A agência de aviação russa Rosaviatsiya reconheceu nesta sexta-feira (27/12) que a queda de uma aeronave da Embraer no Cazaquistão que matou 38 pessoas ocorreu no momento em que a área era alvo de uma operação militar no contexto da guerra na Ucrânia – sem contudo atribuir explicitamente a culpa pelo acidente à Rússia.
Segundo o órgão, drones ucranianos atacaram duas cidades na região russa da Chechênia. Uma delas era Grozny, destino do voo J2-8243 da Azerbaijan Airlines (Azal) que decolou na quarta-feira de Baku, no Azerbaijão.
Em resposta ao suposto ataque, a Rosaviatsiya diz que decidiu aplicar um plano de contingência nas áreas que coincidem com a do trajeto do avião que transportava civis.
"A situação na zona do aeroporto de Grozny era extremamente complexa. Os drones ucranianos perpetravam naquele momento ataques terroristas contra as cidades de Grozny e Vladikavkaz", declarou o chefe da agência, Dmitri Yadrov, citado pela agência estatal russa Tass.
Por causa disso, explicou Yadrov, o aeroporto de Grozny ordenou a "saída imediata de todas as aeronaves da referida zona", suspendendo chegadas e partidas, mas sem dizer quando isso aconteceu.
O capitão do voo azerbaijani até teria tentado aterrissar duas vezes, sem sucesso. "Havia uma neblina muito densa, não havia visibilidade a uma altura de 500 metros", afirmou, acrescentando que os controladores aéreos teriam sugerido outras opções de aeroportos, mas que o comandante teria decidido seguir até Aktau, no Cazaquistão, do outro lado do Mar Cáspio.
Companhia aérea falou em "interferência física e técnica externa"
Na quinta-feira, fontes do governo do Azerbaijão ouvidas sob condição de anonimato relataram a agências de notícias a suspeita de que o avião pode ter sido atingido por estilhaços de um míssil antiaéreo russo quando estava no espaço aéreo da cidade de Grozny.
À Reuters, quatro fontes anônimas do governo azerbaijani disseram que resultados preliminares da investigação sugeriam que a aeronave teria sido atacada por engano por militares russos.
Nas últimas semanas, drones ucranianos atacaram vários locais na Chechênia, incluindo uma instalação que abriga as forças policiais.
Mais cedo nesta sexta-feira, a companhia aérea Azal disse que uma investigação do acidente concluiu que houve "interferência física e técnica externa". A empresa suspendeu voos para dez aeroportos russos, baseada nos "resultados preliminares da investigação sobre o acidente do Embraer 190".
Também nesta sexta, a companhia aérea flydubai anunciou a suspensão de voos aos aeroportos russos de Sochi e Mineralnie Vody, informou a Reuters.
Passageiros sobreviventes relatam explosão
À Reuters, um dos 29 passageiros que sobreviveram ao acidente relatou ter ouvido ao menos uma grande explosão quando o avião se aproximava do aeroporto de Grozny. Assustado, começou a rezar e se preparar para morrer.
"Pensei que o avião fosse se desintegrar", disse Subhonkul Rakhimov, que está internado no hospital. "Era como se [o avião] estivesse bêbado, já não fosse mais o mesmo."
História parecida foi relatada por um sobrevivente ao canal estatal russo RT. Ele disse que a aeronave fez três tentativas de aterrissar em Grozny e que na terceira aproximação "algo explodiu.... Eu não diria que foi dentro do avião" e que um pedaço de estilhaço voou entre suas pernas e perfurou um colete salva-vidas.
O acidente
O Embraer 190 saiu de Baku antes do amanhecer com 62 passageiros e cinco tripulantes. O curto voo para Grozny, a noroeste, aparentemente não teve problemas durante meia hora, quando a aeronave "encontrou uma interferência significativa no GPS", de acordo com o Flightradar24, um site que rastreia o tráfego aéreo em todo o mundo.
O Flightradar24 disse que, até cerca de 20 minutos antes do acidente, às vezes não recebeu nenhum dado do avião e, em outras ocasiões, recebeu dados nos quais os detalhes sobre sua posição estavam ausentes ou imprecisos.
"A aeronave foi exposta a interferência e falsificação de GPS perto de Grozny", apontou o Flightradar24. Embora seja improvável que essas medidas tenham causado o acidente, elas são sinais de que os esforços de defesa contra um ataque de drones estavam em andamento no solo.
Imagens que circulam nas redes sociais mostram o avião descendo em Aktau, no Cazaquistão, em posição de pouso e pegando fogo ao colidir contra o chão. Passageiros feridos podiam ser vistos emergindo de uma parte da fuselagem que ficou intacta.
No dia do acidente, a agência russa de aviação declarou em comunicado ter informações preliminares de que o piloto havia decidido fazer um pouso de emergência após um pássaro colidir contra a aeronave.
Outra versão ventilada foi a de que o acidente estaria relacionado à explosão de um balão de oxigênio, algo que foi confirmado pelas autoridades cazaques.
Mas nas fotos que circulam do acidente, é possível ver perfurações na fuselagem da aeronave, como se ela tivesse sido metralhada.
Peritos brasileiros eram esperados nesta sexta-feira para ajudar nas investigações sobre a queda do avião de fabricação brasileira.
As acusações em relação à queda do avião trouxeram também memórias do voo MH17 da Malaysia Airlines que foi abatido sobre o leste da Ucrânia em 2014, matando 298 pessoas. Uma investigação internacional apontou que um míssil antiaéreo lançado por forças russas causou a queda. Moscou refutou as acusações.
ra/bl (EFE, AFP, Reuters, DW)