Filho de Mauricio de Sousa e amigos contam quem era Popo Vaz, que morreu aos 36

Morte do policial civil repercutiu entre artistas, políticos e membros da comunidade LGBTQIA+.

Felipe Pinheiro

Policial Popo Vaz morre e amigos prestam homenagens Reprodução/Instagram
Policial Popo Vaz morre e amigos prestam homenagens
Reprodução/Instagram
Eu tinha na minha mente que queria ser um homem, mas se falasse isso para alguém iriam me achar louco.


O trecho é de um depoimento de Popo Vaz para uma campanha do Google de 2019. Popo foi encontrado morto aos 36 anos. A notícia repercutiu entre personalidades do meio artístico, políticos e integrantes da comunidade LGBTQIA+.  Filho de Mauricio de Sousa, Mauro de Sousa falou, em vídeo exclusivo para o Band.com.br, sobre o início da amizade e que gostava de chamá-lo de Chico Bento, uma referência ao famoso personagem dos quadrinhos da Turma da Mônica.

“Rolou uma conexão imediata. Paulo sempre foi muito carinhoso, de beijar, de abraçar… Muito querido e acessível. Eu o apelidei de Chico Bento porque ele era da roça, caipira e gostei dele de primeira. E gostei ainda mais quando vi todas as pautas que ele levantava e o que ele representa para toda a comunidade LGBTQIA+. Vai fazer muita falta”.

Ele plantou a sementinha no coração de todas as pessoas e vamos levar para sempre.

Assista ao depoimento de Mauro de Sousa sobre Popo Vaz:


Autêntico, à frente de seu tempo, empático e resiliente são algumas das qualidades descritas sobre o policial civil por quem conviveu com ele.   A reportagem conversou com amigos de Paulo Vaz, ou simplesmente Popo, como ele ficou mais conhecido. 

O apelido, aliás, vem desde a época da escola e nasceu por um motivo curioso. “É porque ele tinha uma bunda grande”, diverte-se a barbeira Julia Coelho ao revelar a origem do apelido.  

Popo era mineiro, de Belo Horizonte, e estudou com Julia na mesma escola, onde os dois se conheceram. “Jogávamos bola juntos. Ele já era famoso no colégio porque sempre foi muito diferente. Autêntico e com muita personalidade”. A relação se estreitou mesmo depois da escola. Ela se lembra como foi acompanhar o processo de transição do amigo.  

“Mais tarde nos encontramos nos caminhos LGBTQIA+. Depois, quando passou no concurso no interior de São Paulo [para a polícia civil], fez a tão sonhada transição. Ele começou a se permitir viver mais e conheceu o atual marido, o Pedro. Bugou a cabeça de todo mundo, né? Ele desconstruiu meus preconceitos em relação a gêneros e sexualidades!, conta.  

“Ele sempre foi muito à frente do tempo! Para mim o mundo não estava preparado para ele, que movimentou tanta coisa”, afirma.  

Gael Benitez e Popô se conheceram seis anos atrás durante o início do processo de transição de gênero pelo qual ambos passaram: “Estávamos buscando outros homens trans para compartilhar essa experiência que pode ser tão solitária”

“Era bonito ver como o Paulo era disposto a ajudar outros meninos que buscavam informação e apoio, e a dedicar grande parte da sua vida para que a população trans no Brasil tivesse mais direitos e dignidade”.  

Popo mudou vidas e com certeza salvou algumas também. 


Para Gael, o legado do amigo é tão importante que não terminará com a sua partida.  

"É muito cruel e desesperador ver a sua partida tão precoce. O trabalho tão importante que ele fazia não vai parar, ele se transformou em força, resistência e memória para muitos e muitas de nós que passaram pelo caminho dele e lembraremos com carinho do grande homem que ele foi”, afirma.  

 

Médico responsável pela cirurgia de mastectomia de Popo Vaz, Erick Carpaneda se lembra em detalhes do procedimento realizado no início de 2016.  O policial civil foi uma das primeiras pessoas transgêneros que ele operou.

“Na época me incentivou muito porque quando ele operou ainda era um tabu e o volume de pacientes era bem menor. Era uma cirurgia pouco realizada no Brasil”, conta. 

O resultado estético não poderia ter sido mais satisfatório. “Ele ficou muito feliz, tanto desde então sempre conversávamos. Eram muitos que vinham com fotos dele para me mostrar, pedindo para que suas próprias cirurgias ficassem iguais a dele”, se recorda o médico.

“Continuaremos lutando”


A comunidade trans se solidarizou com a morte de Popô Vaz. A Antra, uma rede de apoio a pessoas trans, destacou a luta do policial civil. “Paulo era querido e amado por todos à sua volta. Ativista engajado e dedicado à luta trans, sempre fez questão de construir pontes, atuar no enfrentamento da transfobia e em defesa das pessoas transmasculinas”.  

O consultor de carreiras Thiago Esposito conheceu Popô por meio de campanhas sobre visibilidade trans e passou a acompanhá-lo no Instagram. “Não só para mim, mas como para muitos outros homens trans, o Popô foi e sempre será uma grande inspiração”, diz.

“Além de homem trans, ele rasgou o véu da orientação sexual ao se assumir gay, deixando clara a diferença entre identidade de gênero e sexualidade. Além de ser um dos únicos homens trans atuantes dentro da Polícia Civil, um ambiente extremamente conservador onde sem dúvidas ele sofreu por muito tempo com atos discriminatórios”, afirma Thiago.

Para o consultor de carreiras,  a mensagem deixada pelo policial será passada adiante: “Popo era gigante. Ele ensinou para quem o acompanhava que nós, pessoas trans/travestis, somos muito mais do que isso. Humanos acima de tudo. É uma perda enorme para a comunidade, para todos que tiveram nele referência no começo da transição e até hoje”.

Infelizmente, é um caso mais cotidiano do que imaginamos, mas isso não significa desistência da comunidade. Continuaremos lutando para que esses índices de violência contra transexuais e travestis diminuam no país em que mais nos mata”.

Popó, que se identificava como homem gay, era engajado em favor de pessoas LGBTQIA+. Como agente de segurança pública, ele saiu em defesa, por exemplo, do policial militar Leandro Prior, que sofreu ataques homofóbicos após aparecer beijando outro homem no metrô de São Paulo em 2018. 

Paulo Vaz deixa o marido, o youtuber PedroHMC – criador do canal “Pôe na Roda”.

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