Torcedores do Juventus revelam paixão pelo futebol raiz nos jogos na Rua Javari

Clube completará 100 anos em 2024. Fomos ver de perto Juventus e Comercial, pela Série A2 do Paulistão, e encontrou os 'loucos por ti, Juventus'

Paulo Guilherme Guri e Emanuele Braga

Quem é que sai do trabalho no meio da tarde de uma quarta-feira para ir até a Mooca ver m jogo do Juventus na Rua Javari? Bem, nesta última quarta (8), exatas 439 pessoas fizeram isso. Inclusive eu e a Emanuele Braga, a Manu (veja no vídeo acima).

A ideia dessa pauta era mostrar para a Manu como é esse rolê inusitado em uma metrópole que parece não ter hora para parar. A nossa estagiária do Band Jornalismo já foi ver vários jogos do Corinthians em Itaquera, no Pacaembu, já foi no Morumbi e no Allianz Parque. Mas, torcedor que se preze, também tem que pelo menos uma vez na vida carimbar seu passaporte paulistano com um ingresso de um jogo do Juventus da Mooca, né, mêo?

O Juventus está prestes a se tornar um clube centenário. O clube foi fundado em 20 de abril de 1924 e seu estádio Conde Rodolfo Crespi, também conhecido como Estádio da Rua Javari, foi inaugurado em 26 de abril de 1925. Tem uma capacidade para 5 mil torcedores, apesar de já ter colocado 15 mil lá dentro.

A construção inglesa fez o estádio ser tombado pelo patrimônio histórico em 2019. Na Rua Javari tem alambrado, o público fica colado no gramado. Não tem refletores, os jogos são sempre durante o dia, ou às 15h, para dar tempo de o jogo terminar antes de São Paulo escurecer, ou às 10h nos finais de semana. Um belo programa de domingo.

O estádio tem história e também muitas histórias. Foi lá que Pelé marcou o gol mais lindo de sua carreira, mas que ninguém filmou. Foi em um Santos e Juventus em 1959. O camisa 10 do Santos deu chapéu em três zagueiros do Juventus, mais outro chapéu no goleiro Mão de Onça, e completou para o gol. 

Por causa deste golaço, Pelé ganhou um busto com sua imagem na entrada da Rua Javari, ao lado do busto do maior ídolo do Juventus, o jogador Clóvis Nori, o "Professor". Clóvis, aliás, foi um dos zagueiros que levou chapéu de Pelé naquele gol antológico.

Foi no Juventus que eu e a Manu conhecemos a história da Juliana Costa. Cabelos pintados de grená, piercing na boca e o corpo todo tatuado, Juliana foi ver aquele Juventus x Comercial de Ribeirão Preto com camisa e meias do seu time do coração. Ela não perde uma partida do clube na Javari.

"Essa paixão veio na primeira vez que pisei aqui, na Copinha de 2015. Eu era corintiana, troquei de time e me apaixonei por essa atmosfera, pelo clima intimista que a Javari tem", disse Juliana.  

Ela logo eternizou essa paixão pelo Juventus no corpo. Tatuou um dos primeiros escudos do clube, quando ainda tinha as cores preto e branco da Juventus de Turim, e levava a inscrição CRCFC (Cotonifício Rodolfo Crespi Futebol Clube). O clube passou a ser chamado de Juventus e adotou as cores da outra equipe de Turim, o Torino, com o uniforme grená.

Juliana tatuou o escudo com o J cortado e o fundo branco, usado no passado, e o atual, o tradicional J em branco sobre o fundo grená. Na perna esquerda, ela pediu para desenharam uma imagem de São Genaro, o padroeiro do clube. "Foi uma promessa feita na Copa São Paulo de 2017. O time ganhou do Bragantino e eu tatuei o San Gennaro", conta.

"Tem muita gente doida como eu que é apaixonada pelo Juve. Se você pega a história do clube, não tem como não me apaixonar."  

Um outro torcedor desfilava com uma tatuagem gigante com o número 1917, representando o ano em que os trabalhadores do Cotonifício Rodolfo Crespi, uma indústria têxtil da Mooca, iniciaram uma paralisação que se tornou uma greve geral em São Paulo. 

A greve tomou proporções jamais vistas no Brasil quando, em 11 de julho de 1917, o militante anarquista espanhol José Gimenez Martinez foi morto em confronto com a polícia durante protesto. A morte de Martinez acelerou o acordo pela fim da greve. E a torcida do Juventus até hoje homenageia o militante com faixas nos jogos do time.

Um jogo do Juventus é bem democrático. Os ingressos custam de R$ 10 a R$ 70. Atrás do gol à esquerda das cabines de imprensa fica a torcida organizada Setor 2, que só entra no estádio depois que o jogo começa e passa os 90 minutos cantando sem parar, inspirada nos hinchas argentinos.

O primeiro tempo, sob sol a pino, terminou 0 a 0, com os dois times pedindo água em uma rápida parada técnica.  

No intervalo, todo mundo desceu para formar uma fila para comprar e comer o canoli, o tradicional doce de massa folhada recheada com baunilha, chocolate, doce de leite ou limão, a gosto do freguês. Ir à Rua Javari e não comer um canoli é um sacrilégio.

No segundo tempo, o Comercial fez um gol de contra-ataque, marcado pelo atacante Wendel Alex. O Juventus empatou pouco depois, gol de pênalti do centroavante Bruno Moraes. Quando o time acelerou para virar o jogo, levou outro contragolpe e Wendel Alex, de novo, marcou o gol da vitória dos visitantes.

Mesmo assim, a torcida do Juventus seguiu apoiando o time, até o fim. Eu e a Manu aproveitamos para dar linha dali rapidinho antes que alguém nos chamasse de "pé-frio". O Comercial, com essa vitória, subiu para o oitavo lugar, e o Juventus caiu para 10º lugar entre 16 times. Os oito melhores vão para as quartas-de-final da Série A2. Voltar à primeira divisão ainda é possível para o Juventus. 

"Queremos voltar para a elite, nem que seja só para o Paulista. Pelo menos voltar para a Série A1 e competir com o Corinthians, São Paulo, Palmeiras." 

No que depender dessa torcida fiel, sonhar não custa nada.

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