A disputa entre Reino Unido e Grécia pelas esculturas do Partenon

Britânicos alegam ter adquirido legalmente os artefatos, enquanto gregos dizem ter sido roubados. Nova tentativa de Atenas de reaver os objetos provocou cancelamento de reunião entre os premiês dos dois países.

Por Deutsche Welle

No início do ano, vários órgãos de imprensa relataram que havia chance de um acordo para a restituição dos antigos frisos da Acrópole para a Grécia, e em janeiro o Museu Britânico em Londres confirmou que mantinha conversas com Atenas sobre um possível empréstimo. Mas, pouco depois, o governo britânico negou essa possibilidade e rejeitou um retorno das peças ao seu país de origem.

O cancelamento de uma reunião entre o primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, e seu homólogo grego, Kyriakos Mitsotakis, que seria realizada nesta terça-feira (28/11) em Londres, enviou um claro sinal do recrudescimento da disputa Londres e Atenas em torno da questão. Já se fala inclusive em um escândalo diplomático.

O porta-voz do gabinete britânico, Mark Haper, justificou o cancelamento afirmando que o posicionamento britânico sobre o tema não poderia ser alterado. Os chamados mármores de Elgin devem permanecer como parte da coleção do Museu Britânico, afirmou.

Mitsotakis demonstrou irritação com o cancelamento da reunião e disse ter ficado indignado. "As posições da Grécia sobre a questão das esculturas do Partenon são bem conhecidas", afirmou. "Esperava ter a oportunidade de discuti-las com meu colega britânico ao lado dos grandes desafios internacionais: Gaza, Ucrânia, crise climática, migração." Mitsotakis recusou uma reunião alternativa com o vice de Sunak, Oliver Dowden.

Grécia quer reaver os mármores de Elgin

No domingo, antes do cancelamento do encontro pelos britânicos, o líder grego anunciou que iria insistir no retorno dos frisos do Partenon junto a Londres. "Eles estarão melhores no Museu da Acrópole, uma instalação de última geração construída para esse propósito", afirmou o grego à emissora britânica BBC.

Mitsotakis polemizou ao dizer que compartilhar esse tesouro artístico em mais de um local ao mesmo tempo seria como cortar a Mona Lisa – o quadro mundialmente famoso de Leonardo da Vinci – em duas metades e exibi-las ao mesmo tempo no Museu do Louvre, em Paris, e no Museu Britânico, em Londres.

Ao mesmo tempo, ele assegurou que Atenas tem interesse em uma parceria com o Museu Britânico. O presidente da instituição, George Osborne, falou recentemente sobre um empréstimo para a Grécia, mas com garantias de que os mármores de Elgin fossem devolvidos a Londres. Para Sunak, no entanto, até mesmo um empréstimo estaria fora de questão, como deixou claro seu porta-voz.

Há, porém, alguns sinais de mudança no clima em torno da disputa. Nesta terça-feira (28/11), o conservador jornal britânico The Times, que anteriormente apoiava a posição do governo, defendeu a devolução das peças. "O lugar das esculturas é em Atenas" disse a publicação em editorial, considerando que elas são parte fundamental da identidade cultural grega.

Vaticano devolve esculturas ao Partenon

Em março de 2023, o Vaticano devolveu à Grécia alguns fragmentos dos frisos do Partenon. O friso adornava a parte superior da parede externa do templo Partenon, que tem 2,5 mil anos, na Acrópole em Atenas.

A obra mostrava figuras e oferendas à deusa Atena durante uma procissão no maior festival da antiga Atenas. Atualmente, um pedaço do friso está no Museu da Acrópole, mas a maior parte se encontra no Museu Britânico em Londres. Outras partes estão espalhadas por museus franceses, alemães, italianos e austríacos.

No Reino Unido, acredita-se que as 56 peças do friso de 75 metros de comprimento do Partenon que se encontram em Londres foram adquiridas por meios legais. A Grécia, por sua vez, alega que elas foram roubadas. O impasse entre gregos e britânicos em torno dos frisos já ocorre há um bom tempo.

No Reino Unido, as peças receberam o nome de mármores de Elgin em referência ao Lorde Elgin, embaixador britânico na antiga Constantinopla, no Império Otomano. Foi ele quem ordenou que as peças fossem extraídas da parte externa do templo Partenon na Acrópole em Atenas no início do século 19. Elas foram trazidas para o Reino Unido em acordo com o Império Otomano, que dominava a Grécia.

Promessa de campanha

O retorno das esculturas se tornou um tema eleitoral no começo do ano na Grécia. Mitsotakis, que foi nomeado primeiro-ministro em junho de 2023, fez da recuperação dos frisos uma parte de sua estratégia de campanha.

Recentemente, o primeiro-ministro falou em "avanços" nas conversas e em um "senso de dinamismo", enquanto o Museu Britânico sequer admitia que as discussões estivessem ocorrendo.

O Reino Unido insiste que adquiriu legalmente as esculturas. "Essa questão está no centro do debate em torno da restituição", afirmou Alexander Herman, vice-diretor do Instituto de Artes e Direito e autor do livro Restitution: The Return of Cultural Artefacts ("Restituição: o retorno dos artefatos culturais", em tradução livre) de 2021.

"Por mais de 200 anos, o tema tem estado na agenda cultural do Reino Unido e, é claro, na da Grécia", disse Herman à DW em uma entrevista em 2021.

Entraves legais para a restituição

Ao contrário do que ocorre no Reino Unido, o debate em torno das restituições de obras de arte ganhou ímpeto em muitos países europeus e até nos Estados Unidos. O Museu Britânico recusou todos os pedidos de restituição até o momento. Enquanto isso, a Alemanha aceitou devolver os chamados Bronzes de Benin à Nigéria. Na França, a restituição de objetos adquiridos durante o período colonial também se tornou um dos principais temas da política cultural do país.

Mas, mesmo que os britânicos quisessem devolver os frisos à Grécia, uma lei nacional teria de ser derrubada. A Lei do Museu Britânico de 1963 proíbe que a instituição devolva objetos de suas coleções, uma vez que os bens são considerados patrimônios nacionais. Dessa forma, os frisos do Partenon poderiam apenas ser emprestados à Grécia, o que para Atenas não seria suficiente.

Um porta-voz do premiê Sunak já declarou que não há planos de mudar a lei. "Nosso posicionamento sobre essa questão não mudou", afirmou em dezembro de 2022. "Decisões em torno dos cuidados e gerenciamento das coleções são da competência do museu e de seus administradores. As esculturas do Partenon são legalmente propriedades dos administradores e são operacionalmente independentes do governo", afirmou.

O cancelamento da reunião entre os líderes do Reino Unido e da Grécia é uma demonstração clara de que os britânicos não mudaram um centímetro sequer em seu posicionamento.

Autor: Sabine Oelze, Sarah Hucal

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