Como colocar o Brasil nos trilhos do desenvolvimento, mas com responsabilidade fiscal? Quem responde esta e outras perguntas é o economista Raul Velloso, professor especialista em contas públicas, entrevistado do Canal Livre deste domingo (23).
Logo no primeiro bloco do programa, o economista fez críticas contra “uma política pró-juros altos” do Banco Central, analisou a qualidade da relação dívida/PIB do país e defendeu investimentos públicos em infraestrutura e o fim do teto de gastos.
Contrário aos juros altos
Raul evidencia o descontentamento da política adotada pelo Banco Central (BC) para aumentar os juros na tentativa de conter a inflação. Para o professor, “cientificamente”, tal medida é ineficaz.
“Isso faz um mal danado porque nós temos que pagar uma conta gigantesca, pois o Banco Central sobe os juros, e muitos, como eu acho, sem necessidade. E essa conta de R$ 7 a R$ 8 bilhões é mais do que o governo federal investe em infraestrutura”, disse. Por esse viés, o especialista destaca que o erro da União, estados e municípios está em não equalizar a previdência.
“Os estados e municípios estão sendo induzidos a atacarem o problema fiscal do jeito errado. O jeito que eles estão sendo induzidos a fazerem não é o correto. O correto é fazer o que chamamos de arrumação da parte previdenciária”, analisou o economista.
Relação dívida/PIB
A jornalista Juliana Rosa comentou que, na relação dívida/PIB, não existe um número mágico. Ela apontou o Japão como exemplo por possuir uma dívida/PIB de 300%, ao mesmo tempo em que consegue se financiar com juros zero. Em pergunta ao especialista, destacou-se: a crise do Brasil é de credibilidade ou de tamanho da dívida?
“Nós temos que separar as duas coisas. Uma coisa é a questão macroeconômica, dívida muito alta e inflação. Outra coisa é a qualidade do gasto, que é o que você chamou atenção [fundo eleitoral bilionário, emenda de relator, promessas de aumento de salários]. O que a gente tem que entender é que, seja qual for o tamanho, ela [dívida] tem que ser de qualidade e focada nas pessoas certas”, alertou Raul.
Rediscutir a previdência
Raul Velloso é entusiasta da retomada da discussão da reforma previdenciária, como pontuou o cientista político Fernando Schüler. O economista destaca que a reforma da previdência de 2019 foi uma das melhores que o Brasil já aprovou, mas criticou o fato de que o aumento déficit previdenciário – quando se arrecada menos do que se paga em benefícios.
“A soma de todos os déficits, de todos os entes, especialmente no caso dos estados e municípios, é muito elevada. Se ele [déficit] não for atacado, o orçamento vai se dedicar só a pagar o déficit da previdência, os orçamentos em geral. Aí o espaço para investir desaparece. Se você olhar a curva do investimento de infraestrutura de todos os entes, vai perceber que ela desaba, nos últimos 20, 30 anos. A reforma de regras [2019] é importante, mas pouca para o tamanho do problema”, explicou.
Entenda a reforma da previdência no vídeo abaixo!
Aposta em investimentos públicos
O professor Raul é defensor de investimentos públicos como forma de fazer o país crescer. Segundo ele, “o investimento é o grande pagador da conta”, acrescentando que o Brasil, há mais de 15 anos, cresce entre 0% e 1%.
O economista aproveitou o espaço para alfinetar o ministro Paulo Guedes, já que o chefe do Ministério da Economia quer priorizar investimentos privados em detrimento dos públicos em infraestrutura.
“Isso é mais uma das balelas do ministro da Economia, porque o investimento público, dos anos de 1980 para cá, fez isso [aponta para cima com a mão], enquanto o investimento privado está aqui [estagnado] e não sai de uma linha reta horizontal. O público desaba sete vezes. O Paulo Guedes, em tese, está certo em querer investimento privado – ele sempre fala do investimento privado estrangeiro. O problema é que ele só vem se a economia for receptiva”, pontuou.
Nesse contexto, a partir de 1980, os investimentos privados não compensaram a queda em sete vezes dos investimentos públicos. “Nós temos que começar pela recuperação do público porque depende do governo, que, afinal, deveria ter cabeça para isso. Se arranjou o dinheiro, faça”, disparou.
Fim do teto de gastos
Vale destacar que o entrevistado também defende o fim do teto de gastos públicos, pois o mecanismo, segundo o professor, serve apenas para cortar investimentos. Na contramão, a jornalista Juliana Paiva argumenta que a medida foi importante para sinalizar a credibilidade e redução de juros no país nos últimos anos.
“O teto não trouxe credibilidade nenhum nem fez os investimentos responderem. Houve apenas a venda de uma coisa falsa de que, estabelecido o limite, ele poderia ser cumprido, mas ele só incide num pedaço do gasto, que é 7% do total”, alertou o economista.
Como conquistar a produtividade?
O professor Raul dá uma resposta categórica sobre a conquista da produtividade: aumento de investimentos públicos em infraestrutura. Ainda segundo ele, é necessário ter um sistema tributário coerente ao crescimento da economia, Estado eficiente e que gaste com qualidade, e ter outro programa de país diferente da realidade atual.
O que fazer com a Petrobras?
A Petrobras segue no centro das discussões econômicas do país. Devido à política de paridade internacional, o preço dos combustíveis nacionais segue a variação do dólar. Como promessa de campanha, de um lado, candidatos apostam na privatização, enquanto outros querem o fim da chamada dolarização. Já o entrevistado vê a estatal como uma forma de equalizar a previdência.
“Vamos pegar a Petrobras e capitalizar o fundo de previdência da União, que não existe ainda. Ponham-na lá para ser gerida com parte do aporte de ativos para viabilizar o equacionamento da previdência. Isso vai economizar R$ 80 bilhões. Aí a Petrobras fará um grande negócio para o país”, sugeriu.
Sobre a política de preços do petróleo brasileiro, o professor aponta que o valor interno precisa acompanhar uma tendência de médio e longo prazo do mundo. Em resposta às críticas sobre a alta da gasolina, gás de cozinha, diesel, etc., Raul defende subsídios do governo.
“Se tiver dinheiro e uma inclinação política para apoiar determinado segmento, cabendo no orçamento, faça-se um subsídio, mas não mexa na gestão [da Petrobras]”, disparou.