Exclusivo: Intermediários vendem nas redes sociais plástica sem avaliação médica

Intermediação de procedimentos estéticos é proibida. Cremesp abriu sindicância para apurar a conduta dos médicos

Olívia Freitas, Bárbara Damasceno, Luana Massuella, Naima Popp e Fabiana Vilela

O Jornal da Band mostra como as redes sociais estão sendo usadas de forma inescrupulosa por médicos e por pessoas que se auto intitulam "facilitadoras de procedimentos médicos". As imagens vendem corpos supostamente transformados por cirurgias bem-sucedidas, o chamado antes e depois.

Como se fossem produtos em prateleiras, os perfis anunciam procedimentos com lista de preços, descontos e promoções. Ignoram riscos e vendem resultados. A intermediação de procedimentos estéticos é proibida. Mas basta uma pesquisa rápida para encontrar diversas páginas vendendo pacotes de cirurgias antes mesmo da avaliação médica.

Em um perfil, a primeira informação dada é o valor do implante de silicone. Não foi diferente nesta outra página no Instagram com 350 mil seguidores. A reportagem entrou em contato (sem se identificar) para entender do que se trata.

“Nós não somos uma clínica. Nós somos uma facilitadora de cirurgia plástica. Como funciona? Nós indicamos os doutores parceiros que eles fazem valores promocionais para pacientes.”

Por meio da página, o visitante é encaminhado a uma conversa no Whatsapp. Lá, entre as opções, é oferecida uma lista de médicos. O primeiro nome é do Dr. Herbert Gauss. A reportagem conseguiu agendar uma consulta. O endereço é em uma área nobre de São Paulo.

Durante a consulta, o perfil é citado.

“A maioria das mulheres que estão no insta da BellaDessa foi o senhor mesmo quem fez?”

“Então, filha, entenda o seguinte... Todos os casos foram feitos por mim e pela minha equipe. Eu tenho cinco assistentes, minha mulher é médica também, cirurgiã também. Então, é o seguinte: eu sou responsável por todos, tá? De alguma forma eu participei da cirurgia”, respondeu o Dr. Herbert Gauss.

A assistente do médico fala sobre a relação com o perfil do Instagram: “A Bella indica. Faz uma assessoria de divulgação”.

Começa, então, a negociação.

“Na promoção que a gente está fazendo, que a gente está conseguindo fazer, o peito, hoje, você gastaria R$ 8,5 mil. E se você quiser fazer o braço, tudo sai R$ 12 mil. Você pode pagar à vista ou em dez vezes sem juros ou um pouco à vista e um pouco no cartão.”

A reportagem também conversou sobre um outro pacote oferecido. Neste caso, a situação é considerada ainda mais grave.

“Vi um pacote mais barato no Instagram, mas era para fechar remotamente.”

A secretária responde: “Tinha uma promoção, mas era pra fechar de forma remota, sem vir até aqui. Aí, é outro preço, mesmo.”

Um vídeo, na página, dá o passo a passo da avaliação remota. Primeiro, você precisa enviar uma foto para o médico. Ao receber a foto, o médico de sua preferência faz uma pré-avaliação e dirá quais os procedimentos indicados para você. Se a paciente quiser, faz o pagamento na hora. O negócio é fechado antes mesmo de conhecer o médico que fará o procedimento escolhido, o que é proibido. 

O contato termina aqui.

A indicação dos procedimentos e valores só deve ser feita após avaliação do médico que vai analisar, também, os riscos. A inversão desse processo, segundo especialistas da área, expõe o paciente a mais perigos e leva à banalização das cirurgias plásticas. 

Cremesp investiga

O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) abriu sindicância para apurar a conduta dos médicos que são citados pelo perfil na internet.

Eles são investigados, segundo o conselho, por infração a artigos relacionados à publicidade médica e por se valerem de intermediadoras para a venda dos procedimentos.

“O que se vê é óbvio que o intuito é um intuito financeiro, mercantilista, basicamente, usando subterfúgios e tentando burlar as regras que regem a atuação profissional”, diz Angelo Vattimo, diretor do Cremesp.

O Ministério Público foi acionado pelo Cremesp, que denunciou o perfil "Bella Dessa"  por exercício ilegal da profissão médica.

“Há uma infração também criminal, penal, porque você quando entra nessa página tá como consultoria em cirurgia plástica. Quem faz consultoria em cirurgia plástica ou quem consulta, vamos dizer, é uma especialidade médica. É médico! Então, já é um exercício ilegal da medicina.” 

Desde 2019 o médico Herbert Gauss aparece em uma série de convocações e punições pelo Cremesp. Ele chegou a ter o registro profissional cassado em 2021 pelo descumprimento de regras dos conselhos federal e regional, além de irregularidades em publicidades. (45, 131 e 132). A cassação foi suspensa por decisão da justiça. Ele é citado em dezenas de processos sob a acusação de erro médico. Ele não tem registro de especialista em cirurgia plástica.

O Jornal da Band tentou contato com o médico Herbert Gauss, mas não obteve retorno.

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