Mais de 90 países confirmaram participação em uma cúpula organizada pela Suíça a pedido de Kiev para debater caminhos para a paz na Ucrânia. O evento ocorre neste sábado (15/06) e domingo no complexo hoteleiro Bürgenstock, perto do Lago Lucerna. Para o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, o evento é o ponto alto de uma maratona diplomática.
De acordo com a presidente suíça, Viola Amherd, metade das nações participantes vêm da Europa e da América do Norte. A segunda metade é formada por países do Sul Global – da América do Sul, África, Oriente Médio e Ásia.
Segundo Amherd, muitos governos agradeceram à Suíça por acolher a conferência. Para ela, trata-se de um "processo amplo", para criar as condições "para uma futura conferência de paz com a participação da Rússia".
Moscou não foi convidada. Por essa razão, o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, que está na Europa para o encontro do G7, se recusou a participar pessoalmente. Em vez disso, o Brasil enviará sua embaixadora em Berna.
Outro desfalque é a China. Apesar do empenho da Alemanha em convencê-la a participar, Pequim também enviou sua rejeição à Suíça. Lula insiste que a base do evento tem que ser um projeto selado entre Brasil e China, e que prevê a participação do Kremlin nas negociações de paz.
Reconstrução da Ucrânia
Esta semana, em um evento em Berlim pela reconstrução da Ucrânia, o chanceler federal da Alemanha, Olaf Scholz, disse que espera que, com a conferência de paz, "surgirá algo que nos aproximará da paz". Zelenski fez coro. Para o ucraniano, o fato de a conferência organizada pela Suíça ocorrer já é um sucesso.
"É muito difícil não perder aliados e países parceiros. E unir países que são parceiros e não parceiros é uma tarefa difícil para a Ucrânia", disse Zelenski, refletindo sobre mais de dois anos da grande invasão da Rússia.
Ao lado de Zelenski em Berlim, Scholz acrescentou que talvez, na Suíça, "poderia ser mostrada uma maneira de entrar com sucesso num processo em que a Rússia um dia também estará à mesa quando chegar a hora". Mas reforçou que a decisão sobre se Moscou deve ou não participar do debate é somente da Ucrânia.
Pressão da Rússia sob o Sul Global
Na Conferência de Recuperação da Ucrânia 2024 (URC2024) em Berlim, a União Europeia prometeu empréstimos para apoiar pequenas e médias empresas ucranianas, além de fundos para reparações de emergência no fornecimento de eletricidade e calor. Bruxelas contrai empréstimos para a Ucrânia, que por sua vez são pagos a partir das receitas de juros de ativos russos congelados na Europa.
Em Berlim, Zelenski também falou pessoalmente pela primeira vez no Bundestag(câmara baixa do Parlamento alemão) e pouco depois visitou soldados ucranianos que estão sendo treinados pela Bundeswehr (Forças Armadas Alemãs) para usarem o sistema de defesa aérea Patriot.
Em uma semana agitada para a diplomacia internacional, o URC2024 foi seguido pela reunião das sete maiores nações industrializadas do mundo, oG7, na Itália, com a esperança de que o maior número possível de chefes de Estado e governo viajassem de lá para a conferência na Suíça.
Nos bastidores, diz-se que a Rússia exerceu pressão, especialmente sobre os países do Sul Global, para boicotar a conferência suíça. É também por isso que os organizadores suíços consideram a presença de 90 nações um sucesso parcial. Aparentemente, isso também foi possível porque a agenda a ser discutida foi significativamente reduzida.
Sem cessar-fogo
A cúpula na Suíça não deve resultar em nenhuma solução de paz ou acordo de cessar-fogo. Os debates se concentrarão na segurança das centrais nucleares ucranianas. A maior usina nuclear da Europa, a de Zaporíjia, está ocupada por soldados russos, na linha de frente de batalha, no sul da Ucrânia.
Além disso, haverá discussões sobre a garantia adicional das exportações de cereais da Ucrânia, especialmente para os países do Sul Global, e sobre a libertação de crianças ucranianas raptadas pela Rússia nos territórios ocupados.
A declaração final da conferência não deverá incluir uma cessação imediata da guerra de agressão russa nem a retirada da Rússia da Ucrânia, como prevê o atual plano de paz formulado por Kiev.
Segundo Zelenski, para poder proteger pelo menos todas as grandes cidades e as instalações energéticas mais importantes, seu país precisaria de um total de sete sistemas antiaéreos Patriot. A Alemanha prometeu um terceiro sistema há semanas, mas muitos dos pedidos do governo alemão aos aliados por equipamento adicional permaneceram sem resposta.
À margem do URC2024, o presidente ucraniano disse que "a Alemanha é líder no apoio à Ucrânia, protegendo o seu espaço aéreo com sistemas Patriot".
A mídia dos EUA informou que o presidente americano, Joe Biden, deseja entregar outra instalação militar Patriot dos EUA à Ucrânia. Aparentemente, trata-se de um dos sistemas Patriot que atualmente protegem o sudeste da Polônia, na fronteira com a Ucrânia. O sistema guarda o aeroporto regional de Rzeszów, que se tornou o centro mais importante da ajuda militar ocidental à Ucrânia.
Rússia apresenta condições para negociar a paz
Ao lado de Scholz em Berlim, Zelenski disse que "hoje existe uma nova solução de defesa aérea e não apenas o Patriot" – mas não forneceu detalhes.
Com mais um sistema Patriot da Alemanha e dos EUA, haveria um total de cinco na Ucrânia – dos sete esperados. Além disso, espera-se que os primeiros caças F-16 ocidentais sejam implantados pela Força Aérea Ucraniana neste verão europeu.
Para Zelenski, tão crucial para a sobrevivência do país quanto a defesa antiaérea, a reconstrução da Ucrânia e, em última análise, a primeira "conferência de alto nível sobre a paz na Suíça", é que seu país "não perca a iniciativa". Segundo ele, essa iniciativa não pode ser "dada a qualquer um e nem à Rússia".
Nesta sexta-feira, o presidente russo, Vladimir Putin, falou mais uma vez sobre suas condições para negociar a paz com a Ucrânia:a retirada de tropas de quatro regiões parcialmente ocupadas por Moscou, a desistência, por Kiev, da ascensão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e a extinção de todas as sanções financeiras impostas pelo Ocidente.
Por outro lado, Zelenski tem um plano de paz de dez pontos, que prevê a retirada total de tropas russas do território ucraniano internacionalmente reconhecido – inclusive a península da Crimeia, anexada por Moscou em 2014 –, bem como a criação de um tribunal especial para a investigação de crimes de guerra.
Autor: Frank Hofmann