Não é segredo para ninguém que o automobilismo é um esporte predominantemente masculino. Assim como não é segredo que a presença feminina e jovem tem aumentado nos últimos anos, em uma novidade mais do que bem-vinda no esporte.
No automobilismo brasileiro, é impossível não conhecer o trabalho de Sid Mosca. A partir da década de 1970, Sid passou a ser responsável pelos capacetes de alguns dos principais nomes do Brasil nas pistas: Emerson Fittipaldi, Nelson Piquet, Ayrton Senna, Roberto Pupo Moreno, Maurício Gugelmin, Christian Fittipaldi e Rubens Barrichello, entre outros. Astros como Michael Schumacher, Mika Hakkinen e Mario Andretti também já usaram equipamentos do aerografista brasileiro.
Com o passar dos anos, Sid passou o bastão da empresa para o filho, Alan. Agora, Stella Mosca – filha de Alan e neta de Sid – ocupa o posto de sócia-diretora da Sid Special Paint.
Stella batalhou para, nas próprias palavras, “fazer o espaço para ser ouvida e levada a sério”. Com o passar dos anos, ganhou respeito. Resultado: anunciou o aumento do 400% no faturamento em 2024 na comparação com os números de 2019.
Protagonizar uma história de sucesso no automobilismo é para poucos. No caso de Stella, esse protagonismo vem carregado com a responsabilidade trazida pelo sobrenome e com as dificuldades que apenas uma mulher pode vivenciar neste meio.
Mas é melhor que a própria Stella conte como é. Confira abaixo:
O peso do legado: a sucessão feminina no automobilismo
Por Stella Mosca
Algumas áreas são carregadas de história. Vitórias, desafios, inspirações: tudo isso faz parte do automobilismo e aquilo que o cerca. Quando você vive nesse meio, de uma forma ou de outra, acaba vendo o quanto as pessoas são realmente apaixonadas pelo esporte, e é quase impossível que essa paixão não seja contagiosa, ainda mais quando ela está literalmente no sangue.
Sid Mosca, meu avô, fez sua marca no automobilismo através da pintura e personalização de capacetes para pilotos lendários, incluindo Emerson Fittipaldi, Nelson Piquet, Rubens Barrichello e o próprio Ayrton Senna. Sim, o capacete que se tornou o mais famoso do mundo graças ao nosso grande ídolo brasileiro foi, também, criado por Sid.
O negócio da família prosperou por anos, passando para Alan, meu pai, e então me incluindo na roda. Desde pequena eu frequentava a empresa e sabia o quão separada ela precisava ser do âmbito pessoal; Sid inclusive nem me deixava chamá-lo de avô enquanto estávamos lá, tinha que ser “senhor Sid”!
Mas foi só depois da sua morte, em 2011, que eu realmente comecei a atuar na Sid Special Paint. Assim, me tornei a primeira sucessora mulher, o que me colocou em posição de destaque dentro desse universo, algo pelo qual sou muito grata. Ao mesmo tempo, como é de se esperar em qualquer área predominantemente masculina, surgiram alguns obstáculos.
É um padrão conhecido por muitas outras mulheres que desbravam carreiras em meios desse tipo: você precisa fazer o espaço para ser ouvida e levada a sério. Com o tempo, o conhecimento e a maturidade ajudam, e as pessoas ao redor passam a entender e respeitar o seu papel. Mas é uma caminhada até chegar lá, não tem como negar. Até hoje, ainda sinto alguns bloqueios, às vezes vindo de mim mesma, como consequência da minha trajetória.
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Porém, os anos ajudam a superar esse tipo de percalço, e é sempre ótimo ver que a presença feminina no automobilismo está realmente crescendo. E vejo isso em diversos setores: são pilotos, mecânicas, engenheiras, chefes de equipe, profissionais de marketing, de jornalismo, entre tantas outras. É mais trabalhoso ocupar esses lugares, ainda é difícil ter a credibilidade respeitada, mas vejo a mudança acontecendo aos poucos.
No meu caso, a meta sempre foi fazer o máximo pela empresa e pela história que ela representa. Tudo que meu avô e meu pai construíram, eu foquei em aumentar. E deu certo — entre 2019 e 2024 tivemos um salto de 400% no faturamento anual. Foi um trabalho extenso que envolveu muitas alterações e debates internos, tanto na gestão quanto com toda a equipe. Estabelecemos novas metodologias, reorganizamos departamentos, expandimos as vendas para todo o território nacional e exterior, levamos a marca para o mundo digital e modernizamos a loja física, entre outras mudanças.
Sacudir as coisas quando você ainda está sob a “mira” do mercado, por assim dizer, é um risco. Felizmente, os resultados foram mais que positivos, e não só o time passou a atuar com mais eficiência como os clientes também acabaram por enxergar um novo valor na empresa. Eu queria reforçar por todos os lados o peso que temos na história do automobilismo brasileiro e todos os apaixonados puderam ver isso, inclusive o Alan. Mesmo com nossas discussões e embates de geração que às vezes ocorrem, ele sabe do meu compromisso com nosso legado.
Compromisso esse que não está nem perto de acabar. Os planos continuam e temos muito o que fazer. O fato é que, apesar das dificuldades, eu não trocaria isso aqui por nada. Sinto muita admiração e orgulho pelo nosso trabalho e amor, pelo legado deixado pelo meu avô e que tenho a honra de continuar escrevendo ao lado do meu pai. Quando cheguei na empresa, muita gente já havia lutado para que eu pudesse viver tudo que vivo, e o mínimo que eu posso fazer agora é cuidar para que isso se mantenha. Hoje, posso dizer que, além de cuidar, construí e agreguei também. Um dia, espero compartilhar toda essa vivência e orgulho com meu próprio filho.
* Stella Mosca é sócia-diretora da Sid Special Paint, referência mundial na personalização de capacetes automobilísticos. A empresa foi fundada em 1973 por Sid Mosca, conhecido como o "Mestre dos Capacetes", responsável pelas cores e estilo dos capacetes utilizados por alguns dos principais nomes do esporte a motor mundial.
