Pistas para a surdez de Beethoven numa mecha de cabelo

Um dos mistérios da medicina histórica é por que o compositor alemão acabou totalmente surdo. Um suvenir comum na época revela níveis alarmantes de metais pesados. Os suspeitos: excesso de vinho e peixes do Danúbio.

Por Deutsche Welle

Por volta dos 20 anos de idade, Ludwig van Beethoven (1770-1827) começou a enfrentar uma adversidade que marcaria profundamente sua vida e obra: a perda progressiva da audição. Para um músico atuante, essa deterioração tornou-se fonte de profunda angústia e vergonha.

Aos 40 anos, o compositor estava quase completamente surdo, e era atormentado por outras afecções, como problemas gastrointestinais e episódios de icterícia, indicadores de uma enfermidade hepática. Isso não o impediu de continuar compondo até morrer, aos 56 anos, obras revolucionárias, veneradas pela posteridade.

Apesar de essas batalhas de saúde serem amplamente conhecidas, as causas subjacentes têm permanecido muito no campo das especulações. Mas é possível que uma nova pesquisa científica venha lançar nova luz sobre esse mistério histórico.

Cabelo do gênio e metais pesados

A chave é o cabelo do gênio: com base no exame químico de duas mechas, a equipe liderada pelo patologista Nader Rifai, da Faculdade de Medicina de Harvard, concluiu que Beethoven sofria de envenenamento por metais pesados.

As mechas autenticadas, conhecidas como "de Bermann" e "de Halm-Thayer" contêm concentrações alarmantes de chumbo, arsênico e mercúrio. Numa delas detectaram-se 380 microgramas de chumbo por grama de cabelo; na outra, 258 microgramas. A quantidade considerada normal hoje em dia é de 4 microgramas para cada grama de cabelo.

"São as taxas mais altas que já vi em cabelo", comentou o coautor Paul Jannetto, da Clínica Mayo, ao jornal The New York Times. "Recebemos mostras de todo o mundo, e essas taxas estão uma ordem de magnitude acima." Esse fato poderia explicar tanto a surdez progressiva quanto os demais sintomas.

Por que tanto chumbo em Beethoven?

O estudo publicado pela revista Clinical Chemistry propõe várias teorias para explicar a alta carga tóxica no cabelo examinado. Uma delas seria o amor do músico alemão pela bebida: em seu tempo se acrescentava acetato de chumbo ao vinho barato, para melhorar o sabor e a transparência.

Outras fontes possíveis seriam as garrafas de vidro de chumbo, comuns na época, e o consumo frequente de peixes do rio Danúbio (Beethoven passou várias décadas em Viena), contendo arsênico e mercúrio.

Além disso, era comum usarem-se unguentos e outros medicamentos à base do metal tóxico para tratar diversas doenças: segundo The Smithsonian Magazine, o músico alemão chegou a tomar 75 medicamentos ao mesmo tempo.

Quebra-cabeça complexo

Os pesquisadores concluem que a presença do metal pesado "pode ter contribuído para as enfermidades documentadas, que o afligiram a maior parte da vida", mas não determinaram os efeitos específicos dos níveis elevados de arsênico e mercúrio para a saúde do músico.

Quanto à causa da morte de Beethoven, porém, eles descartam o envenenamento por chumbo: a teoria predominante continua sendo que ele sucumbiu a complicações derivadas da hepatite B, agravadas pelo consumo de álcool e predisposições genéticas.

Em março de 2024, também com base no exame de cabelos de Beethoven, o Instituto Max Planck de Estética Empírica (MPIEA) publicou um estudo explorando a relação – ou ausência dela – entre a genética do músico natural de Bonn e seu talento musical.

A prática de conservar mechas de cabelo de entes queridos e figuras famosas era comum em séculos passados. Hoje, esses suvenires oferecem pistas valiosas sobre destinos pessoais e aspectos sociais históricos

A equipe de Rifai resume seus achados sobre a saúde de Ludwig van Beethoven: "cremos que esta é uma peça importante de um complexo quebra-cabeça, e permitirá a historiadores, médicos e cientistas compreenderem melhor a história médica do grande compositor."

av/le (DW, ots)

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