Os pais de Filippo, de três meses, acionaram a Justiça após o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) negar a concessão do salário-maternidade a um deles. O benefício, previsto para que pessoas se afastem do trabalho pelo nascimento do filho, ainda não abarca casais compostos por pessoas do mesmo sexo.
André Tonnani e Hélio Heluane, ambos empresários, contam para a Band que entraram com um pedido para receber o benefício sabendo que teriam a requisição negada pelo órgão. “A gente não estava dentro dos parâmetros e fizemos o processo para dar visibilidade para esse assunto, já que existem muitos casais de homens tendo filhos e não conseguem. Nós conseguimos nos virar, mas há outros papais que não conseguem”, comenta Hélio.
Hélio, que é empresário, decidiu se afastar das atividades para poder cuidar de Filippo e fez o pedido, negado pela Previdência. Segundo o INSS, o auxílio contempla apenas mulheres que tiveram o filho, pessoas adotantes ou que sofreram ‘aborto não criminoso’.
“A partir do momento que temos um filho, precisamos do amparo do governo por sermos contribuintes. Independente se a criança veio ao mundo por parto, fertilização ou adoção, essa pessoa que teve o filho precisa ficar em casa por meses para poder dar o amparo ao filho”, pontua André.
Para o advogado previdenciário Richart Regner, o auxílio-maternidade é algo restrito a muitos brasileiros. “Ele dificilmente concede este benefício para quem não se enquadra na lei. A própria existência pretende promover esta integração do bebê aos genitores, mas nem sempre isso é possível”, analisa.
Em nota, o INSS afirma que a Previdência “segue o que está previsto na legislação atual e não há, até o momento, previsão legal para concessão de salário-maternidade a pessoa do sexo masculino para parto ocorrido através de barriga solidária.”. Por isso, Hélio e André não foram amparados.
Mesmo se afastando nos primeiros três meses, Hélio não conseguiu dar atenção total para o filho e precisou trabalhar. “É impossível fazer os dois ao mesmo tempo. Como não tinha como não trabalhar, eu acabei aprovando as contas, olhando algumas coisas. É complexo, o bebê demanda muita atenção nesses primeiros meses”, explica.
Richart indica que o INSS deveria analisar os casos específicos e que os termos deveriam ser atualizados. “Na maioria dos casos o judiciário entra no caso para complementar a situação, por isso há quem pede auxílio jurídico para poder entrar na Justiça por fatores defasados do INSS”, pontua.
Hélio e André pretendem reunir amigos e outros casais homoafetivos para entrar com uma ação coletiva contra o INSS. A ideia do casal é tentar forçar uma mudança na legislação. Para Richart, a ideia é uma boa oportunidade para facilitar futuros processos. “Cada decisão pode ser utilizada como substrato em outros processos, casos e análises, até que se tenha alguma decisão definitiva ou lei que regule nesse sentido”, afirma.
Casal alega que ouviu comentários discriminatórios de servidores do INSS
André e Hélio citam que durante o processo para pedir o benefício, o casal ouviu comentários discriminatórios. Segundo Hélio, o servidor responsável afirmava que não conseguia encaixá-los no sistema. “Perguntavam quem era a mãe, como a criança foi adotada, a gente falava que era barriga solidária, ficávamos explicando muitas vezes a mesma coisa e já era hora de entenderem, sabe?”, comenta André.
Sobre a discriminação, o INSS pontua que “com relação à qualidade do atendimento, o segurado pode sempre utilizar os canais da ouvidoria - telefone 135 ou site https://falabr.cgu.gov.br/ para registrar reclamação, queixa ou elogio”.
“Abrir uma porta para que outras pessoas não tenham que lutar por isso”
O casal tem uma página com quase 150 mil seguidores e pretende expor a situação para que futuros pais tenham o direito assegurado. “Temos condição de assumir essa luta para que outras pessoas no futuro não passem por essa situação, porque se hoje a gente consegue ter filhos, se hoje o casamento homoafetivo é legalizado, é porque pessoas no passado levantaram essa bandeira”, afirma André.
Os dois compartilham informações sobre barriga solidária, como é a criação do filho e que tipos de situações o casal passa em meio à comentários homofóbicos e discriminatórios.
Apesar do apoio dos seguidores, que eles chamam de “tios do Filippo”, os dois revelam que receberam mensagens discriminatórias e homofóbicas nas redes sociais. “A gente recebeu diversas mensagens ruins, então tentamos não pegar essa negatividade negativa e tentamos ensinar as pessoas sobre a nossa luta”, conta Hélio.