
Quando Avril Lavigne lançou seu primeiro álbum, “Let Go” (2002), eu tinha sete anos de idade e fiquei vidrado. O fenômeno, que embalou hits como “Complicated”, “Sk8er Boi" e “I’m With You”, trouxe seu show ao Brasil apenas um álbum depois, em 2005. Eu, com 10 anos, lembro de um anúncio da turnê no jornal, mas não fiz um grande esforço para convencer meus pais a me levarem ao estádio do Pacaembu e só tive a experiência no Rock in Rio 2022 – na fatídica performance apática em um palco pequeno demais.
Jovens fãs de Olivia Rodrigo, porém, viveram uma história diferente no primeiro dia do Lollapalooza 2025. A artista, de apenas 22 anos, se apresentou para um mar de gente que fez questão de provar a máxima de que o Brasil tem um dos melhores públicos do mundo.
Na plateia, muitos adolescentes e crianças, acompanhadas dos pais, além da turma dos 20 e dos 30 anos, que até tentou caprichar no “look” para homenagear a cantora, mas foi frustrada pela forte chuva que atingiu o Autódromo de Interlagos e atrasou a apresentação principal em 40 minutos.
A primeira passagem da americana no Brasil começou por Curitiba, dois dias antes, em uma nova versão da turnê do segundo álbum, “GUTS” (2023), que dobrou a aposta em elementos do rock comparado à estreia, “SOUR” (2021) – disco de vocal feminino com maior número de reproduções no Spotify, superando as veteranas Taylor Swift, Beyoncé e Ariana Grande.
Formatado para festival, o show abre mão de trocas de roupa, duas longas passarelas e da lua que “flutuava” com Olivia pelas arenas nos Estados Unidos e Europa, mas ganha plataformas e novas coreografias que mantém a atmosfera registrada pela artista no filme “Olivia Rodrigo: GUTS World Tour” (2024), disponível na Netflix.
O espetáculo veio à América Latina com apresentações no Lollapalooza Chile e Argentina e marca uma nova fase de sua carreira: a de atração principal – a tal da “headliner” – de grandes eventos pelo mundo. Na agenda de 2025, virão festivais tradicionais como Bonnaroo, nos Estados Unidos, Glastonbury, no Reino Unido, e o Pinkpop, nos Países Baixos.
O desafio? Sair da bolha e provar ao mundo que sua música e performance vão além de uma “febre adolescente”. Ou ainda, afastar de vez a âncora de ser uma “estrela Disney”, que perseguiu Britney Spears, Miley Cyrus, Selena Gomez, Demi Lovato e tantas outras “divas pop”.
Como foi o show da Olivia Rodrigo no Lollapalooza Brasil?
Abrindo os trabalhos em São Paulo com “Obsessed”, a cantora e sua afiada banda demonstraram a energia que se manteria alta durante metade do repertório. A outra metade, formada por músicas mais lentas e melódicas, costuravam a setlist e atraíam os maiores coros da noite, com sucessos como “Drivers License” e “Traitor” gritados verso a verso a plenos pulmões.
Com letras que geram identificação aos anseios da adolescência e início da vida adulta, Olivia Rodrigo, que admite que ama mais compor do que tocar, cria uma atmosfera de karaokê da Liberdade e faz o público fiel sentir as dores da separação em “Deja Vu”, ou a excitação do desejo em “Bad Idea Right?”.
Foi notável como, durante a apresentação, os berros efusivos que preenchiam pausas vocais da cantora foram se tornando menos intensos. Eis a primeira barreira a ser quebrada por Olivia Rodrigo nesta fase: a da interação com o público. Em um dos discursos, ela admite que a construção da confiança é um trabalho em progresso, e as reações genuínas aos cantos e coros brasileiros mostram uma cantora jovem ainda maravilhada com a meteórica ascensão da carreira – há nem quatro anos, ela debutava em um festival com um curto e tímido show no bloco da tarde em Las Vegas; agora, esgota datas solo em grandes arenas e arrasta multidões pelo mundo.
Apesar da troca estar ali, a constante mudança de humores do show – do agito de “Jealousy, jealousy” para a calma “Favorite Crime”, ou da lenta “Enough for You” para a apaixonada “So American” – deixa o público mais casual um pouco perdido e, até mesmo, cansado. Não há o que fazer aqui, trata-se da versatilidade musical da artista, que pode se soltar mais para deixar o grande mar de pessoas na sua mão. Questão de maturidade e de coragem para quebrar o roteiro bem ensaiado.
Há quem critique sua entrega vocal durante o show, ao que não registro nenhuma reclamação. Ícone pop, Olivia faz um show de rock, apesar da previsibilidade. É intensa, não se preocupa em cravar notas na mesma duração ou intensidade das gravações de estúdio – exceto em músicas em que isso se faz essencial, como o refrão de “Vampire” ou o final de “Traitor”. É uma cantora que permite se entregar e se divertir em cena, entre coreografias com seu balé, interações com colegas de banda e momentos “livres”, mesmo que planejados, em que corre de um lado para o outro e interage com os fãs da grade.
A sequência final e explosiva é a grande prova de uma performer que sairá mais forte dessa maratona de festivais. A banda, de excelente qualidade, estende os ótimos riffs de “Brutal” e “All-american Bitch” e criam a atmosfera perfeita para Olivia puxar o coro da ponte de “Good 4 U”, sucesso que marcou a volta da distorção nas guitarras do pop. Por fim, “Get Him Back!” resume a ópera com balé, banda e cantora em um último gás de euforia.
Olivia Rodrigo cumpre um papel que, um dia, Avril Lavigne cumpriu. Uma artista jovem, cheia de boas referências e que abre portas para outros jovens chegarem a grandes nomes da música. Com o amadurecimento artístico bem assessorado e uma produção ativa de conteúdo nas redes sociais, porém, a “ex-garota da Disney” está no caminho certo para ser muito mais que “apenas uma fase”.
As pesquisas por Olivia Rodrigo no Google
Apesar da carreira de atriz, com destaque para a série spin-off da franquia "High School Musical", Olivia Rodrigo começou a chamar a atenção do Brasil apenas em 2021. Segundo dados da Sala Digital, parceria da Band com o Google, o lançamento do single de estreia "Drivers License" gerou um pico de interesse de buscas, que triplicou em junho daquele ano com o sucesso de seu primeiro álbum, "SOUR".
"GUTS" não gerou o mesmo barulho que o antecessor, mas a passagem da cantora pelo Brasil fez o índice voltar a crescer. Não surpreende, portanto, que as músicas mais pesquisadas da atriz sejam suas canções mais "antigas" – "Deja Vu", "Traitor", "Drivers License" e "Happier" estão no topo da lista. “Vampire”, do trabalho mais recente, fecha o top 5.
Setlist de Olivia Rodrigo no Lollapalooza Brasil 2025
- obsessed
- ballad of a homeschooled girl
- vampire
- drivers license
- traitor
- bad idea right?
- love is embarrassing
- pretty isn't pretty
- happier
- lacy
- enough for you
- so american
- jealousy, jealousy
- favorite crime
- teenage dream
- deja vu
- brutal
- all-american bitch
- good 4 u
- get him back!