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“Chão parecia algodão ou chiclete”, diz repatriada após terremoto na Turquia

Grávida, Fernanda Giçi morava em Adıyaman com o marido e o filho de 2 anos. Ela teve a casa completamente destruída

De Ankara, Narley Resende

Moradora da Adiyaman, uma das regiões mais devastadas pelos terremotos que atingiram a Turquia e a Síria, a brasileira Fernanda Lima Giçi viveu os horrores do desastre e perdeu tudo que tinha na semana passada. Ela vivia com o marido Mihdat Giçi e o filho de Yusuf Ercan Limi Gigi, de dois anos, desde 2019 na Região Sudeste de Anatólia, na Turquia.

A família esteve entre os 17 repatriados que foram trazidos ao Brasil pela missão humanitária enviada à Turquia pelo governo brasileiro. 

Fernanda disse que a experiência do terremoto foi a mais terrível de sua vida. Segundo ela, a sensação de um leve tremor sentido sutilmente na noite anterior ao desastre a alertou e isso pode ter salvado a vida de sua família. 

“A família toda estava dormindo e eu permaneci acordada, porque por volta das 20h eu senti um leve tremor, bem sutil e pensei: tem alguma coisa errada”, conta. 

Grávida, Fernanda disse que acordou por volta das 3h da madrugada daquele 6 de fevereiro. 

“Eu senti uma tontura. Achei que pudesse ser por causa da gravidez, mas era muito estranho. Então, escutei a casa dar pequenos estalos e terra caindo do teto. Em Adiyaman é normal o teto ser de terra, são casas antigas. Eu pensei comigo: não vou dormir. Vou me manter acordada, ficar aqui sentada”, decidiu. 

Às 4h17 começou o terremoto de 4,8 graus de magnitude na Escala Richter. 

“A sensação é que vem uma onda primeiro e um barulho ensurdecedor, infernal. Só deu tempo de eu levantar, tirar meu bebê do berço, entregar para o meu marido e gritar ‘corre’. Quando chegamos na porta da casa o terremoto começou mais forte ainda. Eu entreguei a criança para o meu marido e gritei ‘corre e me deixa’. Pelo menos salva meu filho”, se emociona. 

“A casa balançava, o chão balançava, parecia algodão, parecia chiclete. E não tem por onde se segurar. Eu corri desesperada. Os bichos gritando e as casas desmoronaram. Os bichos morreram soterrados. Foi só o tempo de a gente sair de casa”, lamenta. 

Fernanda, Mihdat e Yousuf perderam tudo. A casa deles ficou completamente destruída. Uma semana depois eles souberam que o governo brasileiro enviaria uma missão humanitária com um avião da Força Aérea Brasileira. Fernanda, então, pediu à Embaixada em Ankara que sua família fosse repatriada. 

Repatriados

A brasileira embarcou, com o marido turco e o filho que tem dupla cidadania, no dia 11 de fevereiro, depois de ficar cinco dias em uma jornada para chegar à capital. 

Na manhã do dia 12 de fevereiro, Fernanda e os outros 16 repatriados foram recebidos no Rio de Janeiro por agentes do Ministério das Relações Exteriores e recebeu passagens para que pudesse seguir até a casa de sua mãe em São Paulo. 

Mihdat Giçi, marido de Fernanda, agora procura trabalho no Brasil. Ele perdeu familiares e amigos e tudo que tinha. Nos primeiros dias, Mihdat ajudou nos trabalhos de resgate, na procura por seu primo que ficou soterrado, diante da ausência de socorro do Estado. Ele teve que abandonar as buscas, pois sua esposa estava grávida e precisava aproveitar a chance de retornar ao Brasil para cuidar de seus filhos com mais estrutura. 

O número de mortos após o terremoto de 6 de fevereiro na Turquia e na Síria chegou a 35.225, de acordo com os dados oficiais atualizados nesta segunda-feira (13). 

O primeiro abalo de 7,8 graus de magnitude foi seguidos de mais de duzentos outros, no Sul e Sudeste da Turquia, durante a semana e provocou 31.643 mortes no país. O número é atualizado pela Autoridade de Gestão de Desastres e Emergências (AFAD). 

Na Síria, o grupo de defesa civil Capacetes Brancos registrou 3.581 mortes causadas pelo desastre. As áreas controladas por rebeldes, no noroeste do país, é uma das mais afetadas. A região é controlada pela oposição ao governo do presidente Bashar Al-Assad, o que dificulta a coleta dos dados. O país vive uma guerra civil desde 2011.

A Organização das Nações Unidas (ONU) o principal foco das missões humanitárias neste momento deve ser garantir abrigo e condições básicas aos sobreviventes.

Nesta madrugada, uma mulher foi resgatada após uma semana debaixo dos escombros. Integrantes de missão brasileira enviada a Kahramanmaras afirmam que após 20 dias do desastre que completou uma semana nesta segunda-feira (13) ainda será possível encontrar sobreviventes. 

Dimensão da tragédia

O número de vítimas na Turquia e na Síria já superou as mortes causadas pelo terremoto seguido de tsunami que atingiu a cidade japonesa de Fukushima, em 2011. Os desastres naturais também resultaram em um acidente nuclear na usina da região. Mais de 18 mil pessoas morreram.

Os terremotos na Turquia e na Síria também se tornaram o segundo evento mais letal na região em anos recentes. Ultrapassaram as 17 mil mortes registradas em 1999, quando tremores de 7,4 graus na escala Richter atingiram a região turca de Izmit, próxima à Grécia. A tragédia já é o 7º desastre natural mais mortal deste século.

Pelo menos 6.444 prédios desabaram na Turquia. 

O presidente Recep Tayyip Erdogan admitiu falhas na resposta, mas minimizou sua responsabilidade. “Não é possível estar preparado para um desastre tão grande”, disse em visita à região atingida.

Os tremores de segunda-feira (6) foram os mais fortes registrados na Turquia desde 1939, quando o país teve um abalo sísmico de 7,8 na escala Richter na cidade de Erzincan, também ao Leste do país.  

Desta vez, o epicentro foi na região turca de Gaziantep. No local, os tremores também foram de 7,8 na escala Richter. O segundo maior abalo sísmico no país se deu em Kahramanmaras e alcançou 7,5 de magnitude.  

Os locais ficam na chamada falha de Anatólia. É nesta falha em que há o encontro de três placas tectônicas: da Anatólia, Africana e Arábica. O resultado do movimento ou choque entre essas placas rochosas na crosta terrestre é o terremoto. 

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