Os temores de uma guerra entre grupos criminosos alemães e holandeses aumentaram recentemente. Indícios apontam que uma série de explosões na cidade alemã de Colônia estaria ligada a essa disputa. Na quarta-feira da semana passada (18/09), um artefato incendiário explodiu em uma loja de roupas localizada em uma rua de comércio bastante popular.
"Há, obviamente, acertos de contas ocorrendo naquela região que ainda estão sendo resolvidos", afirmou em uma coletiva de imprensa o chefe do Departamento de Investigação Criminal de Colônia, Michael Esser.
Os investigadores há muito suspeitam que cartéis da Holanda estejam envolvidos em ações criminosas no estado alemão da Renânia do Norte-Vestfália, onde se localizam cidades como Colônia, Düsseldorf e Bonn.
O recente sequestro e tortura de um homem e uma mulher em Colônia na Alemanha elevou as preocupações das autoridades. A suspeita é tenha sido um ato de vingança por uma compra de drogas que não teria sido paga. As duas vítimas, aparentemente membros de uma organização criminosa alemã, foram libertadas por uma força especial da polícia no início de agosto. A operação resultou em quatro prisões e em buscas em seis edifícios e apartamentos na cidade, nas quais dois outros homens foram detidos.
Mais de 800 redes criminosas na Europa
Explosões durante tentativas de roubo a caixas automáticos também foram registradas na Renânia do Norte-Vestfália, estado no oeste da Alemanha que faz fronteira com a Holanda. Esses crimes são atribuídos à chamada Mocro Máfia, forma como vários veículos de imprensa holandeses e alemães se referem a esses criminosos.
O termo é utilizado para designar organizações do crime organizado composta majoritariamente por holandeses de origem marroquina, que atuam no tráfico de drogas. Essa designação, contudo, é bastante controversa e interpretada como racista por alguns afetados.
A máfia holandesa é apenas uma entre várias organizações criminosas que atuam na Europa. A Europol contabilizou 821 redes criminosas que atuam no continente. Juntos esses grupos reúnem mais de 25 mil membros.
As origens da Mocro Máfia
O termo comum para designar grupos criminosos holandeses também é conhecido por ser o título de uma série de televisão de sucesso, transmitida na Holanda e na Alemanha. Contudo, os criminologistas e a polícia concordam que esses grupos não possuem identidade étnica uniforme.
"A chamada Mocro Máfia começou importando maconha para a Holanda nos anos 1990 e depois expandiu seus negócios para incluir a importação de cocaína", conta Dirk Peglow, diretor da Associação Alemã de Investigadores Criminais. "Lidamos com um grupo cujas estruturas estão estabelecidas há décadas, e que não é mais formado apenas por marroquinos."
O grupo, contudo, costuma ser bem mais violento do que as gangues alemãs. Histórias sobre câmaras de tortura, cabeças decepadas e até sobre planos para sequestrar a princesa herdeira da Holanda, Catharina-Amalia, na época com apenas 18 anos, viraram notícia.
O criminologista holandês Cyrille Fijnaut calcula que entre dez e 20 pessoas sejam assassinadas pela organização todos os anos.
"Em todos os grupos, a prontidão à violência é bastante alta", observa Mahmoud Jaraba, cientista político e pesquisador do crime no Centro de Pesquisas FAU para o Islã e o Direito na Europa. "Nesse grupo, porém, a predisposição para se cometer atos de violência é maior." Segundo o especialista, as semelhanças entre as gangues estão nas estruturas e nos modelos de negócio.
"Os clãs árabes na Alemanha não são muito diferentes. Os líderes vêm de uma determinada família, mas estes não são grupos fechados", acrescenta Jaraba. "Sem suas redes dentro e fora da Alemanha e da Holanda, eles não sobreviveriam."
Assassinatos de testemunhas e rivais
A brutalidade e a falta de escrúpulos do grupo se tornaram evidente na Holanda em 2021, com o assassinato do jornalista Peter de Vries, que denunciava incessantemente o crime organizado no país. Ele foi executado numa rua de Amsterdã logo após participar de um programa de televisão.
Um dos três assassinos foi julgado em um tribunal em um processo que durou anos. Além de De Vries, também foram assassinados o irmão de uma testemunha-chave do caso e um promotor.
Em fevereiro deste ano, o tribunal condenou 17 réus – entre eles, o líder da gangue Ridouan Taghi – a longas penas de prisão por múltiplos assassinatos e tentativas de assassinato. Taghi e outros três membros do grupo receberam penas de prisão perpétua. Em junho, outros seis homens foram condenados pela morte de De Vries.
Apesar do sucesso das ações nos tribunais, as redes criminosas parecem estar florescendo e se espalhando pela Alemanha. "Vimos na Renânia do Norte-Vestfália que o grupo já está ativo na Alemanha e que suas atividades criminosas são brutais ao ponto de aceitar causar ferimentos e até mortes de inocentes", afirma Peglow.
Mesmo que o sequestro em Colônia tenha mostrado que pode haver disputas entre as organizações criminosas, esses grupos tendem geralmente a trabalharem juntos.
As gangues alemãs são aparentemente responsáveis por importar cocaína e heroína dos grupos holandeses. "Até hoje, esses relacionamentos e colaborações entre os vários grupos criminosos da Holanda e Alemanha continuam", explica Jabara.
Desafios do combate ao crime organizado
Os pesquisadores não sabem exatamente quando a Mocro Máfia começou a expandir seus negócios para a Alemanha, tampouco quais crimes ela teria cometido no país. As polícias alemã e holandesa, segundo informações próprias, conseguiram nos últimos anos reunir mais informações sobre as redes criminosas internacionais graças à análise de conversas em aplicativos de mensagens.
Mesmo assim, Dirk Peglow alerta que os políticos alemães devem fazer mais para apoiar os esforços da polícia. "Na Alemanha, não podemos esperar até que estruturas semelhantes às existentes na Holanda sejam estabelecidas", destaca. "Temos que cooperar mais a polícia holandesa e evitar que incidentes como os que ocorreram na Renânia do Norte-Vestfália acabem virando a norma".
Jaraba observa que se não houver mais recursos para combater o crime, a polícia terá poucas chances contra essas estruturas criminosas. "Temos extremamente poucas opções para combater esse fenômeno, porque, na maioria dos casos, esses criminosos vêm da Holanda, escapam através de rotas de fuga e têm pessoas que trabalham com eles".
Autor: Ben Knight