No Estado de São Paulo, 31 cidades gastaram mais com as Câmaras Municipais do que arrecadaram em todo o ano passado. O ponto comum é que são municípios pequenos, com população inferior a 6 mil habitantes.
A menor cidade do estado, Borá, que fica na região de Marília e tem apenas 838 moradores, é justamente a que lidera o ranking. Em 2020, as receitas do município somaram R$ 532.524, e os gastos do legislativo superaram os R$ 720.000.
Borá tem 9 vereadores, que é o mínimo possível por lei, e feitas as contas vê-se que cada um representou em gastos R$ 859 para cada habitante da cidade. Para que se tenha ideia do que isso significa, em Guarulhos, a segunda cidade mais populosa do Estado, a média ficou em R$ 75 nos mesmos 12 meses do ano passado.
O presidente da Câmara Municipal de Borá, João Nespoli, justifica as despesas: “Os gastos da Câmara não são abusivos, muito pelo contrário, a gente procura gastar somente o necessário, como, por exemplo, a Câmara possui três funcionários e nove vereadores, o número mínimo estabelecido pela legislação”. Os vereadores se reúnem duas vezes por mês.
Os gastos das Câmaras Municipais bancam, além do salário dos vereadores e funcionários, despesas com transporte, alimentação, água e luz, por exemplo.
Até o ano de 1996, os próprios Estados podiam criar munícipios mas, com uma mudança na lei, a competência passou a ser do Executivo e Legislativo federais. Enquanto as regras eram mais flexíveis, muitas cidades foram criadas, colaborando e muito para que o país alcançasse a marca de 5.570 municípios.
Por isso, existem tantas pequenas cidades que não conseguem se sustentar, explica o economista Raul Velloso, especializado em contas públicas. “Existe a vontade de lideranças políticas locais de se beneficiarem financeiramente”, diz ele.
Ainda no caso de Borá, o total de 9 vereadores para 838 habitantes equivale a mais de 1% da população – é como se a cidade de São Paulo tivesse, proporcionalmente, mais de 120 mil vereadores.
O cientista político Fernando Schüler afirma que a multiplicação de pequenos municípios que não têm condições de sustentabilidade própria drena recursos da sociedade para bancar estruturas administrativas. Para ele, depois que um município é criado fica muito difícil voltar atrás: "Você cria uma elite política, você tem os vereadores, você tem o prefeito, você tem conexão com os deputados estaduais e federais da região, e a própria comunidade organizada se habituou a ter aquele suporte de uma prefeitura local".
O assunto vem sendo discutido no Congresso Nacional no âmbito do Pacto Federativo, que pode redefinir as regras para a existência das cidades. Hoje, um terço dos municípios brasileiros não arrecada o suficiente para sequer pagar as despesas administrativas.