Após muitas idas e vindas e quase um mês de negociações, a coalizão de governo alemã anunciou nesta quarta-feira (13/12) um acordo sobre o Orçamento para 2024.
Espera-se que os ajustes ponham fim a uma crise entre sociais-democratas, verdes e liberais, deflagrada após o Tribunal Constitucional da Alemanha vetar o remanejamento de créditos extraordinários da pandemia e implodir o planejamento original da aliança de governo, expondo diferenças internas e forçando a chancelaria em Berlim a rever suas prioridades e cortar despesas.
Fundo climático sofre desfalque de 12 bilhões de euros
Os detalhes do acordo foram apresentados pelo chanceler Olaf Scholz (SPD) e seus ministros da Economia, Robert Habeck (Verdes), e das Finanças, Christian Lindner (FDP).
Segundo Scholz, o freio da dívida será mantido em 2024. "O governo está se atendo a suas metas", declarou, para em seguida anunciar cortes no Orçamento sob a justificativa de cumprir a decisão da Suprema Corte.
O fundo climático, continuou o chanceler, continuará a ser um instrumento essencial para a transição verde da economia alemã – mas terá 12 bilhões de euros a menos (R$ 64,1 bilhões) em 2024.
O que isso significará na prática foi abordado por Habeck, que anunciou o fim dos subsídios à expansão de energia solar, mudanças no financiamento da renovação da rede nacional de trilhos e a antecipação do fim dos incentivos fiscais à compra de carros elétricos – ele não mencionou uma data específica para este último ponto.
Já Lindner anunciou planos de privatização envolvendo a Deutsche Bahn, empresa pública que opera a rede nacional de trens e que deve se desfazer de uma de suas subsidiárias, a Schenker.
Por outro lado, Lindner afirmou que os cortes também atingirão setores altamente poluentes, que perderão 3 bilhões de euros em subsídios (R$ 16 bilhões), o que deverá provocar um aumento nos preços de combustíveis e de energia.
Rombo no orçamento
Em 15 de novembro, a Suprema Corte decidiu que o governo de coalizão não podia remanejar créditos no valor 60 bilhões de euros (R$ 320,8 bilhões) contraídos por causa da pandemia, mas não utilizados, para bancar um fundo climático, classificando o ato como inconstitucional.
O julgamento limitou o espaço de manobra contábil do governo, que contava com esses créditos especiais para ampliar seu caixa e contornar o teto constitucional de endividamento, que limita o déficit público anual a 0,35% do produto interno bruto (PIB).
Julgamento deflagrou crise na coalizão de governo
A decisão do Judiciário causou tensão em uma coalizão de governo já dividida entre partidos com prioridades distintas e, às vezes, conflitantes.
Até então, SPD, Verdes e FDP vinham discordando sobre como resolver o problema do Orçamento: enquanto os dois primeiros propuseram aumentar impostos, os liberais, que são mais próximos do empresariado, descartaram a sugestão de cara, levando à mesa, em troca, o corte de benefícios sociais – algo, por sua vez, impensável para SPD e Verdes.
Diante do impasse, SPD e Verdes propuseram suspender o teto da dívida mais uma vez em 2024 para contrair novos empréstimos e aumentar o caixa do governo. A sugestão também desagradava ao FDP.
Como o acordo afeta a Ucrânia
O trio prometeu manter o apoio alemão à Ucrânia contra a Rússia.
De acordo com Lindner, Berlim enviará 8 bilhões de euros (R$ 42,8 bilhões) em 2024 em assistência direta ao país debilitado pela guerra. "Continuaremos a arcar com essa responsabilidade", declarou o ministro das Finanças.
Caso o conflito piore, Scholz disse que a Alemanha "terá que reagir" – isso seria o caso, por exemplo, se a Alemanha ou a Europa se virem mais ameaçadas, mas também se outros aliados de Kiev passarem a enviar menos dinheiro ao país.
Corrida contra o tempo
O acordo ainda tem que ser ratificado oficialmente pelo gabinete de governo antes de ir a votação no parlamento federal.
O Orçamento não deve ser aprovado antes do final do ano pelo Bundestag, a câmara baixa do Legislativo.
Neste cenário, o governo começaria o ano de 2024 com um caixa provisório. Isso significa que apenas gastos do governo como benefícios sociais, salários e pensões continuarão a ser pagos regularmente; outras despesas, como os subsídios ao empresariado, serão congelados.
Um cenário desses elevaria o passe de Lindner dentro do governo, já que caberá a ele, na qualidade de chefe do Tesouro, a decisão sobre aprovar ou não cada novo gasto.
ra (Reuters, AFP, dpa, AP, ots)