PM que admitiu prevaricar já comandou ação violenta contra professores

Ação contra servidores em 2015 deixou 220 pessoas feridas em Curitiba

Narley Resende

A professora Angela Alves Machado corre do Batalhão de Choque, em Curitiba. 29/04/2015 Daniel Castellano / arquivo / colaboração
A professora Angela Alves Machado corre do Batalhão de Choque, em Curitiba. 29/04/2015
Daniel Castellano / arquivo / colaboração

O comandante-geral da PM (Polícia Militar) do Paraná, Hudson Leôncio Teixeira, que admitiu estar prevaricando ao não liberar trechos de rodovias bloqueadas por bolsonaristas no estado, mesmo com ordem do STF (Supremo Tribunal Federal), foi responsável pelo comando da ação que deixou 220 pessoas feridas em 29 de abril de 2015, em Curitiba.

Na ocasião, professores protestavam contra mudança na previdência estadual durante o governo de Beto Richa (PSDB). A PM mobilizou mais de 2,5 mil policias contra professores que protestavam em frente à Assembleia Legislativa do Estado. 

Coronel Hudson, na época, comandava o Bope (Batalhão de Operações Especiais) e usou mais de 4 mil ítens de ação ostensiva em um bombardeio de munições de efeito moral que durou cerca de duas horas para dispersar aproximadamente 15 mil pessoas, a maioria professores. 

Ao todo, os 2.516 policiais designados para a ação dispunham de 2.323 balas de borracha e 1.413 bombas de fumaça, gás lacrimogêneo e de efeito moral, além de 25 garrafas de spray de pimenta, para conter os manifestantes que se aglomeravam em frente à Assembleia Legislativa.

Levantamento do Ministério Público do Paraná mostrou que a PM disparou 20 tiros por minuto e gastou R$ 1 milhão na ação. 

Até hoje ninguém foi responsabilizado. Beto Richa e os oficiais da PM chegaram a ser alvos de ação criminal, por meio da Procuradoria-Geral da República, devido a omissão e por não conter a ação dos policiais. Eles também foram citados em uma ação de improbidade administrativa. O Ministério Públic, no entanto, disse que “a conduta dos policiais foi exitosa para conter os ânimos da massa intransigente”. 

“A gente está prevaricando”

Durante negociação para liberar uma rodovia na Região dos Campos Gerais do Paraná na terça-feira (1º), o coronel e comandante da Polícia Militar Hudson Leôncio Teixeira admitiu "prevaricar", descumprindo determinação judicial, ao permitir que manifestantes continuassem impedindo a livre circulação de veículos.

Prevaricação é um crime praticado por funcionário público contra a administração em geral, que consiste “em retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”. A pena prevista é de detenção, de três meses a um ano, e multa, de acordo com o Código Penal.

A declaração foi feita em um dos bloqueios da PR-151, em Ponta Grossa (PR). Ao argumentar com os manifestantes, o coronel admite ainda que “já deveria ter feito isso ontem”, se referindo à liberação da rodovia. A declaração foi gravada. 

“A ordem que nós temos é para desobstruir totalmente a via. E a gente já está tentando fazer o desbloqueio parcial, demonstrando boa vontade de vocês, boa fé nossa também, para garantir às pessoas direito de ir e vir. E corre o risco de a Polícia Militar estar prevaricando aqui. Mas nós estamos cumprindo uma ordem judicial. Essa pista aqui pode ficar, nem poderia ficar essa pista, mas para não acirrar os ânimos, a gente vai permanecer com o pessoal do lado direito e aqui por esse lado os veículos que quiserem transitar, transitam normalmente. Na verdade, a gente está prevaricando, já deveria ter feito”, diz Hudson Leôncio Teixeira, comandante da PM do Paraná aos manifestantes. 

O vídeo, que mostra fala do coronel, é do jornalista da região conhecido como Repórter Sassá de Ponta Grossa. Em relato à Band, Sassá disse que a “sociedade civil” parou o tráfego na rodovia e “não os caminhoneiros”. "Ele (coronel) liberou somente a faixa da esquerda, podendo a faixa da direita ficar bloqueada. Na noite de quarta já não tinha movimentação na rodovia", disse.

Ordem do STF

Desde o início da semana, policiais militares, assim como rodoviários federais, devem cumprir determinação do STF (Supremo Tribunal Federal) que estabeleceu às forças de segurança a responsabilidade pela liberação das rodovias nos estados. Além disso, a PM foi autorizada pelo o ministro Alexandre de Moraes, do STF, a identificar, multar e prender responsáveis pelos bloqueios ilegais.

O deputado estadual do Paraná Requião Filho (PT) protocolou na noite de quarta-feira Reclamação junto ao STF. O documento pede que sejam intimados o governador do Estado o Paraná, Ratinho Júnior, o secretário de Segurança Pública, Wagner Mesquita de Oliveira, e o comandante-chefe da Polícia Militar, Hudson Leôncio Teixeira, para que, “imediatamente, cumpram a decisão proferida pela Corte na ADPF 519, sob pena de multa, crime de responsabilidade e tipificação do delito de desobediência”.

As manifestações questionam o resultado das eleições do último domingo (30) e em alguns casos pedem intervenção militar para que impeça a posse de Luiz Inácio Lula da Silva, em janeiro, o que é inconstitucional.

Sem resposta

Questionada pela reportagem, a Secretaria de Estado da Segurança Pública não comentou a fala do coronel Hudson. Em nota, diz que que a “liberação das estradas tem sido feita com negociação e uso progressivo e escalonado da força quando necessário”.

A assessoria informou que foram aplicadas 15 multas de trânsito no local do bloqueio. 

"A Secretaria da Segurança Pública do Estado do Paraná ressalta que as forças de segurança estaduais estão cumprindo integralmente a decisão do Supremo Tribunal Federal, em apoio à Polícia Rodoviária Federal. O trabalho de desobstrução das estradas estaduais e federais começou na segunda-feira e mais de 200 desbloqueios já foram realizados.

A Polícia Militar do Paraná tem agido de acordo com a técnica policial consolidada para resolver este tipo de crise. A liberação das estradas tem sido feita com negociação e uso progressivo e escalonado da força quando necessário.

O objetivo é cumprir integralmente a determinação judicial. No momento, não há pontos de bloqueio total e apenas sete pontos de bloqueio parcial nas rodovias estaduais", diz a nota na íntegra

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