Um sistema global de monitoramento de metano alertou governos e empresas sobre mais de 1.200 grandes vazamentos do potente gás de efeito estufa nos últimos dois anos, mas só recebeu respostas detalhando a causa das emissões e as medidas tomadas em 1% dos casos, segundo um novo relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) da ONU divulgado nesta sexta-feira (15/11).
"Isso é decepcionante", disse a diretora executiva do Pnuma, Inger Andersen na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP29), realizada até 22 de novembro em Baku, no Azerbaijão.
Ela disse que os vazamentos, que permitem a fuga do gás de efeito estufa extremamente nocivo, muitas vezes podem ser interrompidos com simples reparos. "Estamos literalmente falando de apertar os parafusos com mais força em alguns casos", disse ela em um comunicado.
Intitulado An Eye on Methane (De olho no metano, em tradução literal), o relatório – divulgado anualmente com base no Sistema de Alerta e Resposta ao Metano (Mars), parte do Observatório Internacional de Emissões de Metano (Imeo) do Pnuma –, ressalta que os alertas de vazamentos representam uma oportunidade inexplorada de ação climática imediata.
O Mars, que detecta liberações do gás responsável por cerca de um terço do aquecimento planetário, usa dados de satélite para ajudar o setor e os países a identificar e lidar com grandes emissões de metano.
O Mars também está usando inteligência artificial (IA) para examinar dados de satélite e identificar as emissões. As atividades humanas causam cerca de 60% do metano liberado na atmosfera. Ele pode vir da agricultura, incluindo flatulência de vacas e fertilizantes de esterco, de lixo em decomposição em aterros sanitários e do setor de energia fóssil, quando as empresas de petróleo e gás produzem, transportam e armazenam combustíveis.
O metano retém cerca de 84 vezes mais calor do que o CO2 em uma escala de tempo de 20 anos, mas também desaparece comparativamente mais rápido. Embora o gás de efeito estufa cause muitos danos em seu curto período de vida, sua eliminação é muito mais rápida do que a do CO2, principalmente se as empresas de petróleo e gás sanarem os vazamentos e pararem com práticas que liberam o gás na atmosfera.
No relatório An Eye on Methane, Dechen Tsering, diretor interino da Divisão de Mudanças Climáticas do Pnuma, descreve a redução das emissões de metano como um "freio de emergência" para desacelerar o aquecimento global.
"A ciência é clara: cortar o metano é a maneira mais rápida e econômica de mitigar o aquecimento a curto prazo e evitar o agravamento dos danos climáticos", continuou Tsering.
Subnotificação e falta de ação
Cerca de 160 países se comprometeram a reduzir as emissões desse gás em 30% até 2030 de acordo com o Compromisso Global de Emissões de Metano lançado em 2021 na COP26 em Glasgow, Escócia. Na COP28 em Dubai, as empresas de petróleo e gás que representam quase metade da produção global prometeram reduzir as emissões de metano a quase zero até o final da década.
Mas um estudo recente constatou que as emissões estão aumentando em ritmo acelerado e que as concentrações atmosféricas de metano são as mais altas em 800 mil anos. O Pnuma também apontou uma discrepância entre os relatórios de emissões de metano do setor e os níveis reais detectados na atmosfera.
A agência da ONU pediu que mais empresas de petróleo e gás se inscrevam em sua Parceria de Metano de Petróleo e Gás 2.0 (OGMP), que atualmente tem cerca de 140 membros e está se esforçando para fornecer medições mais precisas usando Mars e IA.
Dados mais precisos ajudarão a "impulsionar a responsabilidade", mas devem ser apoiados por ações, escreveu Tsering no relatório. O fato de o Pnuma ter recebido tão poucas respostas aos principais alertas de vazamentos de metano "ressalta que os dados por si só não são suficientes".
"Com a janela para lidar com as mudanças climáticas se fechando rapidamente, é preciso agir para reduzir as emissões", acrescentou Tsering.
Lacunas nas promessas do setor
O think tank Carbon Tracker, com sede em Londres, acusou as empresas de petróleo e gás de "exacerbarem a crise climática" no que diz respeito ao metano. Em um relatório publicado na quinta-feira, a instituição identificou "grandes lacunas" nas promessas de alcançar emissões de metano "quase nulas".
Uma das lacunas é que nenhuma das 30 empresas analisadas estabeleceu metas que "abrangem todas as emissões de metano relacionadas às suas atividades comerciais".
Muitas das empresas operam gasodutos e navios-tanque de GNL, que podem emitir metano, mas não os incluíram nos compromissos. O mesmo se aplica às joint ventures que as empresas não operam diretamente. Essas empresas geralmente estão localizadas em países com padrões legislativos menos rígidos em relação ao metano e médias altas de vazamentos desse gás. O Carbon Tracker chamou isso de "ponto cego" para muitas empresas de petróleo e gás, porque esses empreendimentos podem ser responsáveis por uma grande parte das emissões corporativas.
O relatório também afirma que cerca de 25 a 30 produtores de petróleo e gás se comprometeram a acabar com a queima "rotineira" até 2030. A prática consiste em liberar a pequena quantidade de gás que sai do solo durante a extração de petróleo – já que é caro demais processá-lo.
Mas a Carbon Tracker diz que isso representa apenas uma pequena parte da queima total das empresas, a qual também é feita para reduzir aumentos perigosos de pressão. De acordo com o relatório, poucas empresas afirmaram que eliminarão toda a queima não emergencial.
"As empresas de petróleo e gás estão falando da boca para fora sobre a ação climática, enquanto as emissões de seus produtos estão alimentando tempestades, secas, inundações e ondas de calor cada vez mais graves em todo o mundo", acusa Olivia Bisel, principal autora e analista associada de petróleo e gás da Carbon Tracker, em comunicado.
EUA anunciam nova multa para poluidores
As empresas de petróleo e gás dos EUA terão que pagar uma multa federal se emitirem metano acima de certos níveis, de acordo com uma nova regra do governo de Joe Biden anunciada nesta terça-feira na conferência climática da ONU em Baku, Azerbaijão.
A multa aumenta "gradualmente para 1.500 dólares por tonelada métrica em 2026". O objetivo é incentivar a indústria a reduzir as emissões do setor de petróleo e gás – a maior fonte de metano do país.
Os EUA também lançaram um portal especial que usa dados de satélite para detectar vazamentos e alertar as empresas sobre eles. As empresas são obrigadas a investigar e responder a vazamentos, de acordo com as regras para metano de petróleo e gás da Agência de Proteção Ambiental (EPA), segundo um comunicado.
As novas regras de metano foram anunciadas um dia depois que o presidente eleito Donald Trump escolheu o ex-congressista de Nova York Lee Zeldin para o cargo mais alto da EPA. Espera-se que Zeldin derrube ou atenue dezenas de regulamentações ambientais. Ele disse que quer "restaurar o domínio energético dos EUA".
Autor: Jennifer Collins