Quem é o candidato a presidente morto no Equador?

Fernando Villavicencio era segundo em intenção de voto, atrás de candidata ligada a seu desafeto, o ex-presidente Rafael Correa. Político de centro, ele prometia combater o narcotráfico.

Por Deutsche Welle

O candidato à presidência do Equador Fernando Villavicencio foi morto a tiros nesta quarta-feira (09/08), num atentado supostamente perpetrado por pistoleiros que deixou também nove feridos. O ataque mexeu com a consciência naciona,l em meio à crise de insegurança que assola o país.

Villavicencio foi baleado após um comício de sua campanha eleitoral realizado numa escola de Quito. Ele era candidato dos movimentos de centro Construye e Gente Buena, e poucos dias atrás denunciara ter recebido ameaças.

O presidente equatoriano, Guillermo Lasso, decretou nesta quinta-feira estado de exceção por 60 dias em todo o país e ratificou que as eleições gerais extraordinárias serão realizadas no próximo dia 20, conforme previsto, mas com destacamento de militares em todo o território nacional. O mandatário atribuiu o ataque a membros do crime organizado, afirmando que eles irão sentir "todo o peso da lei".

Jornalista e ex-deputado, Villavicencio, de 59 anos, era um dos oito presidenciáveis das eleições antecipadas. Foi sindicalista na juventude e assessorou o sindicado dos trabalhadores da petroleira estatal Petroecuador, da qual foi demitido por ser ligado à esquerda. Mais tarde atuou como jornalista, denunciando esquemas de corrupção. Foi eleito deputado em 2017 e permaneceu no Parlamento até março de 2023.

Villavicencio estava em segundo lugar em intenção de voto, com 13,2%, atrás da advogada Luisa González (26,6%), única mulher na disputa e ligada ao ex-presidente socialista Rafael Correa (2007-2017), segundo o último levantamento divulgado pela empresa Cedatos.

O político assassinado se formou como jornalista numa polêmica universidade extinta que foi denunciada por distribuir títulos por dinheiro. Entretanto construiu prestígio como jornalista investigativo a partir de suas apurações de suspeitas de corrupção contra integrantes do governo do ex-presidente Correa.

Anticorreísmo

Villavicencio encarnava o anticorreísmo, tendência abertamente crítica que culpa Correa por praticamente todos os males que o país sofre. Amigo da Embaixada dos Estados Unidos, Villavicencio obteve muitos dados e análises que serviram para embasar os julgamentos nos quais o ex-presidente e vários de seus colaboradores foram condenados por corrupção. Correa classifica a sentença como perseguição política.

Inimigo declarado de Correa, Villavicencio entrou na campanha para as eleições presidenciais marcadas para 20 de agosto com o fim de impedir que o correísmo volte ao poder.

Antes de concorrer à presidência, dirigiu a Comissão Fiscalizadora da Assembleia Nacional (Parlamento) entre maio de 2021 e maio de 2023, até que o atual presidente do país, o conservador Guillermo Lasso, invocou o recurso constitucional denominado "morte cruzada" para dissolver o Parlamento e convocar eleições extraordinárias.

Villavicencio, que em muitos casos criticava Lasso, também o defendia, e alguns de seus rivais o consideravam o candidato secreto do partido governista, algo que ele negava.

Natural do município andino de Alusí, na província de Chimborazo, no coração do Equador, Villavicencio também trabalhou em meios de informação como a antiga revista Vanguardia e foi assessor político do ex-legislador do movimento indígena Pachakutik Cléver Jiménez, entre 2009 e 2017. Na época, os dois foram condenados a 18 meses de prisão por supostos insultos contra Correa, mas Villavicencio evitou a prisão foragindo-se até conseguir a prescrição.

Meses depois, tendo se refugiado nos Estados Unidos, ele promoveu novas denúncias contra Correa por supostas irregularidades nos contratos de petróleo com a China. Seu nervo anticorreísta levou-o à Assembleia Nacional em 2021 e em junho anunciou a candidatura presidencial para substituir Lasso.

Máfias como alvo

Em entrevista em maio à agência de notícias EFE, Villavicencio, que no início se identificava como de esquerda moderada e atualmente se dizia de centro, garantiu que buscava ser presidente para "enfrentar e derrotar as máfias que cooptaram o Estado e pusera a sociedade de joelhos".

O candidato tinha como alvo "as máfias políticas que estão ligadas ao narcotráfico e às estruturas criminosas do garimpo ilegal, e também às estruturas corruptas do setor público”. Villavicencio afirmava que o Equador precisa de um "governo corajoso" e prometeu desmantelar as máfias "com a lei e com as armas".

"O Equador está caminhando muito rapidamente para a contaminação generalizada da economia. Temos uma economia criminosa financiada pelo narcotráfico, mineração ilegal e os recursos de superfaturamento e os subornos da corrupção no setor público", lamentou.

Seu assassinato deixa uma campanha eleitoral praticamente só girando em torno da crise de segurança que atravessa o Equador. O país fechou o de 2022 com a maior taxa de mortes violentas de sua história, 25,32 por 100 mil habitantes, a grande maioria associada, segundo o governo, ao crime organizado e ao narcotráfico, que ganhou força no litoral e transformou os portos em grandes trampolins para a cocaína chegar à Europa e à América do Norte.

Brasil manifesta "repúdio"

O governo brasileiro manifestou, nesta quinta-feira, seu repúdio ao "deplorável" assassinato de Villavicencio. "Ao manifestar a confiança de que os responsáveis por este ato deplorável serão identificados e levados à Justiça, o governo brasileiro apresenta suas sinceras condolências à família do candidato presidencial e ao governo e povo equatoriano", disse o Itamaraty em comunicado.

O ex-presidente Rafael Correa condenou o ataque. "O Equador se tornou um Estado falido. Minha solidariedade com sua família e com todas as famílias de vítimas de violência. Aqueles que pretendem semear ainda mais ódio com esta nova tragédia, espero que entendam que ela só continua a nos destruir."

Luisa Gonzalez, líder das pesquisas de intenção de voto, expressou suas condolências. "Isso nos deixa de luto, minha solidariedade a toda a sua família. Este ato vil não ficará impune!" Outro candidato, Daniel Noboa, disse que o assassinato foi "um atentado contra o país, a democracia e a paz de todos os equatorianos".

O governo dos Estados Unidos lamentou o assassinato: "É de cortar o coração para ele e para sua família, para seus apoiadores. Tenho certeza que todo o Equador está de luto neste momento", afirmou o porta-voz para Segurança Nacional da Casa Branca, John Kirby. "Obviamente esperamos que haja uma investigação transparente, total e completa, a respeito, e que os perpetradores sejam devidamente responsabilizados."

A Organização dos Estados Americanos (OEA) se disse preocupada com a segurança dos outros candidatos às eleições equatorianas: "Pedimos a todos os candidatos que reforcem suas medidas de segurança e apelamos às autoridades para providenciarem o apoio necessário a garantir a integridade dos participantes no processo eleitoral. A segurança dos candidatos é fundamental para manter a confiança no sistema democrático."

China, França, Espanha, Chile e a União Europeia também condenaram o crime, entre outros governos.

md (EFE, AFP, Reuters)

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