Entenda por que a eleição de 2024 é histórica para a Venezuela

Nicolás Maduro busca seu terceiro mandato de seis anos e o cientista político e ex-embaixador Edmundo González, candidato da oposição, tenta derrotar o chavismo

Por Karina Crisanto

Entenda por que a eleição de 2024 é histórica para a Venezuela
Pessoas com a bandeira da Venezuela em Caracas
REUTERS/Maxwell Briceno

A população da Venezuela vai às urnas neste domingo (28) para escolher o novo presidente. Enquanto esta é considerada uma das eleições mais importantes para o país desde que Nicolás Maduro chegou ao poder, a credibilidade do pleito é questionada pela comunidade internacional. 

Maduro busca seu terceiro mandato de seis anos – que pode levá-lo a completar 18 anos seguidos no cargo -, e o cientista político e ex-embaixador Edmundo González, candidato da oposição, tenta derrotar o chavismo. 

O pleito é marcado por repressão política de adversários, como a ex-deputada Maria Corina Machado, impedida de concorrer após ter sido considerada inelegível para cargos públicos pelo período de 15 anos, e a substituta dela, a filósofa Corina Yoris, que não conseguiu completar o registro da candidatura à presidência na plataforma eleitoral do país.

Pesquisas eleitorais indicam que, pela primeira vez, como explicou o especialista em relações internacionais Uriã Fancelli, o chavismo pode ser derrotado e abrir caminho para uma transição democrática no país. 

“O que chama atenção não é a realização de eleições, uma vez que estas podem ocorrer mesmo em ditaduras como fachada para projetar legitimidade, como é o caso da Rússia. O que é notável é que, pela primeira vez em 25 anos, há uma possibilidade real de o regime atual ser derrotado, abrindo caminho para uma transição democrática no país”, disse Uriã Fancelli ao Band.com.br

O especialista em relações internacionais pontua que a América Latina é frequentemente associada a golpes de Estado e políticos populistas “que se utilizam do clientelismo”, prática de troca de bens materiais por apoio político, mas a realização do pleito com chances reais de vitória da oposição traz “esperança de estabilidade”, algo inexistente atualmente da Venezuela. 

“Nicolás Maduro, seguindo os passos de seu antecessor Hugo Chávez, enfraqueceu a democracia, instrumentalizou as instituições e mergulhou o país em uma crise sem precedentes, com uma inflação anual superior a 90% ao ano, levando mais de 8 milhões de venezuelanos a buscarem oportunidades em outros países.”. 

Legitimidade do processo eleitoral 

Para o especialista, o processo eleitoral não deve ser analisado apenas no dia de votação, ou seja, na quantidade e no percentual de votos recebidos por cada candidato, mas em todo o seu contexto. 

“No caso da Venezuela, já é possível afirmar que o processo não foi justo. Maria Corina Machado, o principal nome da oposição, foi impedida de concorrer, assim como sua substituta indicada, Corina Yoris. Os opositores enfrentaram obstáculos durante o processo, incluindo dificuldades durante a campanha, restrições na propaganda midiática e intimidação nos comícios”, afirmou Uriã Fancelli. 

“Embora não possamos prever exatamente o que acontecerá no domingo, dia da votação, sabemos das possibilidades. Entre elas, a repetição das intimidações e irregularidades que têm marcado outros processos eleitorais sob o regime chavista”, acrescentou.

Papel da comunidade internacional 

A comunidade internacional terá um papel importante nas eleições venezuelanas e pode tentar influenciar um pleito livre e justo de diversas maneiras. 

  • Estados Unidos: busca influenciar o processo impondo sanções, como forma de penalizar e enfraquecer o regime de Maduro nos últimos anos;
  • Acordo de Barbados: a tentativa mais recente visa aliviar algumas das sanções em troca da realização de um processo eleitoral justo, porém essa tentativa falhou.

“Embora alguns observadores eleitorais internacionais estejam presentes para acompanhar as eleições, eles seguirão um roteiro organizado pelo Conselho Nacional Eleitoral, controlado por Maduro. Isso levanta dúvidas sobre a liberdade real desses observadores, especialmente porque alguns, como a União Europeia, foram desconvidados”, explicou Uriã Fancelli. 

O ex-presidente da Argentina Alberto Fernández, que declarou que Maduro deveria aceitar uma eventual derrota, também foi desconvidado, o que “exemplifica como o regime de Maduro opera para controlar a narrativa e limitar a observação externa”. 

“Banho de sangue” e “guerra civil”: as ameaças de Maduro 

Com a oposição liderando as pesquisas eleitorais venezuelanas, Nicolás Maduro declarou em um comício que o país pode enfrentar um “banho de sangue” e uma “guerra civil” caso ele não seja reeleito. 

Na visão de Uriã Fancelli, essas ameaças parecem uma tentativa de intimidar os eleitores, como uma forma de desencorajá-los a comparecer às urnas. 

“O uso de violência no discurso político de Maduro não é novidade; ele frequentemente utiliza uma linguagem agressiva para atacar seus adversários políticos, tanto internos quanto externos, e para mobilizar seus apoiadores. Maduro costuma acusar seus opositores de serem traidores, imperialistas ou conspiradores, e muitas vezes sugere que medidas severas sejam tomadas contra eles.” 

“Esse tipo de retórica é comum em regimes autoritários ou com tendências autoritárias, onde o discurso é usado para deslegitimar a oposição, intimidar adversários e consolidar o apoio entre os seguidores leais.” 

Essequibo 

Uriã Fancelli explicou também que a comoção gerada pelo referendo promovido por Maduro sobre Essequibo pareceu uma tentativa de mobilizar apoio popular e unir o país em torno de uma causa comum neste período eleitoral. 

“A possibilidade de Maduro adotar medidas mais drásticas em relação a Essequibo, caso não vença as eleições, não pode ser completamente descartada, mas parece improvável no momento”, disse. 

Possível derrota de Maduro

Para o especialista em relações internacionais, em caso de vitória da oposição, o mais prudente seria Nicolás Maduro negociar uma transição pacífica de poder, “buscando garantias de anistia para si e seus aliados”. 

“Isso poderia ajudar a evitar um agravamento das tensões internas e facilitar uma mudança de governo sem maiores conflitos. A oposição, por sua vez, teria que lidar com a questão de Essequibo de maneira diplomática, evitando ações que possam provocar uma crise regional”, finalizou. 

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