De carros a redes, família de Caio Bonfim cita preconceito com a marcha atlética

Medalha de prata em Paris-2024, marchador é filho de Gianetti Bonfim; ambos já lidaram com muitos comentários sobre a modalidade

Da redação

Caio Bonfim ; marcha atlética ; Paris-2024
Alexandre Loureiro/COB

A marcha atlética é caracterizada por movimentos muito característicos dos atletas. Sem que os esportistas possam correr com a chamada fase aérea, na qual os dois pés deixam o solo ao mesmo tempo, é necessário adaptar. Enquanto um pé toca o solo com o calcanhar, o outro pode sair do chão com a ponta; a perna que toca o solo não dobra o joelho, mantendo-se totalmente estendida e jogando o movimento do corpo para cima. Resultado: a rotação do quadril que gera um movimento semelhante a um rebolado.

A estranheza causada em parte do público se reflete em preconceito sofrido por muitos marchadores. E nem mesmo a elite da modalidade está protegida de manifestações pouco agradáveis – e, por vezes, até violentas.

“Na rua, mudou. Mas nas redes sociais não é tão diferente”, afirmou Caio Bonfim, medalha de prata da modalidade na Olimpíada de 2024, em Paris, em entrevista nesta quinta-feira (1º) à rádio BandNews FM. “Sempre tem piada. Não sei se mudou tanto. Uma covardia, né? Faziam antes com os carros, aceleravam, nunca era frente a frente. Hoje é atrás de uma tela. Todos esses anos em que fizeram isso só me fortaleceram.”

‘Atrás de uma câmera, todo mundo tem coragem’

Caio é filho de Gianetti Bonfim, atleta que disputou a marcha atlética com sucesso – venceu a prova por sete anos seguidos no Troféu Brasil de Atletismo, entre 1996 e 2002, e foi prata no Sul-Americano de atletismo de 2001. E também passou por muitas experiências ruins que o filho testemunhou.

“Quando era atleta, teve uma vez que uma pessoa estava andando na rua, eu passei por ela marchando e a pessoa veio me perguntar: ‘Você tem deficiência física?’. Tem umas coisas meio estranha, a ignorância do povo. As pessoas se acham no direito de falar o que elas querem, dar aquela opinião sem ninguém ter perguntado sobre o assunto. ‘Ah, essa prova é feia.’ A gente vê muito isso na internet, porque atrás de uma câmera todo mundo tem coragem”, afirmou Gianetti, que hoje é treinadora da marcha.

Galeria de Fotos

Veja fotos e reações registradas em momentos de derrota na Olimpíada de Paris-2024
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Mijgona Samadova, do Tajiquistão, chora após perder luta contra Alyssa Mendoza, do EUA, no boxe femininoREUTERS / Maye-E Wong
Ryuju Nagayama, do Japão, desapontado após perder luta contra o espanhol Francisco Garrigos, no judôREUTERS / Kim Kyung-Hoon
Luka Mkheidze, da França, desapontado após perder luta contra Yeldos Smetov, do Cazaquistão, no judôREUTERS/Kim Kyung-Hoon
Ziad Elsissy, do Egito, chora após perder a luta pela medalha de bronze contra italiano Luigi Samele, na esgrimaREUTERS/Albert Gea
Uta Abe, do Japão, desesperada após perder para Diyora Keldiyorova, do Uzbequistão, no judôREUTERS/Kim Kyung-Hoon
Uta Abe, do Japão, desesperada após perder para Diyora Keldiyorova, do Uzbequistão, no judôREUTERS/Kim Kyung-Hoon
O boxeador alemão Magomed chora após perder luta contra Tiago Muxanga, de MoçambiqueREUTERS/Peter Cziborra
O judoca Willian Lima, do Brasil, desapontado após perder luta pelo ouro contra Hifumi Abe, do JapãoREUTERS/Kim Kyung-Hoon
Tenista Rafael Nadal, da Espanha, desapontado após perder partida contra Novak Djokovic, da SérviaREUTERS/Violeta Santos Moura
Luca Virag Szucs, da Hungria, reage após perder sua luta na, esgrima de sabre femininoREUTERS/Albert Gea
Judoca Marica Perisic, da Sérvia, chora após perder luta contra Haruka Funakubo, do JapãoREUTERS/Arlette Bashizi
O esgrimista Filippo Macchi, da Itália, desolado após perder luta pela medalha de ouro contra Ka Long Cheung, de Hong KongREUTERS/Maye-E Wong
A badmintonista Thuzar Thet Htar, de Mianmar, desolada após perder a partida contra Michelle Li, do CanadáREUTERS/Dylan Martinez
Tenista argentina Nadia Podoroska chateada após perder partida de dupla contra Coco Gauff e Taylor Fritz, dos Estados UnidosREUTERS/Violeta Santos Moura
Facundo Conte, da Argentina, desapontado após perder a partida contra o Japão no VôleiREUTERS/Annegret Hilse
Judoca Rafael Macedo, do Brasil, desolado após perder luta contra Maxime-Gael Ngayap Hambou, da FrançaREUTERS/Arlette Bashizi
Pugilista Saidel, de Cuba, sangra após perder luta contra Munarbek Seiitbek Uulu, do QuirguistãoREUTERS/Piroschka Van De Wouw
Amina Zidani, da França, desolada após perder luta no Wrestling para Nesthy Petecio, das FilipinasREUTERS/Peter Cziborra
Time da Alemanha desolado após perderem para Argentina pelas quartas de final femininas do HóqueiREUTERS/Anushree Fadnavis
Charlotte Lutz, do Tênis de Mesa da França, chora após perder partida das oitavas de final contra Jinnipa Sawettabut, da TailândiaREUTERS/Piroschka Vandewouw
Sanan Suleymanov, do Azerbaijão, chora após perder a partida contra Demeu Zhadrayev, do CazaquistãoREUTERS/Arlette Bashizi

“Às vezes, eu chegava com raiva, (dizia): ‘Hoje eu mandei para aquele lugar porque falou alguma besteira’. Como mulher, eu ouvia muitas obscenidades, umas coisas bem chatas. E o Caio ouviu bastante. Teve gente (dizendo): ‘Vai trabalhar’, ‘o que você está fazendo?’, ‘isso é coisa de vagabundo’, ‘você não é homem’. A gente tem que ignorar essas coisas. Se a gente for viver em função do que as pessoas falam e pensam, você nunca vai ser você. Eu sempre falo para os meus atletas: se você quer ser um atleta de marcha atlética, a primeira coisa que você tem que aprender é a ignorar e a não ouvir a opinião alheia”, afirmou também.

Sonho em família

Antes da prata nos 20 km de Paris-2024, Caio Bonfim bateu na trave. Foi 39º em Londres-2012, quarto na Rio-2016 e 13º em Tòquio-2020. Na quarta participação olímpica, o pódio finalmente chegou para a família Bonfim.

“Esse momento é um momento único, e um momento de alcançar medalha olímpica, que foi um sonho sonhado com todas as forças desde sempre, desde que eu era atleta. Hoje, a gente sabia que o Caio estava bem, bem preparado, bem treinado, com todos os detalhes ajustados. Mas competição é competição, e hoje Deus quis que fosse assim”, analisou Gianetti.

“Eu fui atleta de marcha atlética, e era muito discriminada dentro do próprio atletismo mesmo. As pessoas diziam que não gostavam de assistir, que era prova que não devia fazer parte do programa horário do atletismo, que não era atletismo, que tinha que ter uma federação própria que nem o triatlo. A gente já ouviu de tudo isso.”

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