No dia 12 de agosto de 2024, Pedro, jovem bolsista no Colégio Bandeirantes, um dos mais elitistas de São Paulo e com mensalidades que chegam a R$ 4.500 reais, tirou a própria vida. O motivo? Ele sofria bullying por ser pobre, bolsista e gay.
Em entrevista à Revista Piauí, sua mãe expôs mensagens que o próprio filho mandava. "Fizeram chacota de mim por eu ser gay"; "No prédio do elevador, o menino me deu um empurrão e gritou no meu ouvido", disse o jovem para a mãe em uma das mensagens.
Infelizmente, Pedro não foi o único, nem primeiro e nem será o último. Neste ano já tive conhecimento de, pelo menos, outras cinco histórias de jovens tirando a própria vida após sofrer bullying. Há ainda incontáveis casos de jovens que não chegaram a tal extremo, mas que sofreram humilhação, violência física, e pior ainda: tudo isso sendo filmado. Em muitos casos, jovens ao lado riam ou se omitiam.
Fica a pergunta, até quando? Qual o papel das instituições? Qual o papel das famílias? Minha intenção é abordar esse tema nesta coluna e convido você, leitor, para uma discussão saudável sobre a questão.
Histórico do Colégio Bandeirantes
Em 2018, outros dois estudantes do Colégio Bandeirantes também cometeram suicídio. Após o fato, na época, a ação foi a criação da disciplina "convivência positiva", que existe até hoje e que o próprio Pedro cursou.
O que era trabalhado na disciplina? "Eu presenciei uma aula em que dois professores simularam uma briga para perguntar aos alunos quem estava certo ou errado. No entendimento da psicologia positiva, escolhemos ensinar pelo exemplo, não pelo teatro de uma briga", disse uma professora da escola à Piauí.
Depois do caso do Pedro, qual foi a ação? Um dos membros do conselho afirmou que o sistema de bolsas precisava ser repensado, ou seja, possivelmente extinguido ou significativamente limitado.
Papel das instituições de ensino
Todo o contexto nos provoca para pensar sobre qual a solução e sobre como trabalhar esses casos. Aqui é muito importante destacar que, infelizmente, não é uma problemática simples. Digo infelizmente, porque seria muito mais fácil se fosse um problema simples ou de um culpado apenas.
Tenho pouquíssima bagagem com a rede privada. Toda minha bagagem vem de escolas públicas e já visitei colégios públicos de ensino médio de 11 estados do país. Sou muito observador e já pude ver alguns coordenadores e professores em ação.
Uma vez, em um colégio de Salvador, havia uma estudante que aparentemente se cortava e a coordenadora – muito bacana, diga-se de passagem – foi tentar conversar com ela. A conversa era pautada em alguns clichês como, por exemplo, falar sobre Deus ou sobre a importância da vida.
Outra vez, em um colégio do interior de São Paulo, fui com uma amiga da psicologia, na época ainda estudante, e a coordenadora ficou genuinamente aliviada com a presença da minha amiga. Convidou ela para "conversar" com alguns alunos que se mutilavam.
Tenho muitos casos, mas acho que já ilustrei meu ponto. Há um grande problema: a falta de preparo dos profissionais dos colégios tanto para identificar casos de bullying e intenções de suicídio como também para conseguir abordar esses casos.
Antes que alguém fale, já irei registrar aqui: há, óbvio, profissionais negligentes, como em qualquer instituição do mundo. No entanto, na maioria dos casos, não se trata de negligência, mas sim da própria correria do dia a dia, oriunda de um excesso de funções e responsabilidades alinhada, sobretudo, à falta de preparo.
É urgente que haja uma política pública para capacitar os profissionais da educação, de colégios públicos e de privados. Essa capacitação deve ser voltada à identificação de casos e como lidar com eles. Não me refiro aqui a um curso on-line com uma micro-apostila, mas sim a uma formação sólida, de qualidade e, digo mais, criada especialmente para esse recorte.
Paralelo a isso, é preciso que efetivamente haja pelo menos um psicólogo em cada escola – não para clinicar, mas sim para ajudar na identificação e encaminhamento.
E as famílias?
Temo que mesmo com essa capacitação e presença de psicológico, o bullying não estará extinto. Há um importante agente para trazer aqui para o debate: as famílias.
Na minha visão, há um grande desafio. Como trabalhar com as famílias? O que as escolas podem fazer? O que o governo pode fazer? Já adianto que não tenho uma resposta perfeita e sólida para essas perguntas. Justamente por isso esta última seção será pautada em provocações.
É sabido que os praticantes de bullying, muitas vezes, se tornaram assim graças às próprias famílias, que endossam esse comportamento, sendo preconceituosos, ou que praticam bullying em casa, fazendo com que essas vítimas se tornem agressores nos colégios.
Como trabalhar isso? Uma política pedagógica dos colégios voltada para os pais pode ser um caminho. No entanto, temo que quem mais precise para rever as próprias atitudes talvez nem participaria ou participaria de coração fechado. Afinal, é comum que os mais velhos chamem os jovens que sofrem bullying de "mimizentos", fracos, e afirmem que na época deles era pior, mas que ninguém se importava.
O que fazer? Será que há margem para trabalhar com todas as famílias que corroboram com o bullying? Temo que não, simplesmente porque boa parte delas já tem isso enraizado. Mesmo assim essa política de aproximação é válida e com certeza faria uma diferença. No mínimo, pelo menos, é um começo.
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Se você enfrenta problemas emocionais e tem pensamentos suicidas, não deixe de procurar ajuda profissional. Você pode buscar ajuda neste site: https://www.befrienders.org/portugese
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Vozes da Educação é uma coluna semanal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do Salvaguarda no Instagram em @salvaguarda1.
Este texto foi escrito por Vinícius De Andrade e reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.
Autor: Vinícius De Andrade