O agente penitenciário David Moreira mudou a versão de seu primeiro depoimento feito a agentes do Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) e afirmou que, em setembro do ano passado, ele se encontrou com o empresário Vinícius Gritzbach e com Noé Schaun, que é apontado como o executor dos traficantes “Cara Preta” e "Sem Sangue", ligados ao PCC.
Ivelson Salutto, advogado de Gritzbach, negou o encontro e a acusação ao Brasil Urgente e disse que incriminação seria para “lavar dinheiro na mão de terceiros”. Segundo ele, seu cliente apenas intermediou a venda de imóveis ao megratraficante.
“Isso é uma invenção do David agora nessa segunda versão, que é totalmente conflitante da primeira versão dele que ocorreu logo quando ele foi preso. Ele deu uma versão consistente. E agora, após eles estarem na mesma carceragem, porque o David foi transferido agora e, obviamente, tem um convívio, aí mudou a versão. Porque ele esteve em contato com o próprio Pablo [Borges, hacker e empresário também preso]. O Pablo tentou fazer contato com o Vinícius e o Vinícius não quis conversar com ele. Foi minha orientação não falar com o Pablo e nem ninguém, porque está sob investigação”, alegou.
Pablo Borges, o hacker e investidor em criptomoedas que movimentou cifras bilionárias, fez um relato que chamou a atenção da polícia. Foi na casa do próprio Pablo, segundo ele, que Vinicius perguntou sobre David, se estaria de plantão naquela noite. Depois, os dois teriam então se encontrado na garagem da mansão do hacker, passando a conversar reservadamente por cerca de 20 minutos, mas Pablo diz não saber o teor da conversa.
O trio é investigado por suspeita de arquitetar a morte de Anselmo Becheli Santa Fausta, o “Cara Preta”, um dos líderes da facção criminosa PCC, executado junto ao comparsa Antônio Corona Neto, o “Sem Sangue”, no fim de dezembro de 2021, em São Paulo. Eles negam participação nos crimes.
A investigação vê contradições nas versões e deve fazer uma acareação entre os suspeitos presos - se necessário, com os três juntos.
Em depoimento, Pablo confirmou que administrou investimentos em moedas virtuais para Vinícius Gritzbach e ao menos outras três pessoas, totalizando quase R$ 40 milhões. Deste total, ele deve cerca de R$ 6 milhões em bitcoins para Vinícius, mas garantiu que nunca fez negócios com os traficantes assassinados da facção criminosa
As investigações do DHPP e do Deic mostram algo diferente do que foi dito. Vinícius e Pablo teriam lavado até R$ 2 bilhões do dinheiro do PCC do tráfico internacional de drogas através de “Cara Preta” em investimentos como imóveis e criptomoedas.
A polícia suspeita que David, que trabalhou como segurança do empresário e hacker, recebeu R$ 100 mil de empresários para contratar a dupla de assassinos que efetuou os disparos contra Anselmo e seu comparsa.
Vídeo: hacker preso que seria ligado ao PCC movimentou R$ 2 bilhões
Dois investigados foram assassinados no que teria sido uma vingança do PCC, Noé Schaun e, apontado como o executor dos dois traficantes, além de Carlos Almeida, o Django.
Os outros empresários apontados com ligação com as execuções de Cara Preta e “Sem Sangue” e com prisão pedida pela Justiça continuam foragidos. São eles: Robinson Moura, dono de um restaurante no bairro do Tatuapé; Rafael Maeda, investidor em uma empresa de marketing esportivo; e Danilo Lima, o “Tripa”, empresário de jogadores de futebol.
A morte de Cara Preta, no fim de dezembro de 2021, desencadeou uma série de outros crimes em São Paulo e na região metropolitana.
“Cara Preta” estaria envolvido em roubo de aeroporto e tráfico internacional
Investigações sobre o roubo de 770 quilos de ouro no aeroporto de Guarulhos, em 2019, apontam que “Cara Preta” financiou aquela ação. Parte da quadrilha envolvida no roubo milionário foi presa, e alguns integrantes foram até condenados pelo roubo da carga, hoje avaliada em mais de R$ 250 milhões.
De acordo com o Ministério Público, o traficante morto era peça chave da logística do tráfico internacional de drogas e responsável pela rota da cocaína entra a Bolívia, o Brasil e a Europa a partir do Porto de Santos (SP). É o setor mais lucrativo dentro do crime organizado, que deu fortunas a nomes como Gegê do Mangue, André do Rap e Anderson Gordão.
Apesar da posição de destaque no crime organizado, “Cara Preta” foi preso poucas vezes, e sempre por crimes menores. Era considerado pela polícia um alvo difícil, por ser um criminoso discreto.
Vídeo: Chefão do PCC executado teria financiado roubo de ouro em aeroporto
No momento da execução, ele estava em um carro simples, como preferia, justamente pra não chamar a atenção. Mas o motorista do veículo levava nos bolsos e na jaquetas maços com grande quantidade de dinheiro.
Nova onda de mortes de chefões do PCC começou em 2018
As execuções recentes na zona leste podem ser mais um capítulo da guerra de poder dentro do PCC, que passa por uma disputa sangrenta entre criminosos do alto escalão do chamado “partido do crime”.
Santa Fausta se tornou um dos chefões do tráfico na facção depois de execuções de outros líderes na mesma região da capital paulista.
A onda de mortes começou em 2018, depois que “Gegê do Mangue” foi assassinado junto com o sócio “Paca”, na região metropolitana de Fortaleza.
Antes, Eduardo Ferreira foi morto em um carro de luxo com quase 30 tiros. Dias depois, foi a vez de Wagner Ferreira, o “Cabelo Duro”, em outro ponto da zona leste após emboscada diante de um hotel.
Em janeiro, dois homens foram executados, esquartejados e os corpos jogados na zona leste de São Paulo. Com eles, bilhetes indicavam a participação das vítimas nas execuções de Cara Preta e Sem Sangue.