A jornalista Glória Maria, que morreu nesta quinta-feira (2), no Rio de Janeiro, abriu as portas para que muitas pessoas negras, principalmente as mulheres, tivessem visibilidade e representatividade no jornalismo.
A jornalista e apresentadora Cynthia Martins, da Band, destacou a importância de Glória Maria. “Ela é maior que o jornalismo”, afirmou “Sempre compartilhei a mesma história, as mesmas raízes e a mesma cor da pele. Sou de Oswaldo Cruz, no Rio, a mesma região onde ela cresceu. Quando escolhi essa profissão vi a Glória mostrar para a gente que era possível."
“O lugar que o preto podia ocupar era o da estabilidade, do concurso público, das Forças Armadas. Eu resolvi que seria jornalista, era algo inimaginável. Ninguém sabia o que era ser jornalista no meu bairro. A Glória Maria é algo maior que o jornalismo. Os caminhos que ela abriu ela fez sozinha. Ela criou o modelo quando nem se falava de representatividade. Se ela não tivesse tido que ser tão forte e se endurecer em alguns momentos, é algo que o Brasil nunca vai conseguir mensurar o tamanho”, disse Cynthia em entrevista à BandNews (veja no vídeo abaixo).
“Ela foi a primeira repórter negra em uma grande emissora”, destacou José Luiz Datena durante a transmissão do Brasil Urgente.
Professora titular da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (FAC-UnB), Dione Moura pesquisa a atuação de jornalistas negras brasileiras. Relatora do projeto de cotas e ingresso de indígenas da UnB, Dione destaca que Glória Maria abriu caminhos para a visibilidade de negras na profissão.
“Ter Glória Maria, uma mulher negra, como referência no telejornalismo e no jornalismo brasileiro, deve ser tomado como inspiração para atuais e futuras gerações de jornalistas e mulheres negras no Brasil. A imprensa comercial, aos poucos, tem aberto espaço para dar visibilidade às jornalistas negras e Glória Maria, um nome para não ser esquecido, teve papel fundador e histórico”.
Fundadora da Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial do Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro (Cojira-Rio/SJPMRJ), Angélica Basthi afirma que Glória Maria foi uma “gigante” no jornalismo, como ser humano, como uma mulher e, principalmente, como mulher negra.
“Ela brilhou na televisão brasileira, ela ajudou a construir a história do jornalismo na televisão brasileira e, por décadas, ela foi a única referência como pessoa negra dentro do nosso jornalismo e sempre brilhando. Como ela mesmo dizia, ela não tinha medo do medo. Então ela conquistou o público, a nossa admiração e a nossa estima porque ela sempre se dedicou a trazer para as telas da televisão brasileira a essência do jornalismo, que é a busca da verdade.”
Coordenadora das edições 2011 e 2012 do Prêmio Nacional Jornalista Abdias Nascimento, que reconhece produções com ênfase na questão racial, Angélica Basthi se emociona ao falar da participação de Glória Maria no evento.
“Eu cresci vendo as reportagens da Glória Maria, tornei-me jornalista por conta da Glória Maria sim e falo isso com muito orgulho. Tive a felicidade de conhecê-la e convidá-la para fazer a entrega na premiação e a Glória aceitou o nosso convite com toda alegria e sempre mantendo o compromisso que ela tinha com a questão racial. A Glória Maria não precisava dizer muita coisa, né? A nossa pele fala e a Glória Maria falou durante décadas, dando voz a milhares de vozes de mulheres negras e homens negros nesse país. Ela deixa um legado inestimável e vai fazer muita falta”.
Luto oficial
O governo do Rio de Janeiro decretou luto oficial no estado pela morte da jornalista. Em nota, o governador Cláudio Castro declarou que “Glória Maria era um nome forte do jornalismo brasileiro”.
“Uma profissional que foi sinônimo de competência, talento e dedicação em tudo o que fez. Mas também não podemos deixar de exaltar a mulher Glória! Todos precisam saber da história da menina humilde, nascida no RJ, que com muita garra e determinação lutou contra o preconceito, as dificuldades, e alcançou lugares altos”.
Glória Maria era filha do alfaiate Cosme Braga da Silva e da dona de casa Edna Alves Matta. Deixou duas filhas, Maria (15) e Laura (14), que adotou em 2009.