A pressa e a inexperiência no trânsito estão colocando em risco a vida de milhares de motoboys pelo Brasil. Veja na segunda parte da série especial de Yan Boechat para o Jornal da Band:
Os números mostram que essa tem sido uma combinação falta. Segundo dados do DPVAT, só em São Paulo, as indenizações por morte cresceram 20% durante o período da pandemia de coronavírus no País.
Em um mercado cada vez mais competitivo, a inexperiência cobra um preço alto.
“Eu arrisco dizer que 70% dos motoqueiros que começaram pós-pandemia não têm experiência nenhuma no dia a dia da cidade”, diz Douglas Melo, de 36 anos, que faz parte de um grupo de entregadores que reivindica valores maiores pelas corridas.
Segundo com a União dos Motoboys de Rua, a pandemia aumentou a oferta de mão de obra barata e, com isso, caiu o valor pago pelas entregas. “Até o final do ano passado eu trabalhava três horas tirando o mesmo valor que hoje eu tenho que trabalhar das 11h até às 20h; é uma diferença enorme”, conta Fábio Ribeiro.
Juliana Inhaz, economista do Insper, explica esse fenômeno. “O que temos hoje é muita gente disponível para esse mercado. Quando esse trabalhador perde a renda, perde seu posto de trabalho e, no geral, ele tem uma qualificação que não o coloca em uma vantagem competitiva, ele acaba precisando se enquadrar e fica muito disponível dentro do mercado".
Foi o que aconteceu com o instrutor físico Henrique Rodrigues. Pouco depois de perder o emprego no meio da pandemia, ele encontrou na moto uma saída. Mesmo sem nenhum treinamento, decidiu encarar as ruas. “Eu tive que me submeter. Eu já andava de moto, mas nunca tinha feito entrega. O tempo é essencial. As vezes caem dois pedidos juntos, você tem que ir em dois lugares diferentes para retirar o pedido; se você não for rápido, você perde um [dos pedidos]”, detalha.
Horários de pico, promoções e acidentes
Esse outro ponto também contribui com o aumento de acidentes. Como a maior parte das entregas é concentrada em horários específicos, como almoço e jantar, há uma pressão coletiva dos aplicativos, dos restaurantes e dos entregadores.
Nas ruas, essa competição desenfreada faz com que entregadores assumam riscos para conseguir mais renda. Leandro Mendes confessa que muitas vezes acelera mais do que deveria. "Se você faz cinco entregas em uma hora, você ganha um bônus. Aparece uma promoção eu vou aproveitar. Várias vezes já parei e pensei ‘nossa, olha o que eu estou fazendo por dez reais”.
Proteção de trabalho
O economista Pedro Nery, que é consultor do Senado, concorda que algum tipo de proteção para esses trabalhadores precisa existir, mas teme que esse processo possa piorar ainda mais a situação econômica dos mais vulneráveis." Tem que tomar cuidado para não criar arcabouços jurídicos que acabem excluindo boa parte da população. A desigualdade é tanta que o que é precarizado para mim pode ser uma oportunidade para o outro”, pontua
Nery chama atenção que há uma fila de espera grande de futuros entregadores querendo entrar nesses aplicativos. “Embora parte da sociedade acha que esse trabalho é precarizado, muita gente quer estar nessa condição, principalmente os mais jovens”.
As empresas de entrega afirmam que têm trabalhado para melhorar a segurança dos motociclistas, adotando protocolos, além de oferecer seguro de vida e contra acidentes.
Na reportagem desta sexta-feira, 4, você vai conhecer a dura rotina dos entregadores que passam o dia sobre duas rodas nas ruas da maior cidade do Brasil.