Rabinovici: Em primeiro debate nos EUA, Biden perdeu, mas Trump não ganhou

Por Moises Rabinovici

Donald Trump e Joe Biden trocaram acusações
REUTERS/Brian Snyder

O presidente Joe Biden, 81, derrotou-se nos minutos iniciais do debate com o ex-presidente Donald Trump, 78: a voz hesitante, por vezes um murmúrio e trêmula; as frases articuladas com esforço, ou inacabadas, confusas e incoerentes; algumas gafes; e o rosto, o corpo e a expressão traindo a energia e a vitalidade que ele precisava demonstrar para conquistar mais quatro anos na Casa Branca.

Biden perdeu, bravamente, não só o debate, mas, talvez, a nominação do Partido Democrata, que entrou em pânico. Mas Trump não venceu: ágil, sorridente, ele mentiu, mentiu e mentiu, fugiu de algumas perguntas e foi cruel com o adversário que se autodestruía no palco, ao vivo, diante de uma audiência mundial.

No final, o 46º e o 45º presidentes dos Estados Unidos não se deram as mãos.

A primeira-dama Jill Biden elogiou a performance do marido: “Trabalho excelente. Você respondeu a todas as perguntas”. No salão de baile do hotel perto dos estúdios da CNN em Atlanta, o presidente foi recebido com o coro: “Mais quatro anos! Mais quatro anos!” Ele comentou: “Acho que nos saímos bem”. Atribuiu a rouquidão a um resfriado. E atacou Trump: “Não consigo pensar em uma única coisa que ele tenha dito que seja verdade”.

A vice-presidente Kamala Harris assistiu ao debate em Washington. Entrevistada pela CNN, ela admitiu que Biden, “sim, foi lento no início”. O colunista Tom Friedman, um dos preferidos de Biden, conta que chorou: “Joe Biden, um bom homem e um bom presidente, não tem nada que concorrer à reeleição (...) Ele deve se retirar da corrida."

Esse “início” provocou um choque entre democratas. Trocando mensagens pelo celular, eles se perguntavam quem irá ao presidente convencê-lo a desistir da reeleição. Um estrategista do partido previu ao jornal New York Times: “Biden está prestes a enfrentar um crescendo de apelos para que se afaste. Ele tinha um poço profundo de afeição entre os democratas. Ele está secando”. E prosseguiu: “Os partidos existem para vencer... O homem no palco com Trump não pode vencer. O medo de Trump tinha sufocado as críticas a Biden. Agora, esse mesmo medo vai alimentar os pedidos para que ele renuncie”.

O governador da Califórnia, Gavin Newsom, cotado como substituto de Joe Biden, declarou: “Eu nunca daria as costas ao presidente Biden e não conheço nenhum democrata do meu partido que faria isso, especialmente depois desta noite”.

As bravatas de Trump, no debate, foram as mesmas de sempre: “Durante meus quatro anos, tive os melhores números ambientais de todos os tempos.” (Ele retirou os EUA do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas). Trump também culpou Biden de orquestrar seus problemas com a Justiça (dois processos criminais contra ele foram movidos por promotores locais, sem controle do próprio Departamento de Justiça, e dois outros ficaram sob a supervisão de um advogado especial, para evitar a aparência de algum conflito de interesses).

Para Trump, criminoso é Hunter Biden, o filho do presidente, “condenado em um nível muito alto”. Aqui, ele mereceu uma resposta à altura: “(Trump) é a única pessoa neste palco que é um criminoso condenado, processado por molestar uma mulher e fazer sexo com uma estrela pornô na noite em que sua esposa estava grávida” (a esposa, Melania, não foi ao debate, em Atlanta). Mais: Trump tem “a moral de um gato de rua”. Cada um disse que o outro foi “o pior presidente” da história dos Estados Unidos.

Os checadores do que diziam os candidatos carimbaram como “falso” muitas das alegações de Trump (sobre aborto, imigração, economia) e algumas “fora de contexto”, as de Biden. Se houvesse uma categoria para “improvável” seriam incluídas as declarações de Trump sobre a invasão da Ucrânia e o massacre de 7 de outubro em Israel, que “não ocorreriam” se ele estivesse no poder. Ele se vangloria do poder que teria sobre Vladimir Putin. O apelido de Trump no Kremlin é “Gorbachev Americano”, o presidente russo que dissolveu a União Soviética cujo poderio Putin quer restaurar.

Os mediadores do debate, Jake Tapper (que Trump chamava, até recentemente, de Fake (falso) Tapper, e Dana Bash, tiveram que perguntar três vezes a Trump, até o final dos 90 minutos da luta política antecipada como a de Muhammad Ali e Joe Frazier, em 1971 (foi menos, muito menos), se ele respeitaria o resultado da nova eleição, se derrotado. A resposta foi “sim”, desde que não haja fraude. Biden comentou, quase nos finalmentes, que “passei metade da minha carreira sendo criticado por ser a pessoa mais jovem na política”, 30 anos quando se tornou senador, “e agora sou o mais velho”.

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