100 dias de governo: Lula focou no social, economia e boa relação com Congresso

Primeiros 100 dias do governo Lula também foram marcados pela diplomacia internacional e enfrentamento da crise produzida pelos atos criminosos em 8 de janeiro, em Brasília

Por Édrian Santos

Completam-se os primeiros 100 dias do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como presidente do Brasil. Como falava desde a transição, o dia 1 de governo já foi iniciado com trabalho, pois 52 decretos e quatro medidas provisórias (MP) foram assinados na cerimônia de posse.

Estes 100 dias de governo, completados nesta segunda-feira (9), são marcados, entre outras coisas, pela manutenção e retomada de programas sociais, anúncios econômicos, a exemplo do novo arcabouço fiscal, recolocação do Brasil na diplomacia internacional. A Band listou os feitos do atual comando do Executivo desde o dia 1º de janeiro.

Programas sociais

Entre os feitos dos primeiros 100 dias, o destaque vai para a MP que garante o pagamento de R$ 600 para mais de 21 milhões de famílias beneficiárias do Bolsa Família, já que os R$ 200 a mais que elas recebiam só seriam pagos até dezembro de 2022. Neste ano, o Orçamento da União previa apenas R$ 405.

Na prática, a liberação pela Câmara e Senado dos recursos necessários para o Bolsa Família de R$ 600 mostrou que o Planalto, apesar da forte oposição, tende a ter fôlego no diálogo com parlamentares. Os testes da base no Congresso ainda serão feitos com votações da área econômica nos meses de abril e maio.

Outra demanda social bastante defendida por Lula é o “Minha Casa, Minha Vida”, programa habitacional que mudou de nome no governo de Jair Bolsonaro (PL). Até o ano passado, era chamado de “Casa Verde e Amarela”. A iniciativa, alvo de queda grande de orçamento nos últimos anos, deverá ser revalorizada.

Agora, o “Minha Casa, Minha Vida” passará a atender as famílias com renda bruta de até R$ 2.640 por mês. O governo quer entregar 2 milhões de moradias até 2026.

O programa “Mais Médicos”, criado em 2013 e duramente criticado, sobretudo, pela vinda de médicos cubanos, foi relançado. A nova versão priorizará médicos brasileiros formados no Brasil, seguidos de médicos brasileiros formados no exterior e de estrangeiros, caso as 15 mil vagas para este ano não sejam preenchidas por nacionais. O próprio Lula reforçou isso no discurso de lançamento.

Diversidade nos ministérios

Os 100 dias de governo também foram marcados pela posse dos ministros, com destaque para Fernando Haddad (PT), na Fazenda, Simone Tebet (MDB), no Planejamento, e Geraldo Alckmin (PSB), na Indústria, Comércio e Serviços. Os três lideram pastas que compõem a área econômica do governo. Vale lembrar que os nomes foram anunciados ainda no período de transição.

O Ministério da Justiça e Segurança Pública foi outra pasta cuja posse foi bastante aguardada. O senador Flávio Dino (PSB), também ex-juiz federal e ex-governador do Maranhão, assumiu o posto com a promessa de desaparelhar órgãos estratégico, a exemplo da Polícia Federal (PF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF).

De forma geral, os 37 ministérios de Lula foram marcados pela diversidade de gênero e racial. Como exemplo, o Brasil passa a ter um Ministério dos Povos Indígenas, chefiado pela maranhense Sônia Guajajara (Psol), e da Igualdade Racial, comandado por Anielle Franco, irmã da vereadora Marielle Franco (Psol), executada em março de 2018.

Boa relação com o Congresso

Apesar da diversidade, Lula teve que atender aos interesses dos partidos em várias indicações ministeriais, em nome da “governabilidade” no Congresso, como o próprio petista afirmou na primeira reunião ministerial. O presidente deixou claro ao segundo escalão que o Executivo será um bom vizinho do Legislativo.

É preciso que a gente saiba que é o Congresso que nos ajuda. Nós não mandamos no Congresso, e, por isso, cada ministro tem que ter a paciência e a grandeza de atender bem cada deputado ou cada deputada, ou cada senador ou cada senadora

E essa construção ministerial rendeu algumas vitórias a Lula no Congresso, como a aprovação da chamada “PEC da Transição”, ainda em 2022, que garantiu o Bolsa Família de R$ 600. Para além disso, o deputado Arthur Lira (Progressistas) e o senador Rodrigo Pacheco (PSD) foram reeleitos presidentes da Câmara e do Senado, respectivamente, ambos com o apoio do PT, partido de Lula.

