Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 75 anos com pouco a comemorar

Em meio à crescente desigualdade, autoritarismo, mudanças climáticas e conflitos armados, secretário-geral da ONU diz que "mundo está perdendo o rumo".

Por Deutsche Welle

Eleanor Roosevelt segurando um pôster da Declaração dos Direitos Humanos, em 1949
Divulgação/UN Photo

Na data em que a Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 75 anos, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, alertou neste domingo (10/12) para a crescente ameaça que a desigualdade, o autoritarismo, as mudanças climáticas e os conflitos armados representam para os direitos e as liberdades da população mundial.

"O mundo está perdendo o rumo", afirmou.

"Os conflitos estão se espalhando com virulência. A pobreza e a fome estão aumentando. As desigualdades estão se tornando mais profundas, as alterações climáticas se transformaram em uma crise humanitária, o autoritarismo está aumentando, o espaço civil está diminuindo, os meios de comunicação estão sitiados, a igualdade de gênero é um sonho distante e os direitos reprodutivos das mulheres estão retrocedendo", lamentou o secretário-geral da ONU, afirmando que todas estas crises ameaçam a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

O documento foi assinado em 10 de dezembro de 1948, apenas três anos após a devastação provocada pela Segunda Guerra Mundial e resume as suas intenções no seu primeiro artigo: "Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos".

O que agora pode parecer uma afirmação óbvia, na época foi considerada um avanço significativo na cooperação global.

"A Declaração Universal dos Direitos Humanos é um texto milagroso", afirmou Volker Türk, alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, em um comunicado. "Numa altura em que o mundo emergiu de acontecimentos cataclísmicos, a Declaração estabeleceu direitos universais e reconheceu o valor igual de cada pessoa", lembrou.

No entanto, Türk pondera que "mesmo que os 30 artigos da Declaração tenham desencadeado uma transformação em todas as áreas das nossas vidas (...) as brasas do racismo, da misoginia, da desigualdade e do ódio continuam ameaçando o nosso mundo".

Em sua fala, Guterres também lembrou o primeiro artigo da Declaração e afirmou que este princípio deveria ser "o roteiro para acabar com as guerras, curar divisões e promover uma vida de paz e dignidade para todos".

"A Declaração Universal dos Direitos Humanos nos mostra o caminho para resolver tensões, exercer valores comuns e criar a segurança e a estabilidade que o nosso mundo tanto anseia", disse.

Cenário sombio

A ONU estima que existam atualmente 110 milhões de refugiados em todo o mundo e 735 milhões de pessoas sem comida o suficiente. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), 50 milhões de pessoas estão em situação de escravidão.

"Agora, mais do que nunca, é a hora dos Direitos Humanos", observou Türk, dizendo que o texto "não é apenas um documento histórico, mas um testemunho vivo" da humanidade que partilhamos, "um guia intemporal".

Na opinião do alto comissário, o mundo sofre atualmente com níveis de conflitos violentos nunca vistos desde o final da Segunda Guerra Mundial, com o agravamento das desigualdades, o aumento da discriminação, do discurso de ódio, da impunidade, das divisões e da polarização, além da emergência climática.

"Isto realça ainda mais a necessidade de fazer um balanço, aprender lições e delinear em conjunto uma visão para o futuro baseada nos direitos humanos", destacou Türk.

Para Heiner Bielefeldt, professor de direitos humanos na Universidade de Erlangen, no sul da Alemanha, no geral, a situação é de um quadro sombrio que "extrapolou dramaticamente o pior cenário que eu podia imaginar há dez anos".

"Não houve apenas retrocessos, como também colapsos absolutos, tanto graças ao avanço dos regimes autocráticos como às tendências autocráticas nas democracias estabelecidas", destacou em entrevista à DW.

Algum progresso

Apesar da grave situação Bielefeldt aponta alguns progressos, como o mandado de prisão emitido para o presidente russo, Vladimir Putin, pelo Tribunal Penal Internacional. A Rússia, no entanto, não reconhece a Corte, tornando pouco provável que Putin enfrente justiça em seu país por ordenar a invasão da Ucrânia.

Dado o número de crises que a comunidade internacional enfrenta, Bielefeldt destaca que conseguir um equilíbrio continuará sendo um desafio significativo para os decisores políticos.

"Não se trata mais apenas de violações dos direitos humanos aqui e ali, ou de violações do direito humanitário internacional, mas do fato de todo um conjunto de regras internacionais, desenvolvido ao longo de décadas, correr o risco de ser destruído", alerta.

le (Lusa, DW)

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