Em denúncia apresentada à Justiça, o Ministério Público Federal mostra que agentes da cúpula da Polícia Militar do Distrito Federal (PM-DF) tinham consciência do que aconteceria no dia 8 de janeiro, em Brasília. Entre os alvos, o comandante-geral da corporação, o coronel Klepter Rosa Gonçalves.
As cenas de destruição criminosa ao Congresso Nacional, Palácio do Planalto e Supremo Tribunal Federal (STF) não foram apenas permitidas por omissão do comando da PM. De acordo com MPF, também foram incentivadas.
A denúncia do MPF se sustenta com base em trocas de mensagens entre os oficiais presos nesta sexta-feira (18). Os investigadores acreditam que houve premeditação na omissão. Após os primeiros atos de vandalismo, depois da diplomação do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 12 de dezembro de 2012, o major Flávio Alencar, responsável pelo Batalhão da Esplanada dos Ministérios, escreveu:
Na primeira manifestação é só deixar invadir o Congresso.
No mês anterior, o coronel Jorge Eduardo Naime, também preso, fazia vista grossa à instalação do acampamento em frente ao Quartel General do Exército em Brasília, mesmo sob alerta da presença cada vez maior de pessoas. Abaixo, o que ele afirmou:
Deixa os melancia [sic] se virar.
“Melancia” é um termo usado para dizer que alguns militares, por fora, seriam verdes, e vermelhos, ou seja, de esquerda, por dentro.
PM se infiltrou em acampamento
O principal argumento da cúpula da PM para explicar a violência contra as sedes dos três poderes é o de que um “apagão”na inteligência da corporação não detectou a movimentação antes do 8 de janeiro. As mensagens, no entanto, mostram que eles sabiam de tudo.
O inquérito destaca a ação de um capitão da PM que estava infiltrado no acampamento em frente ao QG do Exército. A mensagem, da manhã do da 7 de janeiro, diz:
Grupos mais exaltados mencionam saber dos anexos das casas do Congresso e acham que uma tentativa de invasão seria mais fácil por eles
Cerca de cinco horas depois, o mesmo PM infiltrado disse que a animosidade estava alta.
O coronel Paulo José de Souza Ferreira, ex-chefe do Departamento de Operações Especiais, em mensagem a oficiais, ressaltou o seguinte sobre os criminosos:
Vieram preparados para a guerra mesmo [...]. A coisa tá mais séria do que muitos brasileiros estão imaginando [sic]
PM quis impedir Força Nacional
Para a Procuradoria Geral da República (PGR), a “falha” não decorreu de deficiências. Foi uma omissão dolosa dos denunciados que aderiram ao intento criminoso dos insurgentes. Os agentes de segurança poderiam ter atuado para impedir os resultados lesivos, aponta o inquérito.
No dia anterior aos ataques, por exemplo, o major Flávio Silvestre, designado pelo coronel Casimiro Vasconcelos para comandar as tropas em campo, avisou ao superior, em um áudio, que não permitiria a atuação da Força Nacional.
Vou falar logo pro senhor, viu? Se amanhã eu estiver de comandante, como estarei, não vou permitir a atuação da Força Nacional na nossa Esplanada, viu? Não vou autorizar (major Flávio Silvestre)
Casimiro afirmou que a tropa, solicitada pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (PSB), estaria apenas em pontos distantes da Praça dos Três Poderes.
Conspiração
A cúpula da PM também trocava mensagens de cunho conspiratório. O coronel Klepter encaminhou o seguinte ao responsável pela segurança da área:
Na hora em que der o resultado que o Lula ganhou, vai ser colocado em prática o artigo 142, vai ser reestabelecida a ordem, afasta Xandão, se afasta esses vagabundo tudinho e ladrão dessa quadrilha [sic]
Conclusão de Moraes
No despacho que autoriza as prisões, o ministro Alexandre de Moraes, do STF concordou com a justificativa de omissão dolosa dos PMs.
Pela omissão no cumprimento de seus deveres funcionais, todos os denunciados concorreram dolosamente para a concretização dos resultados danosos perpetrados pela massa violenta, aderindo psicologicamente aos crimes praticados pela horda (Alexandre de Moraes)
Nota da PM
Em nota, a Polícia Militar Do Distrito Federal afirmou que a Corregedoria da corporação acompanha o caso. O governador Ibaneis Rocha (MDB) destacou que participa com informações e diligências para que o processo seja justo e célere.