Agenda econômica

Manter um bom relacionamento com o Congresso pode resultar na concretização de um desejo de Lula, o fim da Lei do Teto de Gastos, aprovada com o patrocínio do ex-presidente Michel Temer (MDB). Nestes 100 dias, o Planalto já apresentou uma proposta que muda a regra fiscal que está em vigor.

De forma prática, a atual regra fiscal limita a União a gastar de um valor pré-estabelecido no ano anterior e reajustado somente pela inflação. A medida austera, para quem a defende, aumenta a confiança no que diz respeito ao governo honrar os compromissos, o que atrai investimentos.

Por outro lado, críticos destacam que o teto de gastos reduz a capacidade de o Estado investir, sobretudo em áreas estratégicas, como educação, saúde, segurança e infraestrutura. Este é o pensamento de Lula, inclusive desde a campanha. 

Em meio a essas discussões, a PEC da Transição deu ao governo Lula a chance de propor, até agosto deste ano, um novo arcabouço fiscal. Já em mãos, a proposta liderada por Haddad flexibiliza o limite de gastos com base na arrecadação. Se a União arrecadar mais, poderá investir mais. Se a arrecadação for menor, as despesas caem.

Para além da situação fiscal do governo, Lula também defende uma discussão urgente da reforma tributária, promessa de gestões anteriores que ainda não saiu do papel. Se o Congresso agilizar as PECs que tramitam na Câmara e Senado, o sistema brasileiro ficar mais simples, em prol de beneficiar, principalmente, os mais pobres.

Política externa

No cenário internacional, o Brasil voltou a dialogar com países importantes, como os Estados Unidos, cuja relação com o governo Bolsonaro ficou estremecida devido à relação bolsonarista com o ex-presidente Donald Trump. Em 2020, nas eleições americanas, o então presidente brasileiro foi o último líder do G20 a parabenizar a eleição de Joe Biden.

Em contrapartida, no caso da eleição de Lula, Biden se apressou em celebrar a vitória petista, assim como o presidente da França, Emmanuel Macron, declaradamente amigo de Lula. Vale lembrar que, em 2019, Bolsonaro ofendeu Brigitte Macron, esposa do francês.

Nestes 100 dias, Lula também prometeu recolocar o Brasil nas discussões acerca da América do Sul e América Latina. O país, inclusive, voltará a integrar a União das Nações Sul-Americanas (Unasul), rompida em 2019 por determinação do governo Bolsonaro. Além disso, há o debate de criação de uma moeda em comum entre o Brasil e Argentina para transações que envolvam exportações e importações.

Outras rusgas criadas no governo anterior e ultrapassadas neste tem a ver com a China, o maior parceiro comercial do Brasil. Nesta semana, Lula embarca rumo a Pequim em busca de investimentos e do estreitamento de laços com Xi Jinping, reeleito, neste ano, para o terceiro mandato.

Segurança

Em nível de segurança, o destaque vai para o combate à política armamentista promovida no governo Bolsonaro. De acordo com o Anuário de Segurança Pública, divulgado em junho do ano passado, o registro de armas cresceu 473% entre 2018 e 2019.

Fechar os clubes [de tiros]? Não. Os clubes podem existir, mas uma pessoa pode fraudar o porte de trânsito e dizer que está indo ao clube, mas, na verdade, está indo ao bar, armado e com munição? Não. Isso não está na lei.

Outra discussão na mira do governo está relacionada ao chamado “pacote democrático” apresentado por Dino a Lula, discussão iniciada após a invasão e depredação do Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal (STF) e Palácio do Planalto por criminosos que não aceitaram o resultado das eleições.

O plano do Ministério da Justiça e Segurança Pública é, inicialmente, criar uma “guarda nacional” para fazer o policiamento da Praça dos Três Poderes, cuja responsabilidade atual é da Polícia Militar do Distrito Federal. A informação foi antecipada pelo ministro à Band em entrevista no dia 18 de janeiro, 10 dias após os ataques.

Governo otimista

Nas redes sociais, Lula e ministros destacam os resultados dos 100 dias como otimistas. No último domingo, o presidente criticou o que chamou de “cenário estarrecedor” deixado pelo governo anterior e falou em reconstrução.

“100 dias foram suficientes para revertermos um cenário estarrecedor, identificado pelos quase mil especialistas dos nossos grupos de transição. Os problemas herdados eram tantos que o termo ‘reconstrução’ foi incorporado ao slogan do governo federal precedido de outra palavra-chave: ‘união’”, escreveu Lula.

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