Ala jovem da AfD impulsiona radicalização do partido

Juventude partidária virou importante berço de quadros e ideias da ultradireitista Alternativa para a Alemanha. Jovens sonham com um país sem muçulmanos nem migrantes, e convocam à coesão interna diante das críticas.

Por Deutsche Welle

Anna Leisten é jovem, alegre... e radical – pelo menos nas muitas fotos de sua conta no Instagram, onde se apresenta como alguém que passou de "gracinha de cabelos trançados" a "soldada de ferro". Ela é um dos rostos conhecidos da Alternativa Jovem (JA), a juventude partidária do ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD).

Entre as inofensivas fotos, a natural de Brandemburgo e copresidente da JA, de 23 anos, insere suas mensagens políticas. Como a "saudação do white power" da direita radical e dos meios neonazistas, que Brenton Tarrant, o autor do atentado de 2019 à mesquita de Christchurch, na Nova Zelândia, ostentou no tribunal.

Em uma das postagens, Leisten olha com admiração para Götz Kubitschek, um dos mais importantes extremistas de direita alemães, que sonha com uma "revolução conservadora" antidemocrática. Em outra, com um olhar que denota exaustão, ela é vista se arrastando entre a lama e o arame farpado, com a legenda: "Campo de treinamento Front Leste 2025". A Alternativa Jovem sonha protagonizar uma guerra.

Ala jovem como motor central da radicalização da AfD

Leisten encarna perfeitamente os ideais de sua organização, que exige uma mudança sistêmica radical na Alemanha em que, dentro do possível, todos aqueles classificados como "etnicamente alienígenas" devem ser excluídos. É por isso que, numa decisão de 5 de fevereiro de 2024, o Tribunal Administrativo de Colônia julgou que: "Nessa questão, trata-se de uma aspiração seguramente extremista da Jovem Alternativa."

O conceito étnico de povo da JA infringe o Artigo 1º da Lei Fundamental alemã: "A dignidade humana é inviolável". Além disso, o grupo faz campanha contra muçulmanos, requerentes de asilo e migrantes: "Imigrantes são designados, em geral, como parasitas e criminosos, ou degradados de outro modo", constata o tribunal.

Anna-Sophie Heinze, da Universidade de Trier, é autora de um estudo abrangente sobre a JA. Ela explica que, ao longo dos anos, as ligações entre o partido e seu braço jovem se tornaram cada vez mais estreitas. "No geral, a Alternativa Jovem é um importante celeiro de quadros e de ideias para a AfD. A juventude não só mobiliza para a legenda durante as campanhas eleitorais, como também mostra uma presença midiática forte", ao ponto de ser "o motor central de uma radicalização da AfD".

Atualmente, diversos membros e adeptos da JA representam a AfD nos parlamentos do país. Um deles é o deputado no Bundestag (câmara baixa do parlamento federal) Matthias Helferich, natural de Dortmund, na zona industrial do Vale do Ruhr.

Em chats privados ele já se definiu como "o rosto simpático do nacional-socialismo" – ou seja, do partido que, sob seu autodenominado "Führer" Adolf Hitler, organizou o assassinato de milhões de judeus europeus. Nos eventos da Alternativa Jovem, Helferich é celebrado como "futuro ministro da remigração", o homem destinado a organizar a deportação em massa de pessoas tidas como indesejadas.

Perigo de expor lacunas na democracia resiliente

A AfDnão vive seu melhor momento: reportagens sobre os planos de deportação dos ultradireitistas desencadearam uma onda de protestos ímpar, com a participação de centenas de milhares de cidadãos.

No entanto, isso não bastou para moderar extremistas como o porta-voz da JA, Hannes Gnauck – pelo contrário. Também deputado da AfD no Bundestag, ele é primeiro-sargento da Bundeswehr, as Forças Armadas alemãs, mas foi dispensado do Serviço de Contrainteligência Militar por falta de lealdade à Constituição

"A luta contra a direita é só um pretexto: na verdade, trata-se de uma luta contra nós, contra o povo alemão", declarou, no fim de janeiro, em um vídeo postado no canal da Alternativa Jovem no YouTube. À reprovação pública das forças radicais da JA e da AfD, ele reagiu pedindo coesão: "Devemos desenvolver uma mentalidade onde a gente diz que um ataque a cada um que lute pela causa é um ataque contra todos nós."

A coesão parece funcionar bem: radicais como Anna Leisten até foram advertidos por suas "saudações de white power" neonazistas, mas sem maiores consequências, até agora. E diversos líderes do partido se solidarizam com a ala juvenil – um sinal da radicalização da legenda como um todo.

A avaliação jurídica de que a Alternativa Jovem é "com certeza extremista" deu novo fôlego ao debate sobre uma proibição. Implementá-la seria relativamente fácil, já que, apesar de ser parte da AfD, a JA é apenas uma associação. Portanto, bastaria uma portaria do Ministério do Interior para proibi-la – enquanto para um partido é necessária uma decisão judicial.

Para diversos juristas alemães, valeria a pena considerar um processo de proibição, mas há ressalvas. A especialista em direito constitucional Kathrin Groh observa, num artigo para o conceituado blog jurídico Verfassungsblog: "Como tiro de advertência para a AfD, faz muito sentido concentrar-se inicialmente em sua organização juvenil e proibi-la enquanto associação."

No entanto o prejuízo para a legenda-matriz seria tão grande, que esta poderia recorrer da decisão, e com perspectivas bastante boas de sucesso: "Se a proibição fracassa [...], não só se serve à narrativa de vítima da AfD, como fica exposta uma lacuna sensível no instrumentário da democracia resiliente", explica Groh.

Autor: Hans Pfeifer

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