O que se sabe sobre a operação que prendeu militares por planejar matar Lula, Alckmin e Moraes

Investigação apontou envolvimento de autoridades em tentativa de golpe de estado

Da Redação

O que se sabe sobre a operação que prendeu militares por planejar matar Lula, Alckmin e Moraes
PF diz que Lula foi alvo de tentativa de assassinato
Ricardo Stuckert/PR

A Polícia Federal (PF) deflagrou nesta terça-feira (19) a Operação Contragolpe, que prendeu um policial e cinco militares do grupo conhecido como “kids pretos”, que teriam atuado no planejamento de um golpe de Estado para impedir a posse do presidente Lula após as eleições de 2022. Também estavam envolvidos no plano do grupo executar Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro do SFT (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes.

Moraes, relator do caso no tribunal, autorizou a PF a prender o  general da reserva  Mario Fernandes, o tenente-coronel Helio Ferreira Lima, o major Rodrigo Bezerra Azevedo e o major Rafael Martins de Oliveira, além do policial federal Wladimir Matos Soares.

A investigação avançou, pois a PF conseguiu recuperar mensagens apagadas nos aparelhos de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro.

A PF aponta que o esquema consistia em monitorar, prender e matar Moraes, para em seguida matar Lula e Alckmin no intuito de impedir a posse do governo eleito. 

Cronologia

A polícia identificou ainda uma cronologia para os atos criminosos, que teria começado com a análise realizada pelo próprio ex-presidente Bolsonaro do documento que ficou conhecido como “minuta do golpe”.

De acordo com as apurações, Bolsonaro teria redigido e ajustado a minuta,e tornou  o documento golpista. A carta previa prisões de autoridades e outras medidas autoritárias. A PF chegou a essa conclusão por meio de mensagens que foram trocadas entre Cid e o então comandante do exército, o general Freire Gomes.

O despacho também relata uma reunião entre Jair Bolsonaro e o comandante do Comando de Operações Terrestres (COTER), o general Estavam Cals Theofilo, que teria a finalidade de consumar o golpe.

O grupo começou a monitorar o deslocamento das autoridades que eram alvo do plano em novembro de 2022, após uma reunião na casa do general Walter Braga Netto, que foi candidato a vice de Bolsonaro. O grupo planejava realizar os assassinatos a tiros ou por envenenamento.

O grupo, inclusive, se referia a Lula e Alckmin com os codinomes “Jeca” e "Joca", e considerou também usar químicos para causar a morte de Lula.

Em trocas de mensagens, os militares demonstraram estarem no meio de uma possível emboscada a Alexandre de Moraes. "Tô na posição", diz um deles. Em determinado momento, outro deles manda “abortar” a ação.

Todo o planejamento deste assassinatos foi detalhado em um documento chamado “Punhal Verde e Amarelo”, que foi imprimido dentro do Palácio do Planalto por Mário Fernandes, que era secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência de Jair Bolsonaro. 

Planos após o golpe

A investigação da PF constatou que o grupo golpista planejava montar um “gabinete de crise” caso o plano de golpe fosse consumado. A ação seria uma reposta às mortes de Lula, Alckmin e Moraes.

O gabinete seria comandado pelo general Augusto Heleno, então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e o general Braga Netto.

Quais são as possíveis consequências?

Guilherme Amorim, doutor em Direito, professor da FADISP e advogado no escritório Rubens Naves, Santos Jr. Advogados, explica que o Código Penal prevê punição a crimes contra as instituições democráticas, mais especificamente o artigo 359-l. 

“Os seus autores ficam sujeitos à pena de reclusão de 4 a 8 anos de prisão”, esclarece. 

Clara Masiero, advogada e sócia da área de penal do escritório Lacaz Martins, Pereira Neto, Gurevich & Schoueri, diz ainda que, se comprovadas as informações, os autores podem ser enquadrados em outros crimes.

“Existe a tentativa de homicídio e poderia haver organização criminosa, que é a associação de quatro ou mais pessoas ordenadas e com divisão de tarefas, com objetivo de praticar infrações penais. Eles se organizaram para atentar contra a vida com o fim de impedir a posse. Temos em tese esses três crimes possíveis: tentativa de início, golpe de estado e organização criminosa”, detalha a especialista.

Clara destaca ainda que a própria tentativa de golpe já é um crime segundo código penal, ou seja, basta a execução, e já existe uma infração.

Mas, tanto neste caso quanto na tentativa de homicídio, é preciso provas de que o ato foi iniciado.

“O crime de homicídio tentado e o crime de golpe de estado só passam a existir no momento em que os agentes dão início a execução do plano. O mero planejamento de matar alguém, de um golpe, não é imputável em si [seria necessário dar início ao crime, com ações concretas]. A prova dos fatos vai nos indicar até onde esses agentes foram. Se eles saíram do planejamento e partiram para a execução do plano traçado", frisa.

Sobre a tentativa de homicídio, ela ainda complementa: “No caso da tentativa de homicídio, é importante [para o enquadramento da lei] que a pessoa não tenha conseguido matar por circunstância alheia à vontade dele”.

Ao mesmo tempo, ela diz que o crime de organização criminosa já consumaria com a reunião das pessoas envolvidas.

E o que diz a Constituição?

Clara Masiero diz que a Constituição Federal, por meio do artigo 5º, inciso 44, determina que é crime inafiançável e imprescritível qualquer ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.

“A pessoa não pode pagar uma fiança e o crime não prescreve, eles podem ser processados a qualquer tempo”, ressalta.

Ao mesmo tempo, Guilherme Amorim não acredita que seja necessário mudar a lei ou até mesmo a Constituição para lidar com atos golpistas tendo em vista as investigações.

“Os fatos não devem levar a uma revisão da legislação em vigor nem tampouco do texto constitucional. O que precisa é haver sua aplicação integral”, arremata o especialista. 

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