Futebol

Líder da Série B, Galhardo cuida da saúde mental e se define: "Vulcão em erupção"

Jogador do Goiás comenta passagens por Botafogo, Vasco, Inter, Ceará e Fortaleza e relembra polêmicas

Por Allan Brito

Thiago Galhardo já chamou atenção por tudo que fez dentro de campo, mas também ficou marcado por diversos episódios nos bastidores. Em entrevista exclusiva ao Band.com.br, ele relembrou algumas polêmicas e contou como cuida da própria saúde mental em meio a esses problemas. Também admitiu que é um “vulcão em erupção”. Atualmente esse “vulcão” é um dos destaques do Goiás, líder da Série B, transmitida pela Band.

Ficar no meio termo não faz parte da minha vida. 8 ou 80? Sou sempre 80. Sou um vulcão em erupção. A qualquer momento a gente explode. Mas com cabeça, com consciência e de forma que daqui a pouco não possa ter o erro, e a gente precise pedir desculpas - que não é feio caso aconteça. Mas gosto de estar borbulhando, gosto de ser um cara ativo e que vai se posicionar

O futebol quase perdeu esse grande personagem. Antes de virar jogador, Galhardo passou em um concurso público na Petrobras. Mas insistiu no sonho de jogar bola e enfrentou dificuldades em vários times menores. Até que começou a se destacar em clubes grandes, a ponto de chegar na Seleção Brasileira. Agora está perto de se aposentar e relembrou toda essa carreira.

O começo em São João Del Rei (MG)

Atualmente a cidade natal de Galhardo tem um time profissional em crescimento, na Série C, o Athletic. Mas há 20 anos não era assim. O time era amador. Thiago até jogou lá, mas tinha uma ressalva: “Pra jogar futebol eu tinha que ter boas notas na escola. Se não, eu não tinha o direito de jogar”. 

Os estudos deram resultado: ele foi aprovado para trabalhar em uma usina petrolífera. Esse seria o caminho dele, até que surgiu uma chance no Bangu. Ele fez um teste improvisado como zagueiro e foi aprovado. 

Então Galhardo trocou o emprego fixo pelo sonho de jogar futebol. Foi chamado de “louco” até na própria família. “Só quem me apoiou foi minha mãe e minha vó”.

Deslumbre no Botafogo e falta de salários no Vasco

Depois de se destacar no Bangu, Galhardo recebeu a primeira chance em time grande, no Botafogo. Mas não se destacou e entende que não estava preparado para dar aquele salto: “O deslumbre é natural para todas pessoas. Talvez eu não estava preparado até pela questão financeira, que abriu um leque de opções”.

Na sequência ele jogou por times menores e enfrentou algumas dificuldades comuns e outras curiosas. No Remo teve atraso nos salários. Já no Cametá precisou andar até de balsa para fazer jogos fora de casa.

Aos poucos Galhardo voltou a jogar em times maiores. Após passagem pelo Japão, ele foi para o Vasco e ficou encantado com a torcida. “O que mais chama atenção é a torcida. Porque apoiar no momento ruim é difícil. As pessoas tendem a ficar em casa e ser torcedor do sofá. E o Vasco não está bem há anos, está carente de títulos. Mas em 2017 teve aquela coisa louca e conseguimos ir para a Libertadores”.

Mas antes de sair do Vasco, Thiago Galhardo teve polêmica com a diretoria. Ele bateu de frente com a diretoria por causa da falta de pagamento de salários. Ele conta que funcionários dormiam no clube porque não tinham dinheiro para comprar passagem e voltar pra casa. “Eu sempre olhei para o lado humano e me preocupei com isso”.

Inter, Seleção Brasileira e Europa

Galhardo chegou ao Inter em 2020 e com certeza viveu o auge da carreira no clube. Fez 23 gols e deu 10 assistências naquela temporada. Chegou a ser convocado para a Seleção Brasileira. Questionado sobre o que fez diferença, ele listou vários fatores.

O Coudet foi essencial. A forma de jogar com o Coudet é posicionada e inteligente. E o time encaixou, deu liga. Os jogadores estavam no top 3 dos seus melhores anos: Edenilson, D’Alessandro, Patrick, Cuesta, Lomba, Guerrero… E na pandemia eu treinei ela inteira. Grêmio e Inter foram os primeiros times a voltar. E essa preparação nos ajudou, porque depois era um jogo a cada 3 dias

Na sequência, Galhardo foi para o Celta e disputou a maioria dos jogos possíveis, mas sem tanto destaque. Ele diz que viu muitas diferenças entre o futebol brasileiro e o europeu: “A maior diferença é a questão tática. E o profissionalismo é muito grande. Aqui tem muita cobrança por resultado. Lá é cobrança por treinamento”.

