Em 2023, primeiro ano do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, 208 indígenas foram assassinados no Brasil. O número é 15,5% maior em relação ao ano anterior, o último de Jair Bolsonaro na Presidência da República, quando 180 indígenas foram mortos.
Os dados são do relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil, publicado nessa segunda-feira (22/07) pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
Como em anos anteriores, os estados que registraram o maior número de assassinatos foram Roraima (47), Mato Grosso do Sul (43) e Amazonas (36), que representam 39% do total.
"O conselho lança esse relatório com profundo pesar", afirmou o presidente do Cimi e arcebispo de Manaus (AM), Leonardo Steiner, na apresentação do documento.
"O ano de 2023 iniciou com grandes expectativas em relação à política indigenista do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não apenas porque a nova gestão sucedeu um governo abertamente anti-indígena, mas também porque o tema assumiu centralidade nos discursos e anúncios feitos pelo novo mandatário desde a campanha eleitoral", destaca o conselho.
O relatório cita a criação do inédito Ministério dos Povos Indígenas (MPI), à nomeação de representantes de diferentes etnias para postos importantes, como o próprio MPI, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e a Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), e a declaração de Emergência Nacional de Saúde na Terra Indígena Yanomami, com a subsequente operação de retirada de não-indígenas, sobretudo garimpeiros, da reserva.
As mortes por desassistência à saúde mais que dobraram, com 111 casos registrados, ante 40 no ano passado. O indicador faz parte da categoria de omissão do poder público, que também aumentou na comparação entre o último ano de Bolsonaro e o primeiro de Lula.
As mortes infantis, também nesse grupo, somam óbitos de crianças indígenas de 0 a 4 anos de idade, que chegaram a 1.040 em 2023. A maior parte desses óbitos foi considerada evitável pelo Cimi, por estarem relacionadas a ações de saúde.
As disputas em torno dos direitos indígenas representaram um cenário de continuidade das violências e violações contra os povos originários e seus territórios em 2023.
Impasses e contradições na política indigenista
O relatório sublinha que o primeiro ano do novo governo federal foi marcado pela retomada de ações de fiscalização e repressão às invasões em alguns territórios indígenas, mas que "a demarcação de terras e as ações de proteção e assistência às comunidades permaneceram insuficientes".
Isso favoreceu a continuidade das invasões, conflitos e ações violentas contra comunidades e a manutenção de altos índices de assassinatos, suicídios e mortalidade na infância nessa população, diz o relatório.
No primeiro ano da atual gestão, oito terras indígenas foram homologadas, número inferior ao esperado, diz o Cimi.
"A disposição do governo federal em explorar petróleo na foz do Amazonas, a priorização orçamentária ao agronegócio e o apoio a grandes projetos de infraestrutura e de exploração minerária em conflito com povos indígenas, como a ferrovia 'Ferrogrão' e as investidas de empresas estrangeiras sobre o território Mura, no Amazonas, também compuseram este cenário", aponta a entidade.
O Cimi também critica a atuação do Legislativo contra a garantia de direitos dos indígenas. No ano passado, mesmo após entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) contrário à tese, o Congresso Nacional incluiu em lei o marco temporal para demarcação de terras indígenas.
Assim, os povos indígenas têm direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição. Na prática, a medida "busca inviabilizar novas demarcações e abrir as terras já demarcadas para a exploração econômica predatória", diz o conselho.
sf (Agência Brasil, ots)