Netanyahu é criticado por falta de planos para um pós-guerra

Observadores e população israelense apontam que governo deveria ter um plano mais claro de como transformar em avanço diplomático as conquistas militares na guerra contra o Hamas.

Por Deutsche Welle

A guerra entre Israel e o Hamas e seus aliados entrou em seu segundo ano, sem fim à vista. E quando se trata de planos concretos de como concluí-la, e o que deve acontecer depois, a resposta israelense é bastante vaga.

O termo usado pelo governo e pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu para definir seus objetivos é "vitória total". No entanto, o que isso significa na prática é passível de interpretações, e muitos acreditam que o próprio governo israelense não chegou a uma definição.

Do status quo à guerra

Durante anos, Netanyahu e seus vários governos (além do atual mandato, ele governou de 1996 a 1999 e de 2009 a 2021) foram conhecidos por manter o status quo no conflito em curso com os palestinos.

Essa abordagem, chamada em hebraico "Nihul HaSikhsukh", ou "gerenciamento de conflitos", significa manter a situação atual a todo custo. Entre as exigências de seus eleitores de direita e a necessidade de encontrar uma solução para a situação na Cisjordânia ocupada e na Faixa de Gaza, Netanyahu adiou várias vezes uma tomada de decisão.

De acordo com relatos da imprensa israelense, o premiê disse em 2019 que parte de sua estratégia era manter a divisão entre facções palestinas na Cisjordânia e em Gaza, permitindo transferências de dinheiro do Catar para o Hamas. Mas em 7 de outubro de 2023, muitos israelenses sentiram que essa conduta havia se tornado um terrível fracasso.

Os ataques terroristas realizados por vários grupos islâmicos e liderados pelo Hamas – rotulado como organização terrorista pelos Estados Unidos, União Europeia, Canadá e outros – custaram cerca de 1.200 vidas em Israel, a maioria civis, e resultaram no sequestro de cerca de 250 reféns, que foram levados para Gaza. Desses,101 ainda estão sendo mantidos no enclave, um ano depois.

Depois do pior ataque terrorista da história de Israel e o massacre mais mortal de judeus desde o Holocausto, o governo israelense teve que fazer algo que havia evitado em escaladas anteriores com o Hamas: anunciar oficialmente uma guerra total.

"Não é uma operação, não é uma rodada – uma guerra", declarou Netanyahu após saber dos ataques de 7 de outubro.

EUA pedem "estratégia política"

No entanto, um ano após o início da guerra contra o Hamas e várias semanas após Israel ter lançado uma incursão no sul do Líbano, parece que Netanyahu está voltando lentamente a seus velhos hábitos, e autoridades de segurança de Israel pedem mais determinação no processo de tomada de decisões políticas.

Por um lado, militares israelenses afirmaram que o Hamas foi "derrotado em termos militares" e que agora opera apenas como um grupo guerrilheiro. Por outro lado, houve pouquíssimas notícias sobre a liberação dos 101 reféns que ainda estão nas mãos do grupo terrorista em Gaza, e os ataques dentro de Israel continuam.

A recente escalada no Líbano custou a vida de soldados e forçou a evacuação de dezenas de milhares de israelenses. Os ataques com foguetes, principalmente partindo do Líbano, também continuam sendo um problema. Mas ainda não há notícias do governo israelense quanto ao seu plano de longo prazo em relação à guerra e ao seu resultado.

Os Estados Unidos, aliado mais próximo de Israel, também pediram a Netanyahu que torne mais claras suas intenções futuras. Em maio – depois de uma viagem a Israel para se reunir com Netanyahu, o presidente israelense, Isaac Herzog, e outras autoridades do governo – o conselheiro de segurança nacional dos EUA, Jake Sullivan, disse que havia "reafirmado a necessidade de Israel conectar suas operações militares a uma estratégia política que possa garantir a derrota duradoura do Hamas, a libertação de todos os reféns e um futuro melhor para Gaza".

