O que está por trás da alta do preço das passagens aéreas

As companhias de aviação obtém grandes lucros com o boom global de viagens que mantém as tarifas nas alturas. Alguns se perguntam se os preços cairão. Outros acreditam que eles têm que subir ainda mais.

Por Deutsche Welle

A vida ficou mais cara desde a pandemia de covid-19, mas poucas coisas aumentaram tanto quanto o preço das passagens de avião.

Qualquer pessoa que tenha comprado um voo em 2023 já sabe disso, mas a UE confirmou no mês passado que as tarifas aéreas médias em toda a Europa estiveram entre 20% e 30% mais altas no verão de 2023 em comparação com 2019.

É um problema global que vem crescendo desde o início de 2022. Em fevereiro de 2023, dados da empresa de análise de aviação Cirium revelaram que os preços médios dos bilhetes para centenas das rotas mais populares do mundo aumentaram 27,4% desde o início de 2022, quando os preços estavam baixos devido à pandemia. As companhias aéreas mais atingidas procuraram atrair os viajantes de volta aos céus.

Embora a inflação tenha disparado em muitos países desde então, o aumento das tarifas aéreas, quando comparado com o período pré-pandemia, excede confortavelmente as taxas nacionais de inflação durante esse período.

Dias atrás, a comissária europeia para os transportes, Adina Valean, disse ao jornal britânico Financial Times que Bruxelas está analisando a questão, para descobrir "o que está acontecendo exatamente no mercado e porquê".

Muitas razões foram apresentadas pelas companhias aéreas, desde o aumento da procura de viagens até a interrupção das cadeias de abastecimento, que incluem tudo, desde as próprias aeronaves até as poltronas de que são equipadas.

?No entanto, muitos dizem que os preços elevados dos voos vieram para ficar e que isso, por si só, não é necessariamente uma coisa má, dada a expressiva pegada de carbono da indústria de aviação.

Os velhos vilões: oferta e demanda

Existem duas razões principais por detrás do dramático aumento do preço dos voos: aumento da procura e interrupção da oferta.

Durante dois anos, a pandemia de covid-19 causou estragos na indústria. Com aviões aterrados em todo o mundo, as perdas combinadas do setor em 2020 e 2021 foram de pelo menos 200 bilhões de dólares (R$ 987 bilhões), de acordo com a Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA), um organismo comercial.

Tal como a pandemia interrompeu drasticamente os voos, o regresso à normalidade impulsionou um notável boom de viagens. Ao longo de 2023, praticamente todas as principais companhias aéreas do mundo registaram lucros recordes à medida que se apressavam para acompanhar a enorme procura.

A Ryanair, a maior companhia aérea da Europa em número de passageiros, disse esta semana que espera obter um lucro recorde de até 2 bilhões de euros (R$ 10,5 bilhões) no atual ano financeiro. Lufthansa, Singapore Airlines, IAG, Air-France-KLM, Emirates e American Airlines estão entre as que publicaram excelentes resultados neste ano.

A IATA disse em junho que espera que as receitas totais da indústria aérea ultrapassem os 800 bilhões de dólares (R$ 3,9 trilhões) pela primeira vez desde 2019.

As companhias aéreas dizem que, embora a alta demanda as ajude a obter lucros recorde, sua própria falta de capacidade as forçou a aumentar os preços. Os problemas na cadeia de abastecimento do setor levaram a atrasos na Airbus e na Boeing, que lutam para atender às encomendas das companhias aéreas de novos aviões e peças.

O CEO da Ryanair, Michael O'Leary, disse dias atrás que os atrasos nos dois principais fabricantes de aeronaves são uma das principais causas dos preços mais elevados. Ele disse aos investidores em teleconferência que espera que algumas companhias aéreas sejam forçadas a reduzir a capacidade em 2024 devido a problemas de abastecimento. Ele espera que, como consequência, os preços continuem subindo.

Além dos problemas na cadeia de abastecimento, as companhias aéreas estão enfrentando a alta dos seus próprios custos face a problemas de pessoal nos aeroportos, que também aumentaram desde a pandemia, levando os operadores aeroportuários a reduzir a capacidade dos terminais.