Fortaleza e saúde mental

Quando voltou ao Brasil, na metade de 2022, Galhardo cogitou jogar no Ceará, onde tinha atuado bem em 2019. Mas diz que o clube demorou para apresentar a proposta que ele queria. Então surgiu uma oferta do rival Fortaleza e ele aceitou. Era um momento crítico, mas deu tudo certo.

“O time era o último colocado, com 14 pontos e dado como rebaixo. Fizemos o impossível parecer possível. Livramos o time do rebaixamento e chegamos na Pré-Libertadores”, relembra.

Em 2023 ele também jogou no Fortaleza. Mas no começo da atual temporada, após um jogo contra o Sport, torcedores rivais atacaram um ônibus do time cearense. Jogadores ficaram feridos. Galhardo pediu para se afastar e cuidar da saúde mental. Agora contou que pensou em parar de jogar.

Fiquei uma semana em casa, com meus filhos, com meus pais e pensei em parar de jogar futebol. Levei para os meus pais e falei com o psicanalista. Estava muito mal e tive que tomar remédio. Eu me vi no fundo de poço, só conseguindo dormir através de remédio, dopado mesmo. Quando voltei, não estava encontrando ânimo para as competições

A solução foi sair do Fortaleza e dar a volta por cima no Goiás. Mas não foi fácil. A ajuda de um profissional foi fundamental para Galhardo cuidar da saúde mental neste momento. Ele faz terapias desde 2021 e entende que devia ter começado antes. “Se eu soubesse que era tão bom, tinha começado em 2011 e tinha levado para mais pessoas”.

Ele relata que sempre houve um tabu no futebol contra isso. Em 2011 era mais travado. As pessoas zombavam, como no Botafogo, o Loco Abreu. E eu ficava nesse pensamento: ‘vou ser o único bobão?’. Hoje é o contrário. Eu pego os meninos mais novos e falo que é importante externar”.

Ele conta que alguns jogadores ainda têm medo. E até alguns times da Série A não oferecem psicólogos. Mas defende que esse cuidado com a saúde mental seja mais normalizado. 

Ele mesmo foi muito julgado por torcedores quando pediu para cuidar da parte psicológica no Fortaleza. E até hoje ouve provocações por causa disso: ”Jogamos contra o Sport e tinha torcedor gritando ‘olha o doidinho, o doentinho’. Porque pessoas tratam assim mesmo. Mas o doente é ele, que não tem senso de perceber as coisas”.

Qual é o salário do Galhardo?

Galhardo chegou ao Goiás em abril e já chamou atenção dentro e fora de campo, mais uma vez. Com a bola, fez 2 gols, deu uma assistência e tem sido titular na campanha do líder da Série B. É o terceiro jogador mais velho do elenco e serve como referência para os mais jovens.

Além disso, logo no primeiro jogo da Série B, Galhardo já causou polêmica ao se virar contra a torcida do Ceará na hora de cantar o hino nacional. Ele explica que não teve o reconhecimento que esperava no clube, se incomodou com torcedores do Vozão e

“No aquecimento começaram a proferir palavrões. Aí entendi que eles não têm que ter minha gratidão. Falei ‘vou ficar assim’. Me senti mal, porque meus companheiros podiam interpretar de forma negativa. Mas não, eles apoiaram. ‘O que o Thiago apanhar na frente, nós vamos bater atrás’. E ali mostrou que estamos começando um relacionamento de família”.

Outro caso chamativo aconteceu quando Hélio dos Anjos, técnico do Paysandu, citou o salário do Thiago Galhardo para dizer que o Goiás tinha altos investimentos. Afirmou que o meia recebe R$ 450 mil por mês. O jogador respondeu publicamente. Disse para Hélio que ganhava mais do que esse valor. Depois o técnico ainda chamou Galhardo de “garoto problema”, dizendo que o Goiás terá complicações com ele.

Questionado sobre tudo isso, Galhardo não revelou o próprio salário, claro, e tratou de acalmar o debate: “Não tratei como polêmica. A forma como ele trabalha, esse pensamento de mandar continuar batendo, não concordo muito. Mas ele venceu da forma dele e parabenizo por tudo que conquistou. Mas sobre ser problema, eu sou mais um ‘tapa problema’. Tento apaziguar e resolver as coisas. Deixo que as pessoas falem por mim - é só ligar para o Coudet ou para meus últimos treinadores”.

Aos 34 anos, Galhardo planeja se aposentar no final do ano que vem. O “vulcão” ficará inativo por um tempo, mas pode voltar ao futebol futuramente.

“Abri mão de muita coisa e agora quero ser pai. Quero levar na escola, dar banho, dar comida e fazer coisas que o futebol me tirou. O tempo não volta para eles. Mas vou tentar recuperar comigo mesmo. Também vou conhecer países. E vou estudar. Vou tirar a carteira de treinador. Hoje não quero ser técnico, zero. Mas não se sabe o dia de amanhã. Dizem que o futebol fica dentro de você”

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