Quase toda a população de Nagorno-Karabakh deixou o enclave

Território disputado por armênios e azerbaijanos tinha 120 mil habitantes. A maioria já buscou refúgio na Armênia. Organizações humanitárias pedem ajuda à comunidade internacional para lidar com o êxodo.

Por Deutsche Welle

Quase 100 mil habitantes deixaram o enclave de Nagorno-Karabakh no Azerbaijão até esta sexta-feira (29/09), informou o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (Acnur), um dia após os líderes da etnia armênia declararem a dissolução do governo da região separatista no sul do Cáucaso.

O Acnur e a Federação das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho lançaram um apelo à comunidade internacional por ajuda financeira para dar melhores condições ao acolhimento aos refugiados.

A agência da ONU se disse pronta para ajudar até 120 mil refugiados, que seria o número de habitantes de Nagorno-Karabakh. Esse total, no entanto, não pode ser confirmado.

Os governos do Azerbaijão e da Rússia– esta última, considerada o poder que protege a Armênia – haviam declarado não ser necessário que a população deixasse o enclave. Mas, a população armênia-karabakh teme perseguições e violência por parte dos azaris.

A liderança separatista de Nagorno-Karabakh afirmou nesta quinta-feira que a autodeclarada República de Artsakh "deixaria de existir" em 1º de janeiro de 2024, depois de três décadas de conflitos e tensões. A declaração equivaleu na prática a uma capitulação formal ao Azerbaijão.

"Limpeza étnica"

O fato de os armênios serem cristãos ortodoxos e os azaris, muçulmanos, acrescenta uma dimensão religiosa às questões em torno do enclave. O primeiro-ministro da Armênia, Nikol Pashinyan, acusou o Azerbaijão nesta quinta-feira de realizar uma "limpeza étnica".

"A análise da situação demonstra que nos próximos dias não haverá mais armênios em Nagorno-Karabakh", observou. O comissário de direitos humanos do enclave, Gegham Stepanyan, disse que ao menos 200 morreram e 400 ficaram feridos nos ataques dos últimos dias, Mortes também foram reportadas pelas autoridades azerbaijanas.

Para o Azerbaijão e seu presidente, Ilham Aliyev, a reconquista do enclave é uma restauração triunfante da soberania sobre uma área reconhecida internacionalmente como parte de seu território, mas cuja maioria étnica armênia conquistou a independência de fato numa guerra na década de 1990. Para os armênios, trata-se de uma derrota e uma tragédia nacional.

O Azerbaijão vem negando a acusação de limpeza étnica, afirmando que não está forçando os habitantes a saírem e que vai reintegrar pacificamente a região de Nagorno-Karabakh, garantindo os direitos civis dos armênios étnicos.

Conflito de décadas

Os armênios da região dizem não confiar nessa promessa, lembrando-se de uma longa história de derramamento de sangue entre os dois lados, incluindo duas guerras desde a dissolução da União Soviética. Há dias eles têm fugido em massa pela estrada montanhosa que atravessa o Azerbaijão e liga Nagorno-Karabakh à Armênia.

A região vem sendo disputada há décadas entre as duas ex-repúblicas soviéticas. Nos anos 1990, Nagorno-Karabakh conseguiu se separar do território azerbaijano após uma guerra civil na qual recebeu ajuda da Armênia.

Em 2020, o Azerbaijão, que à época havia reforçado seu poderio através dos rendimentos advindos da exploração de petróleo e gás natural, conseguiu recapturar grande parte do enclave, até os dois lados aceitarem um cessar-fogo negociado pela Rússia. Nos últimos anos, porém, essa trégua se mostrou bastante vulnerável.

rc/av (DPA, Reuters, ots)

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