
Donald Trump voltou para a Casa Branca com um espírito ainda mais combativo. Praticamente todas as semanas, o presidente dos Estados Unidos tem ameaçado tanto aliados quanto rivais com tarifas e outras formas de retaliação. Ele também já falou em mais de uma ocasião sobre o desejo de anexar territórios como a Groenlândia e o Canadá, país vizinho. Mas estas ações, até aqui, parecerem ter mais ajudado do que atrapalhado opositores de Trump.
No Canadá, alvo constante de ataques de Trump, o partido Liberal, de centro-esquerda e atualmente no governo, parecia caminhar para uma derrota acachapante nas eleições desse ano. Entretanto, eles retomaram fôlego nas pesquisas e agora aparecem praticamente empatados com os Conservadores, de oposição.
No México, outro país que está no radar do líder norte-americano, a presidente Claudia Sheinbaum ultrapassou os 80% de aprovação e os índices de figuras como Emmanuel Macron, da França, também melhoraram.
Mas o que explica isso? Usando o Canadá como referência, Denilde Holzhacker, professora de relações internacionais da ESPM, destaca que Trump tem criado um sentimento “anti-EUA” devido a seus posicionamentos duros.
"Isso levou a um sentimento ainda maior de visão contrária aos Estados Unidos. Isso tem um impacto importante, pois são dois países que têm uma interdependência muito grande, as fronteiras sempre foram muito fluidas. Esse novo impulso antiamericano é negativo para os dois países e de certa forma os canadenses estão reagindo a essa percepção de que eles precisam marcar não só as diferenças culturais, mas se posicionar frente à defesa de seu sistema político e econômico”, ressalta a especialista.
Ela afirma que, diante das intervenções dos EUA no mundo, essa sensação pode se espalhar para outros países, o que cria ainda mais instabilidade no ambiente de negócios, uma vez que hoje existem outros países que conseguem suprir demandas.
No caso específico do Canadá, Denilde cita a forma enfática como o ex-primeiro-ministro, Justin Trudeau, lidou com a questão como explicação para a reversão do cenário que seu partido enfrentava.
"Trudeau enfrentou diretamente as ameaças que vão além das questões econômicas e passam pela soberania do país. Isso demonstrou uma força do nacionalismo canadense em que os Liberais conseguiram se posicionar. Por outro lado, o partido Conservador, que era aliado de Trump durante toda a campanha nos EUA, vinha com um discurso que a volta dele seria benéfica para o Canadá, o que coloca um grande desafio: como justificar as ameaças à soberania canadense? Isso enfraqueceu muito a oposição”, frisa ela.
Agora, a tendência é que o novo primeiro-ministro, Mark Carney, siga a mesma linha.
“A estratégia do governo é ser duro, continuar rebatendo as posições americanas, mas mantendo canais de negociação e defendendo setores que eles entendam que são centrais", detalha a professora.
Estratégia para o futuro
Trump tem ameaçado com tarifas, mas já recuou em casos como no do próprio Canadá e do México. Entretanto, Denilde Holzhacker avalia que a tensão deve se manter.
“Do ponto de vista do discurso, o Trump continua enfatizando que o uso das tarifas é essencial na sua estratégia de alavancar a economia americana e atrair investimentos. Ele dificilmente vai retirar esse discurso. O que podemos acompanhar é ele fazer o que já fez: postergar as aplicações para determinados produtos e países em função dos impactos que isso tem gerado internamente nos EUA, tanto na bolsa quanto na confiança das empresas e consumidores”, destaca ela.
Ao mesmo tempo, a professora descreve a estratégia como de “alto risco”.
Ela pode levar ao aumento da desconfiança de parceiros e gerar uma busca de outras soluções. Qual é a lógica do Trump? De que os custos imediatos não irão se sobrepor em médio e longo prazo aos ganhos que ele vai obter com as concessões frente aos seus aliados e inimigos. Isso faz com que ele aceite um aumento dos custos. Isso é um cálculo que vai depender claramente de que os outros parceiros estejam dispostos a pagar nesse primeiro momento.