Maioria dos israelenses: governo não tem objetivos claros

A mesma percepção se aplica aos recentes confrontos de Israel com o grupo islâmico Hezbollah no sul do Líbano. Os EUA pediram que Israel traduzisse seu sucesso militar e de inteligência – que incluiu o assassinato do líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, e de grande parte do alto comando da organização – em conquistas políticas.

Uma autoridade familiarizada com o modo de pensar do governo israelense disse ao jornal americano The Washington Post que Israel tem uma estratégia de como atingir o Hezbollah. "Mas não há necessariamente uma estratégia do que virá depois, de como sair dessa situação."

Parte do problema seria o conflito dentro do próprio governo israelense. Enquanto a extrema direita quer ver Israel atacar com força o Irã, aliado do Hezbollah, que no início de outubro lançou 200 mísseis contra Israel, em retaliação à morte de Nasrallah e outros líderes, para as alas mais moderadas do governo de Netanyahu trabalhar em conjunto com os EUA é o caminho certo.

Grande parte da população israelense também acha que o governo não está fazendo o suficiente em termos de planejamento para o fim da guerra. De acordo com uma pesquisa recente do Instituto de Políticas para o Povo Judeu, 57% dos israelenses consideram que a falta de objetivos claros é o motivo pelo qual a guerra se arrasta há tanto tempo, e 76% acham que a guerra tem demorado porque o governo não tomou as decisões certas com a rapidez necessária.

Muitos israelenses também acreditam que a sobrevivência política é o que alimenta o conflito: segundo 55%, a guerra foi prolongada devido às considerações políticas do atual governo de coalizão.

Embora pesquisas de opinião sugiram que o partido Likud, de Netanyahu, tenha recuperado o apoio da população nas últimas semanas, a coalizão de direita do país ainda está atrás dos partidos de oposição.

Quanto à "vitória total" de Netanyahu, o Comitê de Relações Exteriores e Defesa do parlamento israelense estava programado para se reunir em 6 de outubro com o fim de definir oficialmente os termos "vitória" e "derrota". Mas a reunião acabou sendo cancelada.

Solução de dois Estados rejeitada

A falta de estratégia do governo israelense também representa um problema para o que deve acontecer após a guerra. Políticos de extrema direita do governo pressionaram por uma expansão dos assentamentos na Cisjordânia, considerados ilegais pela maior parte da comunidade internacional. Alguns até mesmo pressionam por um reassentamento israelense na Faixa de Gaza.

No entanto, o apelo vindo do mundo árabe e muçulmano para a normalização dos laços com Israel em troca da permissão para o estabelecimento de um Estado palestino têm se tornado cada vez mais forte. Até recentemente, esse pedido só se escutava a portas fechadas ou em canais confidenciais.

O político árabe mais graduado a falar sobre o assunto é Ayman Safadi, ministro das Relações Exteriores da Jordânia. Em coletiva de imprensa após o discurso de Netanyahu na Assembleia Geral da ONU, em setembro, Safadi disse que o mundo árabe e muçulmano estava disposto a garantir a segurança de Israel, caso o país concordasse com o estabelecimento de um Estado palestino de acordo com as fronteiras anteriores a 1967.

"Estamos aqui – membros do comitê nomeado por 57 países árabes e muçulmanos – e posso dizer de forma muito inequívoca que todos nós estamos dispostos a garantir a segurança israelense, sob condição do fim da ocupação por parte de Israel e permitir o surgimento de um Estado palestino", afirmou Safadi.

De acordo com ele, Israel rejeitou uma solução de dois Estados. O governo israelense não tem nenhuma posição oficial sobre essa solução, mas vários de seus membros rejeitam categoricamente qualquer perspectiva de os palestinos terem um Estado próprio. "Vocês podem perguntar às autoridades israelenses qual é o objetivo deles, além de guerras e guerras e guerras?", provocou Safadi.

Autor: Felix Tamsut

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