No entanto, de acordo com Karolina Wojtal, da Rede de Centros Europeus do Consumidor (ECC, na sigla em inglês), as próprias companhias aéreas estão permitindo que os preços subam mais do que a taxa de inflação.

"As companhias aéreas também estão aumentando automaticamente os preços com seus sistemas de reservas porque as pessoas realmente querem viajar novamente após o coronavírus", disse ela à DW.

A questão da manipulação de preços também foi levantada em relação às companhias aéreas. Alguns críticos as têm acusado de tentarem compensar as grandes perdas que sofreram durante a pandemia cobrando agora preços abusivos. As companhias aéreas negam, dizendo que os preços são um reflexo preciso do estado atual da indústria.

Queda de preço está fora do radar

Com a expectativa de que os problemas da cadeia de abastecimento persistam por algum tempo e o boom das viagens dando poucos sinais de se arrefecer, os preços não vão cair tão cedo.

Outra questão que poderá impulsionar ainda mais os preços nos próximos anos é a dos potenciais custos para as companhias aéreas, à medida que recorrem a combustíveis de aviação sustentáveis e caros. A indústria da aviação tem uma expressiva pegada de carbono e está sob pressão para reduzir suas emissões de gases de efeito estufa o mais rapidamente possível.

?Willie Walsh, diretor-geral da IATA, disse no início deste ano que esperava que as tarifas continuassem a aumentar nos próximos 15 anos devido aos custos mais elevados de combustíveis mais sustentáveis. "Isso levará a tarifas mais altas porque o combustível de aviação sustentável é mais caro do que o querosene de aviação tradicional. E à medida que fazemos a transição para o carbono zero, isso vai custar algum dinheiro", disse ele.

Tarifas aéreas deveriam ser regulamentadas?

Grupos ambientalistas argumentam que custos mais elevados das viagens aéreas poderiam ajudar a reduzir o tráfego aéreo e ajudariam a financiar a transição verde e a reduzir as emissões a curto prazo.

Jon Worth, analista de transporte ferroviário radicado na Alemanha, diz que o grande crescimento da demanda por viagens de 2023 também ocorreu em meio a um enorme aumento no número de pessoas que optam por métodos de transporte menos poluentes, como o ferroviário, mas diz que algo precisa ser feito com os preços para desencorajar viagens excessivas de avião.

"Temos que perguntar que tipo de estrutura de preços faria sentido no que diz respeito a tentar desencorajar os passageiros extremamente frequentes, que constituem uma enorme quantidade de passageiros das nossas companhias aéreas", disse ele à DW.

Para ele, isso pode ser feito a partir de uma série de medidas, desde o aumento dos impostos sobre o querosene para aviões até um imposto para passageiros frequentes, passando por um aumento das taxas para companhias aéreas nos aeroportos até um menor apoio governamental direto ao setor.

"Todos temos de voar menos, e os voos têm de ser mais caros a médio e longo prazo, porque isso deve funcionar como um meio de desencorajar as pessoas a voarem tanto", afirmou.

Na sua entrevista ao Financial Times, a comissária europeia Adina Valean disse que não tem planos de intervir no mercado da aviação, mas que buscará uma "explicação detalhada" das companhias aéreas sobre o aumento das tarifas aéreas.

Alguns governos tentaram intervir. O governo italiano anunciou planos no início de setembro para limitar as tarifas aéreas entre a Itália continental e as ilhas da Sicília e da Sardenha, depois de os preços terem disparado no verão. No entanto, o governo recuou após uma forte reação das companhias aéreas, lideradas pela Ryanair.

A França procura seguir um rumo oposto. O ministro dos Transportes do país disse recentemente que está buscando apoio de outros países da UE para estabelecer preços mínimos em voos dentro da UE, para tentar ajudar a reduzir as emissões. Ele diz que é necessário um debate sobre o "preço social e ambiental de uma passagem aérea".

Autor: Arthur Sullivan

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