"Pesquisa, ensino e extensão". Esse é o tripé que solidifica a base das nossas universidades públicas. Não vejo necessariamente um problema em algum desses três pilares, mas acredito que vale a provocação sobre a assimetria nas dosagens e consequentemente sobre a diferença na valorização de cada um deles.
O que quero dizer com isso? Bom, tive a oportunidade de fazer minha graduação em economia na USP, uma das melhores universidades do Brasil e do mundo. Desde o início da minha graduação, me descobri completamente apaixonado pela extensão.
Não quero parecer arrogante, mas fazendo o bom e velho "colocar a mão na massa", eu tive o privilégio de complementar minha formação e aprender coisas que meus colegas não tiveram a oportunidade de aprender nas salas de aula.
Tive alguns professores que me admiravam e valorizavam o meu trabalho prático fora dos muros da universidade. No entanto, infelizmente, da maioria dos outros eu sentia um ar de subestimação. Como se tudo o que ocorresse fora dos pilares "pesquisa" e "ensino" simplesmente não fosse relevante, louvável e admirável.
Consegui resistir e tive muita dificuldade para encontrar o equilíbrio entre o mundo puramente acadêmico e o universo prático de extensão. O resultado foi várias reprovações nas disciplinas e, em alguns momentos, um sentimento de que eu simplesmente não merecia estar ali ocupando minha vaga e de que aquilo não era para mim. Tinha momentos em que eu tentava me encaixar completamente, mas para isso eu precisaria deixar de ser quem eu sou.
Hoje, felizmente, acredito que encontrei o equilíbrio. Entendo que não devemos subestimar a teoria. A fundamentação formal e teórica, embora para alguns possa parecer chata e trivial, é incrivelmente importante. No entanto, também não podemos subestimar a extensão e o poder do "colocar a mão na massa".
Desperdício de talentos
Para além da minha experiência pessoal, confesso que não consigo não me preocupar com a quantidade de talentos que o modelo universitário atual pode perder. Me pego constantemente pensando no quanto de universitários podem estar neste exato momento se sentindo deslocados e acreditando que a universidade não é para eles simplesmente por terem latente dentro de si a curiosidade, a vontade – talvez até mesmo a necessidade – de continuar sua formação fora da sala de aula.
O leitor mais crítico pode estar agora pensando: "Ah, isso é besteira. Se quiser, basta fazer. Existem muitas oportunidades e projetos de extensão". Sim. Seu pensamento não está errado, mas falta pensar além.
O problema aqui é que a extensão é muitas vezes esmagada pelos outros dois pilares. No geral, ela simplesmente não é valorizada da mesma forma que a pesquisa e o ensino. Acredito que uma das razões é que o corpo docente é quase exclusivamente composto por pesquisadores. Estes, agentes que dedicaram suas vidas à pesquisa. Esta, por sua vez, não costuma ser muito associada à prática e ao "colocar a mão na massa". Muitas vezes me pego pensando no quanto nossas universidades têm o potencial de fazer pelas comunidades das cidades em que seus campi estão localizados. Não estou dizendo que não fazem nada, mas noto um imenso potencial ocioso e pautado totalmente pela desvalorização da extensão.
Dado esse cenário, nasce um outro problema: a dificuldade na conciliação, e aqui eu escrevo lembrando do meu próprio caso. Nada do que eu fazia fora dos muros era oficialmente contabilizado para a minha formação acadêmica. Portanto, por preferir a extensão, eu naturalmente ia mal nas disciplinas, estas excessivamente acadêmicas, e me sentia muito triste e incapaz. O fato de eu me sentir deslocado e incapaz tinha ainda o efeito de, em algum nível, me afastar ainda mais das disciplinas nas salas de aula.
Penso que há vários perfis de discentes. Há sim, inclusive amigos próximos, aqueles que amam o modelo de aprender apenas com aulas teóricas, ler e escrever artigos e participar de palestras e congressos. No entanto, há outros que simplesmente não são assim.
Por exemplo: há um estudante de medicina que irá adorar a oportunidade de participar de uma palestra sobre a saúde pública nas comunidades da periferia. No entanto, há também outro que trocaria, sem pensar duas vezes, a palestra pela oportunidade de visitar comunidades reais e participar ou ajudar a criar um projeto junto ao povo.
Qual deles é melhor? Qual estará aprendendo mais? Qual deles é um aluno nível das nossas melhores universidades públicas?
Penso que a discussão que essas perguntas provocam não nos levam para um diálogo inteligente ou estratégico. Na verdade, elas devem ser substituídas por:
Como fazer esses dois alunos se sentirem representados na universidade? Como fazer ambos terem espaço, recursos e se sentirem valorizados o bastante para evoluírem e contribuírem tanto com a academia quanto com a sociedade?
E a pergunta principal: Como a universidade pode promover uma real integração entre esses dois perfis?
Sei que não há uma resposta simples para isso. Dado que, basicamente, estamos falando de modificações em um modelo que existe há décadas. Além disso, sendo realista, muitos não apenas não estão abertos ao diálogo como também irão, com unhas e dentes, defender o modelo atual.
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Vozes da Educação é uma coluna quinzenal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do programa no Instagram em @salvaguarda1
O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.
Autor: Vinícius De Andrade