Meu Amigo É o Bicho!

Doguinhos que sobreviveram às enchentes do Sul ganham família em SP

Gaúchos resgatados sofriam maus-tratos; com aproximadamente 12 anos, ganharam irmãos, cuidados, carinho e vivem em chácara de Campinas

Meu Amigo É o Bicho!

Juliana Finardi é jornalista e é mãe de pet. Já escreveu para o UOL e jornais impressos como Agora SP, Diário do Grande ABC e outros tantos entre reportagem e edição. Ainda acredita na humanidade, mas acha que pet é melhor que muita gente

Há duas semanas, dois cãezinhos gaúchos que foram adotados em São Paulo já não sabem mais o que são maus-tratos, fome e falta de carinho. Resgatados das enchentes do Sul, os irmãos também foram salvos da situação em que viviam desde antes da catástrofe.

Presos no quintal do que parecia ser uma casa cheia de tijolos e entulho que restou quando as águas baixaram, eles foram encontrados junto com mais um cachorrinho que, também amarrado, não conseguiu sobreviver.

Deise Falci, a protetora e socorrista que teve o trabalho divulgado em todo o país durante a enchente, foi quem resgatou os dois apesar das dificuldades de acesso ao local onde eles estavam. "Era um lugar muito pobre e eu estava angustiada, querendo voltar lá. Fomos quando a água já não estava tão alta e em um trecho o motor do barco arrastava no chão. Então, chegamos até onde dava e caminhamos debaixo de um sol escaldante por mais 1,5 km”, contou.

Ao chegar no local, ouviram cãezinhos uivando por socorro. Quando encontraram o quintal de onde vinha o barulho, depararam-se com a cena filmada por Deise (que viralizou posteriormente na internet): todos presos por correntes, magros e doentes. Dois pediam ajuda e um terceiro estava morto, provavelmente por afogamento.

Deise acredita que os dois sobreviventes conseguiram de alguma forma ficar em pé apoiados em alguma coisa e com os focinhos para fora da água durante a enchente e o terceiro infelizmente não teve a mesma condição.

Para voltar o quilômetro e meio até o barco, ela e o companheiro de socorro trouxeram os animais nos braços. “Eu segurei ela (a fêmea) e o macho foi nadando enquanto eu o segurava também. Os dois estavam muito maltratados. Ela, com alguns tumores de mama e ele com o ouvido fechado de otite. Ambos estavam muito fraquinhos, mas finalmente conseguimos chegar de volta ao barco”.

Então, ela postou o vídeo e continuou, nos dias que se seguiram, com os resgates. “Eu nem tinha acesso às minhas mensagens, mas a Camila respondeu àquele vídeo dizendo que gostaria de adotar os dois mais sofridos. Não acreditei nem levei muito a sério porque ela era de São Paulo e também não imaginei que os resgates teriam tanta repercussão”.

Ela estava enganada: os resgates não só viralizaram como sua equipe recebeu uma enxurrada de formulários de adoção preenchidos por paulistas interessados nos doguinhos gaúchos.

Não demorou muito até que uma verdadeira corrente do bem se formasse e viabilizasse a vinda da Deise com 32 cãezinhos a São Paulo para uma ‘feira’ de adoção, que ela prefere chamar de vitrine. Todos foram adotados, inclusive a duplinha do quintal.

Aquela Camila, a que Deise referiu-se quando disse que o formulário foi preenchido por um candidato a tutor de São Paulo, é a administradora Camila Penatti, 41 anos, de Campinas. Ela mora em uma chácara e já tinha uma cachorrinha e dois gatos, mas queria adotar outros dois e dava preferência para “aqueles que ninguém ia querer”.

Idosos, com estimados 12 anos, os irmãos do quintal ganharam, então, além de uma tutora, casa, comida, tratamento veterinário, um jardim, sol e muita grama para rolar. Eles também ganharam novos nome: Guri e Mocinha. Legítimos SRDs, eles vivem, há duas semanas, na chácara da Camila em Campinas com uma rotina que inclui banhos de sol, rolagens pela grama, alimentação constante e de boa qualidade. Uma rotina de verdade a qual Camila acredita que eles estão completamente adaptados.

“Pude ver aquele resgate que me tocou muito e senti uma vontade imensa de contribuir para que esses dois sobreviventes tivessem uma vidinha digna”, disse Camila.

Ela diz que apesar dos maus-tratos (ela tem alguns tumores de mama, que serão retirados em breve e ele, aparentemente mais sofrido, tem um problema sério de otite e marcas de corrente por viver muito tempo preso) e do pouco tempo em que estão no novo lar, a felicidade da duplinha já é bem visível. “Tenho a impressão de que eles nunca tinham visto grama, a felicidade deles nesse ambiente com grama e sol é demais. Ela deita na grama e toma banho de sol a manhã inteira”.

Mocinha e Guri também já aceitam como verdadeiros irmãos a cachorrinha Vilma e os gatinhos Charlie, Lizzie e Andréia. Apesar de não entenderem muito bem qual a intenção da Vilma quando chega com a bolinha na boca e chama para brincar, eles já se dão muito bem com a nova família.

Camila cuida diariamente dos ouvidos de Guri e já está programando a nova cirurgia de Mocinha para a retirada dos tumores. Para os dois, ela garante muito amor em forma de cuidados, carinho, batata doce e ovo cozido, além de casinhas limpinhas e uma humana em que eles podem confiar.

Assim como a Vilma com a bolinha na boca, cheia de pulinhos e ansiedade para que os novos irmãos aceitem entrar na brincadeira, a gente recupera a esperança e um pouquinho da fé na humanidade que maltrata, mas que também respeita, ama e aprende com os animais. Vida longa e muita saúde para a família de Camila, Guri, Mocinha, Charlie, Lizzie, Andréia e, claro, Deise.

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