de territórios ocupados e limitação dos direitos da comunidade LGBTQ+ e dos palestinos.
le (EFE, Lusa, ots)